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SaúdePeru

Peru recorre a médicos venezuelanos na pandemia

7 de agosto de 2020

Lei libera atuação de profissionais de saúde mesmo sem licença, em medida para aliviar hospitais superlotados durante a crise. País, que abriga mais de 800 mil refugiados venezuelanos, é um epicentro da doença.

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Cadeirante dentro de ambiente hospitalar com pessoas de máscara
Peru em época de pandemia: poucos leitos, poucos medicamentos, poucos respiradores e poucos profissionaisFoto: picture-alliance/AP Photo/M. Mejia

Com quase 450 mil infectados e mais de 20 mil mortos, o Peru se tornou um dos epicentros de coronavírus da América Latina. Somente no Brasil e no México os números são ainda maiores – mas esses países têm população significativamente maior.

O Peru enfrenta o coronavírus com um sistema de saúde precário: poucos leitos hospitalares, poucos medicamentos, poucos respiradores e poucos profissionais. Para combater este último problema, o presidente peruano, Martín Vizcarra, assinou nesta segunda-feira (03/08) um decreto emergencial permitindo que médicos peruanos e estrangeiros possam trabalhar mesmo sem terem licença para praticar a medicina, ou seja, sem registro oficial. Os médicos estrangeiros podem até mesmo já trabalhar na profissão sem ter de esperar pelo reconhecimento de seus diplomas.

Este último detalhe provavelmente beneficiará sobretudo refugiados venezuelanos: o Peru abriga cerca de 830 mil venezuelanos que deixaram a Venezuela devido à crise política e humanitária no país.

A medida talvez possa aliviar as tensões entre peruanos e venezuelanos. A disposição inicial de ajudar os migrantes desapareceu após um tempo no Peru, e a pandemia aparentemente aumentou o ressentimento mútuo. Um dos exemplos foi a afirmação de um venezuelano ao portal online Blickpunkt Latin America, contando que um lojista acusou seus compatriotas de trazer o vírus para o país.

Em todo caso, o novo regulamento parece trazer ganhos para ambos os lados, beneficiando tanto os hospitais sobrecarregados quanto os médicos venezuelanos que estão desempregados ou subempregados.

Fila de pessoas com máscara de respiração
O Peru é o terceiro país mais afetado pela covid-19 na América Latina, depois de Brasil e MéxicoFoto: picture-alliance/dpa/ZUMAPRESS/N. Gomez

O decreto dá a médicos estrangeiros até seis meses após serem empregados para que tenham seus títulos profissionais reconhecidos pelas autoridades peruanas. Segundo a imprensa local, o salário para o médico que atua sem reconhecimento nacional do título deve corresponder, no mínimo, ao salário mínimo peruano de 930 sóis (quase 1.400 reais). Seis meses de prática profissional também é o prazo em que os médicos peruanos sem licença médica têm para passarem no exame necessário para obter o registro profissional.

Em meados de maio, o Ministério do Exterior do Peru anunciou que espera integrar cerca de 3.400 médicos e enfermeiros venezuelanos no sistema de saúde do país. Já o embaixador da Venezuela no Peru falou em abril de mil médicos e 4 mil enfermeiros. Entretanto, não está claro quantos profissionais venezuelanos a nova regra deve beneficiar.

Pandemia gera crise política

No início da semana, o primeiro-ministro peruano, Pedro Cateriano, saudou a remoção de obstáculos burocráticos em tempos de pandemia de coronavírus. “Desta forma, todos os médicos podem ajudar na tarefa nacional de combate ao vírus”, afirmou, acrescentando que nos últimos dias houve um "pequeno aumento" de infecções e mortes.

Mas no dia seguinte, Cateriano perdeu seu cargo. O Parlamento em Lima aprovou uma moção de desconfiança contra o chefe do governo por causa de sua gestão da pandemia, forçando todo o gabinete de ministros a renunciar e obrigando o presidente Martín Vizcarra a formar um novo governo. Isso, semanas depois de o chefe de Estado ter demitido o premiê anterior, Vicente Zeballos, e vários outros ministros em meados de julho após ter sua popularidade abalada pelo alto número de infecções no país e a crise econômica.

Presidente peruano, Martín Vizcarra
Presidente Martín Vizcarra: duas reformulações de governo em poucas semanasFoto: picture-alliance/dpa/Presidencia Peru/A. Valle

O Colégio Médico do Peru também havia criticado Cateriano. "Ao dizer que existe um pequeno aumento, o primeiro-ministro minimiza o problema desnecessariamente. A curva que vemos é uma tragédia para o Peru", disse Palacios Celi, presidente da entidade, em entrevista à TV. A entidade disse que consideraria propor uma nova paralisação de 15 dias para conter os números da infecção.

Apesar da pandemia, a instituição afirmou não considerar a desburocratização para os médicos uma boa ideia. "O decreto é desnecessário e, embora se limite ao período da emergência médica, é um precedente perigoso para a instituição das associações médicas profissionais", afirmou em nota, acrescentando que a medida promove o exercício ilegal da profissão médica.

O órgão afirma também que o decreto é desnecessário porque, desde o início da pandemia, as associações médicas regionais passaram a fornecer a médicos com diplomas autenticados registros online e num prazo de 48 horas. Mesmo os estrangeiros habilitados por uma "instituição respeitada" receberiam aprovação por um mês dentro de 48 horas.

Crise do governo, crise de refugiados, crise de coronavírus – apesar das preocupações, a autorização antecipada para médicos estrangeiros e aqueles sem licença para exercer a medicina pode ser um novo alicerce para ajudar o Peru em pelo menos uma das três crises.

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