Berlim preserva a história da comunidade judaica
19 de maio de 2013A passos incertos, Peter Mertens caminha pelo bosque de blocos de concreto dispostos simetricamente. Quanto mais o turista da cidade Darmstadt, de 63 anos, o adentra, mais altos ficam os monólitos e mais ele tem a impressão de estar desaparecendo em meio a eles. "Ou sou que eu estou tonto, ou o chão está balançando", diz Mertens.
A sensação de insegurança é intencional. O Memorial do Holocausto, projetado por Peter Eisenman e inaugurado em 2005 em Berlim, evoca os 6 milhões de judeus assassinados na Europa sob o jugo dos nacional-socialistas.
Muitos deles permaneceram sem sepultura, pois seus restos mortais foram incinerados ou simplesmente enterrados em valas. O memorial no coração da capital alemã, cujas estelas de concreto lembram lápides, oferece um lugar em que todas as vítimas podem ser homenageadas. Além disso, um centro de documentação subterrâneo traça a história da perseguição antissemita e narra destinos individuais através de fotos e cartas.
História teuto-judaica em Kreuzberg
O Museu Judaico, no bairro berlinense de Kreuzberg, também tematiza o genocídio dos judeus. Desde a inauguração, em 2001, sua arquitetura espetacular atrai turistas de todo o mundo, sendo o maior foco de interesse o novo prédio em ziguezague, do arquiteto Daniel Libeskind.
"Por um momento, fiquei sem ar", descreve o estudante Holm Weissbach, contando sua opressiva experiência dentro da Torre do Holocausto. Trata-se de uma sala memorial estreita, que a luz do dia penetra através de uma fresta no teto. Um corredor em declive, o assim chamado "Eixo do Holocausto", leva até o aposento escuro. Também aqui, o chão irregular reflete o desequilíbrio que invadiu a vida dos judeus durante a dominação nazista.
O maior museu israelita da Europa, no entanto, não apenas recorda a Shoah. Nos andares superiores desdobram-se os 2 mil anos de história judaica na Alemanha, da Antiguidade Romana ao período presente.
Rolos de torá históricos, joias preciosas e escritos da Idade Média documentam a íntima ligação entre a cultura judaica e a história alemã. As peças falam de épocas em que artistas, autores e cientistas judeus marcaram a vida intelectual de sua pátria germânica.
"Super interessante!", avalia Annika Reimann após a visita de três horas. "Por exemplo, eu não tinha a menor ideia de que Bob Dylan é judeu." A moça de 17 anos relata suas impressões no jardim do museu. Aqui se pode relaxar, no verão até mesmo com uma cesta de piquenique do restaurante do museu.
O pátio interno oferece uma vista ampla sobre o conjunto arquitetônico. O museu é uma das muitas instituições e monumentos construídos nos últimos 20 anos com o fim de reexaminar a história teuto-judaica.
Arredores da Nova Sinagoga
A Nova Sinagoga da Oranienburger Strasse também atrai visualmente. Sua cúpula dourada em estilo mourisco brilha para muito além dos telhados circundantes. No entanto, apenas uma pequena parte daquela que já foi a maior casa de prece semita do país foi preservada. Hoje, ela abriga uma mostra sobre os 140 anos da sinagoga e conta a vida dos judeus no bairro de Mitte.
Nele foi criado, em meados do século 18, o primeiro centro judaico de Berlim, no qual mais tarde iriam morar muitos imigrantes da Rússia e de outros Estados do Leste Europeu. Em decorrência da industrialização e da população crescente, a área se transformou num bairro pobre. Após a Segunda Guerra Mundial, grande parte dos resquícios da vida judaica havia sido destruída.
Somente a partir da década de 1990, essa vida em torno da sinagoga experimentou um pequeno renascimento, testemunhado por lojas, restaurantes e escolas israelitas. O Centrum Judaicum na Nova Sinagoga promove regularmente concertos, leituras e apresentações teatrais, e seu arquivo documenta a história da comunidade judaica berlinense.
Descanso em paz na floresta de contos de fadas
Jeff Cohn, morador de Chicago de 59 anos, pediu ao Centrum Judaicum que pesquisasse sobre seus ancestrais. Sua família já vive nos Estados Unidos há três gerações, porém graças à pesquisa, ele pôde localizar seus bisavós. Eles estão enterrados no cemitério judaico do bairro berlinense de Weissensee.
Durante 20 minutos de caminhada Cohn passa por mausoléus imponentes, lápides de mármore e canteiros fúnebres cobertos de plantas. Por fim, sob a sombra de árvores altas, ele encontra o túmulo de seus bisavós, modesto e fortemente castigado pelo tempo.
"Um último repouso encantador", diz Cohn, emocionado. Assim como ele, muitos visitantes são seduzidos pela atmosfera mágica desse local e por sua tranquilidade, para além do burburinho da metrópole. A metade deles é de turistas.
É espantoso que o gigantesco cemitério tenha sobrevivido incólume o Terceiro Reich. A maior parte das 115 mil sepulturas data de antes de 1933. Apenas poucos familiares ainda cuidam delas. Mas por vezes, segundo o velho costume judeu, um visitante coloca uma pedrinha sobre uma das lápides. Ela quer dizer: "Vocês não estão esquecidos".