Palácio da República começará a ser demolido
19 de janeiro de 2006A demolição do Palácio da República (Palast der Republik), no centro de Berlim, foi votada novamente nesta quinta-feira (19/01) pelo Parlamento alemão. O Partido de Esquerda apresentou um recurso para salvar o edifício e o Partido Verde sugeriu que a demolição fosse adiada até o novo projeto arquitetônico ter sido definido e seu financiamento planejado. Mesmo assim, os parlamentares optaram pelo início imediato da demolição.
O Parlamento alemão já havia aprovado em 2003 a demolição da "Casa Popular" (Volkshaus), mais conhecida como "loja de lustres de Erich", apelido do edifício generosamente iluminado por 9873 luminárias e inaugurado em 23 de abril de 1976 pelo então chefe de governo da República Democrática Alemã (RDA), Erich Honecker.
Agora os parlamentares votaram os últimos recursos contra a destruição do edifício, que – além dos simpatizantes ativistas reunidos na Liga pelo Palácio – contava com outros defensores de renome, como o Nobel da Literatura Günter Grass e a verde Claudia Roth, membro da presidência do partido.
Pagar a ausência
A "desmontagem" do edifício de 180m de cumprimento, 85m de largura e 32m de altura deve durar até 2007. O antigo Volkspalast, que abrigava ao mesmo tempo a sede do Parlamento da antiga Alemanha socialista e um movimentado centro cultural em Berlim Oriental, se tornou na última década um foco de debate sobre como lidar com a herança cultural e histórica da Alemanha dividida.
A polêmica em torno do Palácio da República envolve muito mais do que o edifício. Afinal, a única coisa unânime em todo o debate, de fato inquestionável, é a feiúra do prédio (embora não falte quem iguale o mau gosto do Palácio ao da Catedral vizinha). Para eliminá-lo do horizonte de Berlim, há quem pague qualquer dinheiro do mundo, até os 20 milhões de euros inicialmente calculados no orçamento da demolição. No entanto, pouco antes da votação no Parlamento, a empresa responsável pela demolição baixou o preço da empreitada para 12 milhões de euros, um anúncio criticado como "dumping salarial" pelos opositores da operação.
A fim de não comprometer o entorno do Palácio, sobretudo a Catedral de Berlim, logo ao lado, a demolição terá que ser feita com todo o cuidado. Serão 56,6 mil toneladas de concreto, 19,3 mil toneladas de ferro e aço, 600 toneladas de tijolos e madeira, 500 toneladas de vidro, mil toneladas de material isolante e assemelhados.
A maior parte deverá ser transportada via fluvial, pelo Spree, que ladeia o edifício. Além disso, 80 mil metros cúbicos de areia e 20 mil metros cúbicos de solo superficial terão que ser repostos, a fim de não ameaçar a estabilidade das construções vizinhas.
Dinheiro é o de menos
Todo este trabalho para quê, perguntam os opositores, sobretudo em tempos de cofres vazios? Mas o que está em debate não se justifica com argumentos de ordem financeira.
Aliás, o projeto do Fórum Humboldt, um complexo de museus etnológicos e biblioteca a ser construído a partir de 2008 no local, deverá custar 1,2 bilhão de euros, um montante que ainda ninguém sabe de onde será tirado. Isso, sem falar nos 70 milhões de euros que já foram investidos no saneamento do Palácio na década de 90, a fim de eliminar o isolamento feito com asbesto, material condenado em construções.
O que está em jogo, de fato, na controvérsia do Palácio da República, é a tentativa de imortalizar símbolos de representatividade política em um local de tão longa tradição histórica como esta área à margem do Spree.
O Palácio da República foi construído sobre um terreno que ficou vazio durante aproximadamente 25 anos, desde a implosão do castelo barroco parcialmente destruído na Segunda Guerra, durante os bombardeios de 1944/45. Em 1950, o então chefe de governo da RDA, Walter Ulbricht, preferiu a implosão à reconstrução do edifício.
Neste caso, os altos custos de restauração, calculados na época pelo governo de Berlim em 32 milhões de marcos orientais, evidentemente não foram o único motivo da decisão. Investir tanto em um símbolo da cultura dos soberanos (o local fora sede dos governantes de Berlim desde o século 15) dificilmente faria jus a um governo socialista.
Berlim optou pela "Casa Popular", onde o Parlamento dividia o mesmo espaço com a população, sempre presente em seus eventos culturais, pista de boliche, restaurantes, discotecas e cafés.
Disputa por representatividade
O atual dilema palácio versus castelo também espelha uma tentativa de não deixar um símbolo socialista sobreviver em lugar de tal representatividade no centro de Berlim, às margens do Spree, ao lado da Catedral, do Museu Antigo e do Lustgarten, uma área que já foi palco de manifestações históricas fundamentais na história alemã.
Desde o chamado "Despeito de Berlim" (Berliner Unwillen), em 1447/48, quando a população local abriu as comportas do Rio Spree e inundou a praça do castelo de então, em protesto à política de controle comercial da dinastia governante dos Hohenzollern, esta área entre a Alexanderplatz e o bulevar Unter den Linden sempre foi foco de concentração popular e, ao mesmo tempo, residência de governantes.
Mesmo que as instituições governamentais de Berlim tenham se instalado nas imediações do Reichstag depois da reunificação, esta área não perdeu seu significado simbólico. Foi aí que se reuniram as maiores concentrações populares sob o regime nazista; foi aí que o Parlamento da RDA aprovou a reunificação alemã; foi daí que partiu a maior manifestação contra a política externa norte-americana, por ocasião de uma visita do presidente George Bush a Berlim, em 2002. Ou seja, um ponto de encontro de gregos e troianos.
O que resta
Nos últimos anos, o Palácio da República foi usado como espaço cultural, tendo se transformado em referencial da cena artística jovem. Agora, segundo os planos do governo, deverá se tornar centro da "alta cultura" com o Fórum Humboldt. Pelo menos é este antagonismo que parte da opinião pública enxerga na disputa palácio versus castelo.
Os argumentos estéticos, por mais que não sejam decisivos, pesam muito. Afinal, todo o complexo arquitetônico neoclássico projetado por Karl Friedrich Schinkel (1781–1841) nos arredores se apoiava no castelo completado por Andreas Schlüter (1600–1714), o mestre do barroco prussiano. Este é o maior argumento dos arquitetos defensores da reconstrução do castelo barroco ou de sua fachada.
No entanto, como abolir um testemunho tão importante da história da Alemanha Oriental? Como querer restaurar um estado anterior à Segunda Guerra, como se ela nunca tivesse ocorrido? Como investir bilhões de euros em um único projeto, enquanto Berlim fecha teatros e corta subsídios à cultura por falta de verbas? Estas e outras questões do gênero prometem sobreviver ao Palácio da República.