Os latinos que votam em Trump
26 de outubro de 2020O batom combina perfeitamente com as unhas dos pés bem arrumadas e pintadas de vermelho, contrastando com o verde do gramado. Bertica Cabrera Morris endireita as placas no jardim diante da grande casa de tijolos à vista. Os dois grandes utilitários esportivos estacionados na entrada da casa já brilham mesmo antes da típica chuva tropical no final de tarde. Nas plaquetas está escrito: "Trump/Pence" e "Latinos por Trump".
Bertica vive nos Estados Unidos há mais de 50 anos. Ela tinha 14 quando fugiu de Cuba, sua pátria, com a mãe. "Tudo nos foi tirado. Tudo. Meu pai foi internado num campo de trabalhos forçados porque não quis se submeter aos socialistas." Isto aconteceu em 1967. Fidel Castro estava no poder há oito anos, havia expropriado os ricos, assegurando poder absoluto em uma ilha no Golfo do México, a 170 quilômetros do continente.
Nestes dias que restam até a votação presidencial nos Estados Unidos, ela está fazendo tudo ao seu alcance para garantir que Donald Trump permaneça na Casa Branca por mais quatro anos − e impedir que Joe Biden e Kamala Harris governem os Estados Unidos. Ao contrário de muitos dos apoiadores brancos de Trump com quem falamos nas últimas semanas em nossa viagem por vários cantos deste grande país, ela argumenta de forma mais ponderada, com menos rancor.
Segundo ela, Joe Biden não é um socialista e Kamala Harris também não é. Mas ela teme que as pessoas que os cercam possam conduzir o país numa direção que ela não quer vivenciar mais uma vez. A política de esquerda Alexandria Ocasio-Cortez seria uma delas, na sua visão. Também, e acima de tudo, Bernie Sanders, autoproclamado social-democrata.
Argumentos típicos
Os argumentos dos exilados cubanos são típicos para as pessoas de sua origem. Foram os cubanos ricos que quiseram deixar a ilha após a revolução porque seus bens haviam sido confiscados. E porque lhes foi permitido acreditar que iniciariam uma nova e boa vida nos Estados Unidos. "Eu acredito no sonho americano. Ele me foi dado", diz.
Bertica fugiu inicialmente para a Espanha. Sua mãe pôde solicitar com sucesso um green card para si e para a filha, com o qual elas entraram legalmente nos EUA. Bertica considera isso muito importante. Ela não quer deixar entrar no país imigrantes ilegais, mesmo que venham de outros países latino-americanos, como Honduras ou Guatemala. E apesar de estes refugiados não temerem apenas por seus bens, mas também por suas vidas. "Podemos ser um bom exemplo, mas não podemos acolher o mundo inteiro."
Além da política econômica e fiscal do presidente Trump, é precisamente esta política restritiva de imigração do presidente que ela defende.
Ao contrário do que se poderia pensar, ela não se incomoda com as palavras duras de Donald Trump em relação aos latino-americanos. "Quando ele critica os traficantes mexicanos de drogas, ele não se refere aos mexicanos, mas quer combater o trabalho dos criminosos".
Segurança é tema crucial
A segurança é um grande problema para ela. Não apenas na fronteira com o México, mas igualmente dentro dos Estados Unidos. Também aqui ela vê argumentos claros a favor de Trump. "Kamala Harris quer gastar menos dinheiro com a polícia. Eu quero segurança para meus cinco filhos e meus netos". Em cidades como Portland ou Kenosha, diz ela, vimos a que pode levar a política dos liberais. Ou seja, casas e estabelecimentos comerciais queimados e pessoas assustadas e com medo.
Bertica ama os Estados Unidos. Como membro da organização nacional "Latinos por Trump", ela luta para que sua vida, para a qual ela e a mãe trabalharam tanto, fique como está. "Não tínhamos nada no início. Nos primeiros anos, minha mãe trabalhou por 65 centavos a hora para me dar um futuro." Seu jardim é um pequeno paraíso que lembra Cuba. Bananeiras com frutos e exuberantes canteiros delineiam o terraço com seus convidativos estofados, musgo cresce livremente e de forma selvagem.
Paraíso duramente conquistado
Bertica organiza eventos de arrecadação de fundos para apoiar políticos. "Eu ajudei na reeleição de Marco Rubio [senador pela Flórida]". Ela considera os Estados Unidos sua pátria. E não há como voltar atrás. Ainda assim, sua voz se emociona quando ela fala do céu noturno sobre Cuba e os cheiros e os sons da noite...
No Natal, ela se permite uma viagem ao passado. "É o meu dia de Cuba". É quando são servidos a tradicional carne de porco assada cubana, arroz e feijão. À meia-noite, ela vai para a Missa do Galo. "Eu também apoio Donald Trump porque ele é tão claramente contra o aborto".
E se ela tivesse apenas um argumento para convencer os eleitores a apoiar o Trump? "Eu não quero passar mais uma vez pelo que já passei." Ao pronunciar essa frase, ela olha para o lago junto à casa e para o clube de golfe, do outro lado, que existe ali desde 1911. Ela e o marido são membros do clube há anos.
Adaptação: Roselaine Wandscheer