A sucessora indicada de Ruth Bader Ginsburg não poderia ser mais diferente dela. A juíza da Suprema Corte dos Estados Unidos, vítima de câncer em 18 de setembro, dedicou a vida à igualdade de direitos para ambos os sexos, lutou pela legalização do aborto e contra a discriminação de minorias, exigia um sistema de saúde para todos e se batia por uma política de imigração digna.
A escolha de Donald Trump recaiu sobre Amy Coney Barrett, de 48 anos, que em diversos aspectos representa exatamente o contrário de Ginsburg. A católica declarada é contra o aborto, apoia a política de imigração restritiva do presidente e combate a assistência de saúde para toda a população. É uma decisão que deverá acirrar ainda mais os ânimos, num país que nunca esteve tão dividido desde a Guerra Civil, desencadeada pela libertação dos escravos.
Mas a decisão de Trump, de ocupar a vaga nesse tribunal tão importante ainda antes da eleição presidencial, já é controvertida independentemente da pessoa concreta. Para muitos, a tão poucas semanas do pleito, o eleitorado é que deveria decidir de que ala – se democrata ou republicana – virá o próximo supremo juiz. Por isso, primeiro deveria ser escolhido o presidente, que então designaria o ocupante do cargo vitalício.
Essa é também a posição do candidato presidencial democrata, Joe Biden. Embora ainda não tenha apresentado uma candidata, ele sinalizou a intenção de indicar uma afro-americana que lutaria contra a discriminação, por leis de armas mais rigorosas, assistência universal de saúde, assim como pelo direito ao aborto, levando adiante o legado de Ruth Bader Ginsburg.
No entanto é muito provável que o Senado americano, dominado por republicanos, vá nomear Barrett como juíza do Supremo ainda antes da posse do novo presidente. Assim, Trump terá ocupado três postos na corte durante seu mandato, impelindo a instituição judiciária ainda mais para a direita.
Devido à estrutura etária da Suprema Corte, é perfeitamente possível que Trump ainda venha a ocupar uma quarta vaga, caso seja reeleito – um argumento perfeitamente capaz de convencer os republicanos indecisos a votarem novamente no bilionário nova-iorquino.
Caso isso aconteça, nas próximas décadas o órgão estará firmemente em mãos republicanas, sem que o futuro presidente ou parlamentares possam fazem algo contra. Não são poucos os que, para tal, estão dispostos a encarar mais quatro anos de Donald Trump.
Ines Pohl foi editora-chefe da DW e hoje é correspondente em Washington. O texto reflete a opinião pessoal da autora, e não necessariamente da DW.