Cabinda: Ativista Raul Tati pede reparação moral a Portugal
30 de maio de 2024"Portugal" ainda "tem responsabilidades" na solução do conflito sobre o futuro de Cabinda. A afirmação é de Raul Tati, primeiro-ministro do Governo sombra da UNITA, o maior partido da oposição em Angola.
Tati defende uma reparação moral por parte de Lisboa, decorrente do processo de descolonização que ficou por concluir no antigo protetorado. Isto, refere em entrevista à DW África, depois de quase um século de convivência com Portugal ao abrigo do Tratado de Simulambuco, assinado em 1885.
"Essa reparação moral significa que os portugueses, alguma vez, têm que pôr a mão na consciência e dizer que não foram leais para com os cabindas, com quem tiveram um tratado e uma convivência tranquila durante quase um século", argumenta o ativista.
Reparação "moral"
O docente universitário lança o repto depois das recentes declarações do Presidente português, Marcelo Rebelo de Sousa, sobre a necessidade de Portugal reparar os crimes que cometeu nos seus antigos territórios durante o período colonial.
Segundo Raul Tati, a intenção do povo de Cabinda não é uma "indemnização pecuniária ou material". "Antes pelo contrário, Cabinda é que está a dar riquezas para Portugal. Portugal tem 10% da exploração portuguesa do Bloco 14. Isso significa que, dos 100 mil barris de petróleo produzidos por dia, Portugal leva 10 mil para a Galp. Isto é talvez a moeda de troca com Angola por causa dessa questão de Cabinda, que fez calar os portugueses", afirma.
De acordo com Raul Tati, uma forma de reparação poderia ser a seguinte: Portugal poderia ajudar a resolver, com Angola, o impasse em Cabinda.
Diálogo com Luanda
O diálogo entre o Governo angolano e os movimentos independentistas e outros ativistas cabindas caiu no silêncio. Luanda nega a existência do conflito militar no enclave, que se arrasta há quase 50 anos.
Raul Tati diz que Portugal pode fazer parte da solução, embora esta dependa sobretudo da vontade do povo daquele território, rico em petróleo, situado a norte de Angola.
"Pensamos que Portugal pode muito bem desempenhar um papel do ponto de vista diplomático e criar um ambiente para ajudar a resolver essa questão. Não é uma questão apenas de Cabinda e de Angola. É uma questão onde Portugal também entra. Por isso é que estamos a exigir que Portugal faça a sua parte", defende.
Críticas a políticos portugueses
O ativista, defensor da autodeterminação de Cabinda, critica certos políticos portugueses que, contrariamente ao passado, deixaram de ter uma "posição clara" para a resolução do conflito. E diz que, "nesse sentido, vemos que não há uma coerência política dentro da classe política portuguesa no tratamento desse assunto".
Raul Tati sustenta que é preciso "desconstruir o mito ou a mentira" fomentados durante 50 anos de que Cabinda "é província de Angola". O académico defende que a solução do conflito não passa pela via militar, mas sim pela via política. Quer, por isso, mais abertura para o diálogo por parte do Governo de Luanda e pede ao Presidente João Lourenço, mediador de crises como a do Congo, a olhar primeiro para "os conflitos que tem em casa".
O académico falou à DW África na terça-feira (28.05), o dia em que foi apresentado em Luanda o seu novo livro "Identidade Histórica e Cultural dos Cabindas", por intermédio da Elivulu Editora. A obra, já apresentada em Cabinda, também deverá ser publicada em Portugal, ainda este ano.