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Em reunião com embaixadores, Bolsonaro questiona urnas e TSE

19 de julho de 2022

Presidente reuniu diplomatas estrangeiros no Palácio da Alvorada para repetir teorias fantasiosas sobre sistema de votação, atacar ministros do Judiciário e exaltar suposto papel das Forças Armadas no processo eleitoral.

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Jair Bolsonaro
Bolsonaro afirmou que Barroso, Fachin e Moraes "querem trazer instabilidade" ao BrasilFoto: Clauber Caetano/AFP

O presidente Jair Bolsonaro reuniu nesta segunda-feira (18/07) dezenas de diplomatas estrangeiros no Palácio da Alvorada para fazer uma apresentação de mentiras sobre o sistema de votação brasileiro, atacar ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e exaltar um suposto papel das Forças Armadas na avaliação do processo eleitoral.

A menos de três meses do primeiro turno das eleições, o evento contou com a mobilização do Itamaraty e do ministro das Relações Exteriores, Carlos França, exibiu fotos de Bolsonaro cercado de apoiadores e resumiu, aos representantes de outros países, teorias fantasiosas sobre as urnas eletrônicas que vêm sendo repetidas pelo presidente e seus apoiadores desde pelo menos a eleição de 2018.

Ataques ao Judiciário

Durante sua apresentação, Bolsonaro tentou deslegitimar a autoridade do TSE para organizar as eleições e atacou nominalmente os ministros Luís Roberto Barroso, que presidiu a Corte até fevereiro, Edson Fachin, que atualmente comanda o tribunal, e Alexandre de Mores, que assumirá a presidência do TSE em 16 de agosto. Segundo Bolsonaro, os três "querem trazer instabilidade" ao Brasil ao não aceitarem as "sugestões das Forças Armadas" sobre a urna eletrônica.

Bolsonaro referiu-se a Fachin como o ministro "que tornou o Lula elegível" – apesar de a decisão que revogou a condenação do petista ter sido confirmada pelo plenário da Supremo –, mencionou Barroso como aquele que tinha sido "o advogado do [Cesare] Battisti, que recebeu o acolhimento do Lula", e afirmou que Moraes havia advogado no passado "para grupos que, se eu fosse advogado, não advogaria" – em referência implícita a uma alegação constante no meio bolsonarista de que Moraes teria advogado para o PCC, o que ele nega.

O presidente também criticou o TSE por ter determinado que redes sociais desmonetizassem páginas e canais que disseminam notícias falsas e por "cassarem um deputado por fake news" – em referência ao deputado estadual pelo Paraná Fernando Francischini, cassado por disseminar em 2018 que teria havia fraude no cômputo de votos de modo a impedir a eleição de Bolsonaro como presidente, em decisão confirmada pelo Supremo.

Ataques ao Judiciário fazem parte do manual de atuação de líderes de extrema direita eleitos em todo o mundo. Em democracias, são as Cortes supremas que, em última instância, atuam para conter investidas autoritárias de chefes do Executivo contra a Constituição. No caso brasileiro, a atuação do STF e do TSE durante a gestão Bolsonaro tornou-se mais importante devido à atuação dócil de líderes do Congresso, especialmente do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), em relação ao presidente, em troca de um controle cada vez maior sobre o destino de verbas públicas para suas bases eleitorais.

Exaltação das Forças Armadas

Aos diplomatas, Bolsonaro frisou, por mais de uma vez, que ele era o "chefe supremo" das Forças Armadas e defendeu que os militares tenham um papel mais ativo na formatação do sistema de votação, já que as eleições eram uma "questão de segurança nacional".

As Forças Armadas foram convidadas por Barroso para participar do Grupo de Fiscalização do Processo Eleitoral do TSE, inicialmente com o objetivo de tentar construir uma relação de confiança com os militares a respeito da urna eletrônica.

Nesse processo, porém, as Forças Armadas passaram a ser utilizadas por Bolsonaro para desacreditar o sistema de votação e fazer sugestões como conduzir uma apuração paralela das eleições. Na quinta-feira passada, em uma audiência no Senado, o Ministério da Defesa voltou a colocar em dúvida a confiabilidade da urna eletrônica, dizendo que havia dúvidas sobre sua segurança.

"Por que nos convidaram? Acharam que iam dominar as Forças Armadas? Será que se esqueceram de que eu sou o chefe supremo das Forças Armadas? Será que imaginaram que participaríamos de uma farsa? Seríamos moldura numa foto?", afirmou Bolsonaro aos diplomatas nesta segunda-feira.

Teorias falsas repetidas

Parte da apresentação de Bolsonaro aos diplomatas foi baseada em um inquérito da Polícia Federal (PF) que apurou um ataque hacker em 2018 a sistemas do TSE, que já havia sido mencionado pelo presidente em uma live em julho de 2021.

Segundo a investigação da PF, um grupo de hackers brasileiros e portugueses foi responsável pelos ataques, no qual dados de servidores públicos foram divulgados e houve tentativas de causar instabilidade nos sites do tribunal e dos Tribunais Regionais Eleitorais. Segundo a PF, não foram identificados quaisquer elementos que possam ter prejudicado a apuração, a segurança ou a integridade dos resultados da votação. O TSE já informou que o ataque "não representou qualquer risco à integridade das eleições de 2018".

Na live de julho de 2021, Bolsonaro divulgou documentos desse inquérito que estavam sob sigilo, o que provocou a abertura de um inquérito contra o presidente.

Aos diplomatas reunidos no Palácio da Alvorada, Bolsonaro voltou a alegar que algumas pessoas que queriam votar nele em 2018, ao digitarem seu número, o 17, viam na urna o número 13, do seu adversário, Fernando Haddad, do PT – alegação nunca comprovada.

Pacheco e Fachin reagem, Lira silencia

Após a apresentação de Bolsonaro, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), divulgou uma nota na qual afirmou que "a segurança das urnas eletrônicas e a lisura do processo eleitoral não podem mais ser colocadas em dúvida". Já Lira não se manifestou.

Em um discurso no Paraná nesta segunda-feira, Fachin disse que a Justiça Eleitoral estava sendo atacada com "uso de má-fé" e que era "hora de dizer basta" aos questionamentos ao processo eleitoral.

"Mais uma vez a Justiça Eleitoral e seus representantes máximos são atacados com acusações de fraude, ou seja, uso de má-fé. Ainda mais grave é o envolvimento da política internacional e também das Forças Armadas, cujo relevante papel constitucional a ninguém cabe negar como instituições nacionais, regulares e permanentes do Estado, e não de um governo. É hora de dizer basta à desinformação e ao populismo autoritário que coloca em xeque a Constituição de 1988", afirmou Fachin.