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As propostas dos presidenciáveis para a economia

27 de setembro de 2022

Confira principais pontos dos planos de governo de Lula, Bolsonaro, Ciro e Tebet relativos à economia. Especialistas comentam diferenças e criticam falta de propostas detalhadas para enfrentar dificuldades emergenciais.

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Pessoas em rua comercial de São Paulo
Inflação é um dos desafios para o novo presidenteFoto: Cris Faga/NurPhoto/picture alliance

Na reta final da campanha eleitoral brasileira, o mercado está de olho nas declarações e nos sinais dos principais candidatos a ocupar o Planalto a partir do ano que vem. Na visão de especialistas ouvidos pela DW Brasil, é possível agrupar em dois os grupos a síntese das propostas protocoladas junto ao Tribunal Superior Eleitoral pelos quatro principais candidatos: Luiz Inácio Lula da Silva (PT), Jair Bolsonaro (PL), Ciro Gomes (PDT) e Simone Tebet (MDB).

"Temos dois grandes grupos de propostas econômicas: as de cunho intervencionista [Lula e Ciro] e as de cunho liberal [Bolsonaro e Tebet]", afirma o economista Vladimir Fernandes Maciel, coordenador do Centro Mackenzie de Liberdade Econômica.

"As primeiras entendem o governo como guia da economia, que direciona o crescimento pelo aumento da demanda agregada e escolhe os setores-chave ou estratégicos", explica. "Já as propostas de Bolsonaro e Tebet entendem o governo como um meio que pode atrapalhar o crescimento se for grande, e como um facilitador se atuar na melhoria do ambiente de negócios."

Em outras palavras, de um lado há uma linha social-democrata mais fundamental, de outro, um neoliberalismo mais explícito. Considerando os planos de governo, são os seguintes os principais pontos econômicos de cada candidatura:

Lula:

  •     Combate à inflação;
  •     Fim da política de paridade internacional de preços da Petrobras;
  •     Revogação da lei do teto de gastos;
  •     Revogação de marcos regressivos da atual legislação trabalhista;
  •     Revisão da previdência;
  •     Reforma tributária com simplificação de tributos e modelo progressivo;
  •     Retomada de investimentos públicos em infraestrutura e habitação;
  •     Não privatização da Eletrobras;
  •     Recolocar os mais pobres no orçamento.

Bolsonaro:

  •     Privatização das estatais;
  •     Liberdade econômica como mecanismo de promoção de bem-estar social;
  •     Simplificação de impostos e correção da tabela do Imposto de Renda;
  •     Trabalhar para que o Brasil ingresse na Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE);
  •     Manutenção do Auxílio Brasil.

Ciro:

  •     Redução de subsídios a empresa privadas;
  •     Aumento de impostos sobre renda e menor tributação sobre consumo;
  •     Recriação de impostos sobre lucros e dividendos;
  •     Taxação de grandes fortunas;
  •     Reforma da previdência;
  •     Retomar o papel do Banco Nacional de Desenvolvimento (BNDES) como financiador e estruturador de projetos do setor produtivo;
  •     Programa de renda mínima.

Tebet:

  •     Reforma tributária;
  •     Desestatizações, privatizações, concessões e parcerias público-privadas;
  •     Tripé baseado em controle inflacionário, responsabilidade fiscal e câmbio flutuante;
  •     Eliminação de subsídios;
  •     Programa permanente de transferência de renda e renda mínima.

Diferenças e semelhanças

A convite da reportagem, o economista Odilon Guedes Pinto Júnior, professor da Fundação Armando Álvares Penteado (FAAP) e membro do Conselho Regional de Economia de São Paulo, comentou os principais pontos de cada um dos quatro candidatos.

Sobre Lula, ele destacou como "medida superimportante" a ideia de revogar o teto de gastos, pois acredita que os investimentos do orçamento federal não podem ser congelados. "O governo eleito tem de ter liberdade de aplicação de recursos públicos", defende o especialista.

Sobre a reforma tributária, ele ressalta que não basta "só simplificar os tributos", mas é preciso "fazer uma tributação progressiva sobre os indivíduos e diminuir os impostos sobre as empresas".

O economista concorda com a oposição à privatização da Eletrobras, afirmando que se trata de uma estatal "estratégica para a energia" e também defende o fim da paridade de preços da Petrobras, com avanços no refino interno e uma maior independência das flutuações de câmbio no preço do combustível.

Quanto a Bolsonaro, Pinto Júnior critica a ideia de legar à liberdade econômica a responsabilidade do bem-estar social. "Se deixar liberdade total econômica, os oligopólios e monopólios tomam conta do mercado e vão querer ampliar seus lucros. Lógico que o Estado tem de ser regulador, como em vários países capitalistas do mundo", afirma.

Sobre a privatização das estatais, ele defende que isso seja feito com critérios, analisando se a empresa é estratégica e se dá lucro. "Quando dá lucro, os dividendos podem ser usados em educação e em saúde. Se há corrupção na estatal, é preciso acabar com a corrupção, e não privatizar a estatal", diz ele.

Por fim, sobre a ideia de ingresso na OCDE, ele não vê viabilidade sob Bolsonaro. "Porque o organismo exige a questão de manter a proteção ambiental, e o Brasil, atualmente, está destruindo a Amazônia", ressalta.

A respeito de Ciro, Pinto Júnior relativiza a questão dos subsídios, lembrando que há empresas "estratégicas" que, segundo ele, "precisam ser subsidiadas". "A recriação de impostos sobre lucros e dividendos é muito importante e a taxação de grandes fortunas, já prevista na Constituição, precisa ser regulamentada", acrescenta.

O economista avalia que a proposta de Tebet relativa à responsabilidade fiscal está preocupada "em pagar os juros da dívida pública", sem abordar a responsabilidade de "investir em educação, saúde e transferência de renda". "O câmbio flutuante é um debate fundamental", pontua. "É preciso que o Estado intervenha no câmbio para proteger as empresas nacionais. Se deixa livre, o povo começa a passar fome por causa do preço dos alimentos." Na opinião do especialista, a "avalanche do neoliberalismo" acabou criando "a imagem de que o Estado só prejudica o cidadão”, mas "não é por aí que as coisas acontecem".

Ideologias acima do diagnóstico

Doutor em Administração Pública e Governo e mestre em economia, o professor da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM) Fábio Pereira de Andrade faz uma crítica comum a todas as propostas dos quatro principais candidatos à Presidência.

"Preocupa-me a ausência de um diagnóstico realista da conjuntura de curto prazo da economia brasileira", comenta. "Há um desafio real no que tange à inflação, pois apesar de os índices estarem em queda, o fato é que fecharemos 2022 com inflação acima do topo da meta […], juros em dois dígitos, tendência de aumento de juros nos Estados Unidos e cenário externo desfavorável."

O professor elenca ainda desafios na geração de empregos e queda na renda média do brasileiro. "Os planos formulam estratégias mais centradas no peso da ideologia dos formuladores do que na conjuntura imediata", argumenta. "As propostas de todos os candidatos pouco oferecem planos detalhados e concretos para essas dificuldades emergenciais."

No recém-publicado livro Resgatar a Função Social da Economia: Uma Questão de Dignidade Humana, o economista Ladislau Dowbor, professor na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) afirma que "somos por toda parte herdeiros de simplificações ideológicas, em particular na economia, em que justificamos a barbárie agitando o perigo de uma barbárie ainda maior". "Ficar repetindo que ‘os mercados vão resolver' é domínio de idiotas, e de pessoas com interesses. Frequentemente ambos."

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