Historiador salienta identificação dos judeus alemães com cultura de origem
15 de fevereiro de 2013Professor de História da Universidade Hebraica de Jerusalém, Mosche Zimmermann é filho de judeus alemães que deixaram Hamburgo e emigraram para a Palestina. Quando seus pais chegaram à região, a universidade onde Zimmermann trabalha hoje ainda era a única do lugar, fundada alguns anos antes, em 1925.
Pouco depois, os pesquisadores de língua alemã que haviam fugido do regime nazista iriam compor mais de dois terços do corpo docente da instituição, marcando decisivamente a vida acadêmica local.
Fim de um sonho de vida
Isso valeria também para o departamento de Medicina e para o Hospital Universitário, de nome Hadassah, onde Zimmermann nasceu em 1943 e onde sua mãe trabalhava em um laboratório. "Há duas semanas, encontrei documentos da minha mãe, nos quais pude ver como ela renunciou à carreira de médica", conta o historiador.
Aluna extraordinária, ela havia pulado dois anos na escola, mas nem assim conseguiu uma vaga em uma universidade da Alemanha nazista. Uma grande ofensa, observa Zimmermann. E o fim de um sonho. O assunto, porém, nunca foi abordado por ela própria, recorda o historiador.
Uma trajetória acadêmica pôde ser seguida, contudo, pelo filho: Mosche Zimmermann dirige desde 1986 o Instituto de História Alemã Richard Koebner da Universidade Hebraica de Jerusalém, que leva o nome do historiador judeu alemão que fugiu do nazismo em 1934. "Koebner era uma figura significativa e sintomática, um judeu totalmente assimilado", explica Zimmermann.
Não fosse Hitler, ele certamente teria seguido carreira em Breslau, onde dava aulas. Em Jerusalém, Koebner fundou o departamento de Ciências Humanas da universidade. "O que entendemos aqui por história remete tanto às raízes alemãs quanto ao contexto contemporâneo", diz Zimmermann, ao falar do surgimento da instituição como "universidade alemã". E acrescenta: "Isso é claro. Havia também fundamentos anglo-saxões, mas o cerne era a Europa Central. Trata-se de um centro alemão aqui na Palestina", explica o historiador.
Desperdício de chances históricas para selar a paz
Zimmermann conta que há uma grande quantidade de correspondências em alemão nos arquivos da universidade. Sua língua materna é o hebraico – essa foi uma escolha de seus pais –, embora ele hoje escreva vários de seus livros em alemão. E não apenas porque um de seus principais focos de trabalho seja a história judaico-alemã, mas principalmente porque ele escreve para um público alemão.
Seu livro Die Angst vor dem Frieden (O Medo da Paz) é uma visão crítica da sociedade israelense de hoje, que, segundo a tese do autor, prefere viver em meio à situação de conflito que criou do que iniciar um período de paz.
"Como historiador, digo: os sionistas perderam muitas chances nos anos 1930 porque ignoraram o lado árabe. Pensávamos que éramos europeus no leste selvagem, que tínhamos direitos absolutos e os outros eram 'primitivos'. Naquela época havia chances de paz", diz Zimmermann.
Segundo ele, "o outro lado também era consideravelmente cego, embora tivesse sido mais fácil entrar num consenso naquele momento. "Isso não aconteceu, por isso o abismo entre judeus e árabes foi se tornando cada vez maior", completa.
Nacionalismo suave
De acordo com o historiador, os judeus de língua alemã, naquele momento, eram mais propensos a acordos do que outros: "Não se pode generalizar, mas é possível dizer que entre eles havia uma tendência de desenvolver um nacionalismo mais suave e menos militante. Pois eles vinham da experiência de um nacionalismo alemão e europeu".
Quando esses judeus alemães fundaram seu próprio partido, em 1942, eles defendiam, a princípio, a solução de dois Estados para a região, como os britânicos já haviam sugerido para o território palestino: "Sabia-se que a população árabe compunha uma maioria e não se queria ser uma minoria no Estado dos outros, pois já se tinha tido experiências negativas com isso", analisa o historiador.
No entanto, o partido teve vida curta, tendo existido somente até 1948, o ano de criação do Estado de Israel. "Com o passar do tempo, os yekkes (como os judeus alemães eram chamados) foram perdendo cada vez mais poder político, tendo se transformado apenas em uma espécie de impulso de pensamento, o que acontece até hoje", conclui Zimmermann.
Alemães e judeus: ligação estreita
As reflexões do historiador costumam ser mais ouvidas na Alemanha do que em Israel. E sua relação com a terra de seus pais é surpreendente. "De preferência tomo o futebol como exemplo. Torço para um time de futebol alemão, sou torcedor do Hamburgo, mas não torço para nenhum time em Israel. Isso embora eu saiba do passado do Hamburgo com um artilheiro nazista muito conhecido", conta o historiador.
Zimmermann lembra, porém, que a Alemanha é o país dos algozes nazistas, mas também o país das muitas vítimas. Seu livro Deutsche gegen Deutsche (Alemães contra alemães) fala das estreitas ligações entre "alemães" e "judeus".
Pratos típicos
"Eu me identifico muito com a cultura alemã. Sei muito mais sobre Hamburgo do que a maioria das pessoas que encontro lá. Como pratos típicos do lugar e gosto da região do rio Elba e do lago Alster. Mas sinto, de alguma forma, que não faço parte daquilo da mesma forma como faço parte de Israel. E o problema é que, com o passar do tempo, me sinto cada vez mais um estranho em Israel. Não somente porque meu sotaque tem se tornado mais alemão quando falo hebraico, mas porque minhas posições aqui muitas vezes são no mínimo mal entendidas", confessa o professor.
Viver na Alemanha, contudo, não foi uma escolha feita no passado. "Pensei seriamente nisso antes. Quando escrevi meu doutorado em Hamburgo, teria podido continuar trabalhando lá, mas me decidi pelo retorno a Israel, principalmente porque aqui é a terra de minha esposa e meu filho. Hoje posso pensar em passar um tempo maior na Alemanha, por um período que ultrapasse algumas semanas ou meses", finaliza o historiador nas vésperas de uma viagem a Berlim.
Autora: Aya Bach (sv)
Revisão: Roselaine Wandscheer