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Uma bolsa para escritores estrangeiros em Berlim

Ricardo Domeneck
30 de janeiro de 2018

Nos últimos anos, a capital da Alemanha voltou a ser lar para inúmeros escritores de fora. Cidade acaba de conceder incentivos a autores de língua estrangeira que nela residem, incluindo uma brasileira.

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Symbolbild Frauenhand Schreiben Wiese
Foto: colourbox

A Alemanha é o país de Johann Wolfgang von Goethe e Friedrich Schiller. É o país de Heine e Bertolt Brecht. E hoje unem-se a eles os escritores que compartilham oxigênio conosco, mulheres como Monika Rinck e Elke Erb, homens como Rainald Goetz e Jan Kuhlbrodt. E não podemos deixar de pensar naqueles que sequer nasceram no país, mas falam sua língua, como Herta Müller, natural da Romênia e a mais recente ganhadora do Prêmio Nobel em língua alemã.

O que foi mesmo que Fernando Pessoa disse? Que sua pátria era sua língua? E quanto àqueles que dividem a terra de uma nação, são seus cidadãos, mas produzem em outras línguas?

Até pouco tempo, a Alemanha abrigava um grande exemplo, o do poeta Kito Lorenc (1938-2017). Ele nasceu no pequeno vilarejo de Schleife, no estado alemão da Saxônia. Lorenc chamava o local de Slepo, como era o nome do lugar em sórbio, uma das línguas minoritárias da Alemanha, na qual ele escrevia. 

Nossas noções de língua e literatura nacionais são muito mais complicadas do que queremos crer. Ainda que os próprios Goethe e Schiller, mencionados no início deste texto, tenham contribuído tanto para nossa ideia de tradição nacional.

Se Paris foi um grande centro literário no início do século 20, era tanto por conta de seus grandes escritores em língua francesa quanto por seus imigrantes, como Tristan Tzara, romeno tal qual Herta Müller, ou Guillaume Apollinaire, nascido em Roma com um nome de batismo nada francês: Wilhelm Albert Włodzimierz Apolinary de Wąż-Kostrowicki. Foi em Paris que Oswald de Andrade descobriu o Brasil, segundo Paulo Prado, e onde outros latino-americanos, como Vicente Huidobro e César Vallejo, produziram algumas de suas grandes obras.

Na mesma época, Berlim também contava com a contribuição literária de estrangeiros, escrevendo em outras línguas, como W.H. Auden e Christopher Isherwood. Este último criou um dos retratos mais conhecidos da cidade durante a República de Weimar e a ascensão dos nazistas em seu volume Goodbye to Berlin (1939).

Neste novo século, a capital alemã voltou a ser lar para inúmeros escritores estrangeiros. É uma comunidade vibrante, e por vezes mais integrada à cena alemã do que as que encontramos em cidades como Paris e Nova York, cidades tão insulares e fechadas para o trabalho literário em línguas que não sejam as suas.

Ontem foi anunciado em Berlim o resultado do primeiro concurso de bolsas literárias para escritores residentes em Berlim e que não escrevem em alemão. Isso demonstra uma percepção clara do governo berlinense de que a literatura da cidade é feita tanto por alemães quanto por estrangeiros, e que é importante fomentá-la.

Há um motivo de alegria especial para brasileiros que vivem em Berlim: um dos escritores é brasileiro, a cearense Érica Zíngano, que vive há alguns anos em Berlim. Além dela, foram agraciados as americanas Amanda DeMarco e Rebecca Rukeyser, o russo Dmitry Vachedin e os sírios Abdulkadir Musa e Liwaa Yazji. E isso é uma bela notícia para todos os escritores berlinenses, alemães ou não.

Na coluna  Bibliothek, publicada às terças-feiras, o escritor Ricardo Domeneck discute a produção literária em língua alemã, fala sobre livros recentes e antigos, faz recomendações de leitura e, de vez em quando, algumas incursões à relação literária entre o alemão e o português. A coluna Bibliothek sucede o Blog Contra a Capa.

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