Sem investigação, rebeldes na Líbia poderão ficar impunes, diz HRW
25 de outubro de 2011Também a comissão das Nações Unidas encarregada de realizar investigações sobre violações de direitos humanos na Líbia apelou esta terça-feira (25.10) ao Conselho Nacional de Transição, no poder, para que respeite os direitos de todos os prisioneiros.
O pedido segue um da organização Human Rights Watch (HRW), que destacou na segunda-feira (24.10) a descoberta de 53 cadáveres em Sirte – cidade natal de Mouammar Kadhafi e onde o ex-dirigente líbio foi encontrado e morto na semana passada.
A HRW suspeita que os corpos sejam de combatentes pró-Kadhafi. Eles teriam sido executados pelas forças rebeldes que iniciaram revolta contra o governo no início do ano e acabaram por derrubar o regime que dirigiu a Líbia por 42 anos. As forças revolucionárias, cujo Conselho Nacional de Transição (CNT) detém agora o poder na Líbia, controlavam a região desde o início de outubro.
A Deutsche Welle conversou com Reed Brody, da Human Rights Watch. Ele disse ser “imperativo que as autoridades de transição na Líbia adotem medidas eficazes para controlar os grupos armados que se consideram acima da lei”.
DW: O que a Human Rights Watch constatou em Sirte, cidade natal de Kadhafi e um dos últimos bastiões leais ao ex-dirigente líbio?
Reed Brody: A Human Rights Watch encontrou 53 corpos em estado de decomposição num hotel abandonado de Sirte. Vários tinham as mãos atadas e foram mortos a tiros – e nós sabemos que o hotel estava sob controle de quatro brigadas anti-Kadhafi, e também se sabe que pelo menos quatro dos mortos foram partidários de Kadhafi (um ex-oficial do governo, um militar e dois residentes de Sirte).
DW: Portanto, não existe nenhuma prova direta da implicação dessas brigadas – as chamadas Katiba –, mas são brigadas que estariam nas imediações deste hotel?
RB: Isso (sic). Na realidade, na entrada do hotel e também nos muros interiores e exteriores (sic), estava escrito o nome dessas brigadas. Não podemos confirmar, mas as evidências sugerem, pelo menos, que [os corpos encontrados] foram assassinados por essas brigadas.
DW: No comunicado lançado [na segunda-feira, 24.10], a HRW pede ao Conselho Nacional de Transição (CNT) para abrir imediatamente uma investigação sobre este caso?
RB: Porque este massacre faz parte de uma tendência de assassinatos, de outros abusos cometidos por grupos armados anti-Kadhafi, que se consideram acima da lei. Então, achamos imperativo que as autoridades da transição lidem com essa situação e deixem claro que não vão tolerar assassinatos ou violações das Convenções de Genebra [sobre o direito humanitário internacional].
DW: Se o CNT não levar o inquérito a cabo sobre esses crimes, a HRW conclui que a situação dos direitos humanos, por enquanto, vai ser complicada na Líbia?
RB: Se eles não fizerem uma investigação desses crimes, vê-se como um sinal de que aqueles que lutaram contra Kadhafi podem fazer o que quiserem, sem temor de processos, de investigações.
DW: Mas a HRW também exige do CNT um inquérito sobre as circunstâncias da morte de Mouammar Kadhafi [na passada quinta-feira (20.10)] e de seu filho [Mouatassim Kadhafi]. Já obtiveram alguma resposta?
RB: O governo falou que vai fazer [a investigação], mas vamos avaliar se há protocolos das Nações Unidas com os métodos que deveriam utilizar para a pesquisa, para a investigação de supostas execuções extra-judiciárias. Vamos ver que tipo de investigação vai ser.
DW: Concretamente, um tal inquérito é crucial para determinar se a “nova Líbia” será um Estado de direito?
RB: Estes [próximos] dias e semanas, justamente, vão dar o caminho dessa "nova Líbia" – se será um Estado de direito ou não. É claro que, depois de 42 anos de Kadhafi, o momento é de alegria e de muitas possibilidades para a Líbia. E, justamente nestes dias, a criação de uma Constituição que defenda os direitos, a possibilidade de liberdade de expressão, o fim da impunidade… a HRW está a acompanhar muito de perto esta situação.
DW: É imperativo que as autoridades da transição assumam realmente as medidas para controlar toda a situação da segurança na Líbia, não é?
RB: Claro – de momento, ainda há muitos bandos, muitas brigadas incontroladas. É muito importante o governo assentar seu domínio sobre esses grupos.
Autor: António Rocha
Edição: Renate Krieger