Um pintor para pintores
27 de outubro de 2004Para marcar o centenário do falecimento do pintor francês Paul Cézanne em 2006 estão planejadas diversas exposições: em Nova York e Washington, Filadélfia e Londres, Paris e, claro, em sua cidade natal, a pequena Aix-en-Provence. Mas a cidade alemã de Essen, no Vale do Ruhr, antecipou o evento em dois anos.
A mostra Cézanne - Arrancada para o modernismo, do Museu Folkwang, ressalta a influência que o mestre francês – em vida praticamente ignorado por colecionadores e museus – exerceu para a geração seguinte. Ao todo, são mais de 100 pinturas, das quais 43 de Cézanne, 21 de Picasso, 14 de Matisse e Derain, oito de Braque, quatro de Vlaminck e três de Léger.
As telas, que depois seguem para Nova York, foram trazidas de 48 museus de todo o mundo, entre eles do Museu Pushkin de Moscou, do Hermitage de São Petersburgo, da National Gallery de Washington, do Guggenheim, do Metropolitan e do MoMa de Nova York, além da Tate Gallery de Londres e do Musée d'Orsay de Paris.
Na proa do modernismo
Contra a vontade de seu pai, um bem-sucedido banqueiro provençal, Cézanne estudou artes plásticas em Paris em 1861. Durante a vida, entretanto, obteve o devido reconhecimento apenas de outros pintores, o que o tornou um "pintor para pintores". Segundo o jornal Frankfurter Allgemeine Zeitung, "a exposição permite acompanhar a mudança radical que a arte sofreu após a morte de Cézanne".
As telas que pintou enquanto jovem, mais coléricas, escuras e dramáticas, com um tratamento de cores inédito até então, foram de grande influência para os fauvistas, em especial Derain e Vlaminck. Seus trabalhos mais tardios, posteriores a 1880, ensinaram a mestres cubistas como Picasso, Braque e Léger a decompor o mundo em formas geométricas. O papel do "cézannisme" nas vanguardas modernistas é o que a exposição em Essen busca ressaltar – uma influência, sugerem os curadores, até maior que a de outros pioneiros como Vincent van Gogh e Paul Gauguin.
Contemplação comparativa
Os curadores Felix Baumann e Walter Feilchenfeldt dividiram a exposição em 20 motivos, como auto-retratos, nus, banhistas, naturezas mortas e paisagens. Cada um desses módulos começa com telas de Cézanne, seguidas por obras de mestres modernistas, permitindo assim uma contemplação comparativa. Segundo o jornal Tagesspiegel, "iniciados sabiam que em cada pintura de Cézanne estava contido todo o segredo da pintura modernista".
A genialidade da curadoria salta aos olhos já na primeira sala, uma espécie de antecâmara da mostra. Lá está uma tela de Maurice Denis intitulada Homenagem a Cézanne (1900), na qual pintores do grupo dos Nabis (profetas, em hebraico) admiram uma natureza morta de Cézanne – o original, que pertenceu um dia a Paul Gauguin, está pendurado logo ao lado. Gauguin, um de seus admiradores, reinterpretou o motivo em duas outras pinturas, também expostas na mesma sala.
Ponto forte da mostra é a série dos banhistas, na qual se reconhece a intersecção entre As banhistas (ca. 1890) de Cézanne e releituras de Matisse e Picasso. Outro destaque é a tela Mardi gras (1888), exposta pela primeira vez na Alemanha desde 1900, na qual Cézanne exprimiu seu encantamento pelo filho adolescente, na imagem vestido de Arlequim e acompanhado de um amigo em fantasia de Pierrô – motivos da Commedia dell'Arte italiana que mais tarde também inspiraram Picasso.
Também imperdíveis são as naturezas mortas, centrais para a obra de Cézanne, e as paisagens, obras mais tardias, nas quais denota certa relação com o Impressionismo.
A exposição Cézanne – Arrancada para o modernismo vai até 16 de janeiro de 2005 no Museu Folkwang, em Essen.