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Remoção de moradores de rua gera críticas em Berlim

Clarissa Schimunda Neher
Clarissa Neher
11 de fevereiro de 2021

Devido à onda de frio, autoridades ordenaram que maior acampamento de sem-teto da Alemanha fosse esvaziado. Porém, promessa de que poderiam buscar pertences e voltar a morar no local foi quebrada.

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Moradora de acampamento de sem-teto em Berlim carrega cobertores durante remoção
Remoção ocorreu de madrugadaFoto: Paul Zinken/dpa-Zentralbild/dpa/picture alliance

Na semana passada, as imagens do padre Júlio Lancelotti quebrando a marretadas pedras colocadas pela prefeitura de São Paulo embaixo de viadutos – sob a alegação de evitar o acúmulo de lixo no local – circularam nas redes sociais. Na prática, as pedras manteriam afastados os moradores de rua que se abrigavam por ali.

A brutalidade da medida foi alvo de críticas e, diante delas, a prefeitura paulistana gastou mais dinheiro para retirar as pedras do local e colocou a culpa num único funcionário, que teria sido exonerado após a suposta iniciativa própria.

Enquanto São Paulo tentava expulsar moradores de ruas de viadutos, Berlim corria contra o tempo para disponibilizar mais vagas em abrigos e hostels da cidade para receber os sem-teto devido à uma frente fria intensa que se aproximava da cidade – a maior onda de frio e neve dos últimos anos com temperaturas próximas a -15°C.

Além das 1.090 vagas já disponíveis em abrigos para moradores de rua passarem a noite, a cidade conseguiu em pouco tempo disponibilizar mais 320 camas num abrigo emergencial e em dois hostels. Esses locais funcionam 24 horas por dia. Mas nem todas as ações do fim de semana foram em prol dos sem-teto.

Uma delas causou protestos e gerou um debate na cidade. Sob a justificativa dos riscos gerados pelas temperaturas negativas, o vice-prefeito do distrito de Lichtenberg, o social-democrata Kevin Hönicke, ordenou a remoção dos moradores do maior acampamento de sem-teto da Alemanha, localizado na Baía Rummelsburger, no rio Spree. Cerca de 100 pessoas viviam em barracas improvisadas no local.

As primeiras críticas foram referentes ao horário da ação, que começou de madrugada – às 3h de sábado – e teria pego os moradores de surpresa. Na ocasião, muitos se queixaram de não terem sido informados. Também foi prometido que eles poderiam buscar seus pertences durante o dia e poderiam voltar a viver no local após o fim da onda de frio.

A promessa, no entanto, se revelou vazia algumas horas depois. Enviadas pelo dono do terreno, escavadeiras invadiram a área e arrastaram tudo o que havia no local. O vice-prefeito afirma que o proprietário do imóvel havia lhe prometido deixar tudo como está e se eximiu de qualquer responsabilidade.

Escavadeiras removem barracas de acampamento de sem-teto em Berlim
Horas depois escavadeiras "limparam" a áreaFoto: Jörg Carstensen/dpa/picture alliance

O terreno em questão pertence a um grande investidor que deseja construir um aquário para atrair turistas a Lichtenberg. O projeto é extremamente controverso e criticado por moradores do bairro e ambientalistas, que defendem a manutenção do acesso público à beira da baía, além da construção de moradias sociais, uma escola e uma creche na área – obras, na minha opinião, muito mais úteis e necessárias na cidade do que um aquário para turistas. Uma ação corre na Justiça para impedir a obra.

A destruição do acampamento gerou protestos. Cerca de 300 manifestantes se reuniram no domingo, em meio a temperaturas negativas e tempestade de neve, em frente ao local.

Diante das críticas, o vice-prefeito se defendeu e disse que agora os moradores do acampamento têm um abrigo seguro até abril. O que vai acontecer depois, quando esse espaço emergencial for fechado, ninguém sabe.

O político espera que até lá a assistência oficial oferecida os ajude a resolver os problemas que os levaram a morar na rua. Ou seja, ele deseja que um milagre aconteça nos próximos dois meses. Berlim enfrenta um sério problema habitacional, com escassez de moradias e aluguéis impagáveis para uma parcela da população.

Conheço diversas pessoas que têm condições de pagar aluguéis mais caros e que há meses, sem sucesso, buscam por um apartamento. Só através de um milagre esses que perderam tudo o que possuíam ao deixar "temporariamente" o acampamento poderão encontrar um novo lugar para morar barato até abril.

A questão dos moradores de rua é algo que costuma ser levado a sério pelas autoridades berlinenses, e a busca por uma solução digna para esse problema social é genuína. No entanto, infelizmente, mesmo aqui ainda há iniciativas "cheias de boas intenções" que se revelam perversas.

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Clarissa Neher é jornalista da DW Brasil e mora desde 2008 na capital alemã. Na coluna Checkpoint Berlim, escreve sobre a cidade que já não é mais tão pobre, mas continua sexy. Siga-a no Twitter.

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Checkpoint Berlim

Clarissa Neher é jornalista freelancer na DW Brasil e mora desde 2008 na capital alemã. Nesta coluna, ela escreve sobre a cidade que já não é mais tão pobre, mas continua sexy.