Vítimas de seita alemã no Chile serão indenizadas
14 de junho de 2022No sul do Chile, um tribunal leiloou por ordem legal um vasto terreno pertencente à antiga seita Colonia Dignidad. Após 26 anos de litígio, a renda será destinada pela primeira vez a indenização de vítimas chilenas do ex-líder da seita, o alemão Paul Schäfer.
A Colonia Dignidad foi um assentamento de imigrantes alemães no Chile que se tornou conhecido por ser palco de crimes que vão desde abusos sexuais de menores à tortura de opositores da ditadura de Augusto Pinochet.
O advogado das vítimas da antiga Colonia Dignidad, Winfried Hempel, falou em uma "enorme satisfação" e classificou como "histórico" o leilão. "É a primeira vez que se toca em algo material da colônia, ou seja, bens diretamente deste baluarte que fez o que queria aqui no Chile por 50, 60 anos", disse Hempel à emissora pública alemã ARD.
Duas das vítimas já morreram, as outras tinham mais de 40 anos. Foram essas pessoas que, com muita coragem, denunciaram o sistema Colonia Dignidad. "São pessoas de uma área rural, da periferia da colônia, que sofreram abusos quando crianças, que agora são cidadãos comuns no Chile e para quem essa quantia de dinheiro ajudará muito", diz Hempel, acrescentando que "o que aconteceu com eles na colônia partiu suas vidas em duas".
Processo durou 26 anos
O processo foi aberto em 1996, com um pedido de indenização pelos abusos sexuais cometidos pelo líder da seita contra crianças chilenas na área da colônia. Somente em 2013 a Suprema Corte do Chile confirmou a legitimidade das demandas, e mais nove anos se passaram antes do atual leilão atual.
"Aqui há culpa compartilhada: por um lado, a colônia se defendeu com todos os meios legais, com os melhores advogados e com todo o dinheiro que tem", diz Hempel. Ele diz que, por outro lado, muitas coisas prejudicaram o lado das vítimas. Um dos problemas, diz ele, foi que "o código de processo civil chileno é incrivelmente antigo e desatualizado e ainda está guardado em arquivos antigos e, claro, é bastante complexo".
No total, o valor da indenização para as 11 vítimas chilenas ou seus descendentes foi fixado em um valor correspondente a cerca de 1,5 milhão de euros (R$ 8 milhões). O meio milhão restante será arrecadado por meio de novos leilões.
A Colonia Dignidad
A Colonia Dignidad foi estabelecida em 1961 por colonos alemães liderados por Schäfer. Ele transformou o lugar, a 350 quilômetros ao sul de Santiago, numa espécie de seita, onde praticava pedofilia e onde ninguém podia entrar nem sair sem sua autorização.
Durante a ditadura militar no Chile, entre 1973 e 1990, o local foi também utilizado como centro de detenção ilegal, onde se praticou tortura e se assassinaram opositores do regime. A Colonia Dignidad também serviu como depósito de armas e foi um reduto de trabalho escravo infantil.
Entre 1961 e 2005, cerca de 300 pessoas que seguiram Schäfer foram submetidas a trabalhos forçados, castigos, manipulações mentais, além dos abusos sexuais praticados contra menores. Em 2005, Schäfer foi detido na Argentina e extraditado para o Chile, onde foi condenado a 33 anos de prisão por homicídio, tortura e abuso sexual. Ele morreu na prisão em 2010.
md/lf (ots)