Ucrânia luta para exportar grãos apesar do bloqueio russo
12 de julho de 2022O ministro ucraniano da Infraestrutura, Oleksandr Kubrakov, acusou recentemente a Rússia de "terrorismo", ao "manter gente de todo o mundo como reféns", bloqueando as exportações de cereais da Ucrânia. O presidente Vladimir Putin estaria tentando forçar a comunidade internacional a "retirar algumas das sanções, aí os cereais poderão sair", afirmou.
Neste período do ano, o país sob invasão normalmente exporta de 6 milhões a 7 milhões de toneladas de grãos por mês. Em junho, contudo, a "grande cesta de pão do mundo", como costuma ser chamada, só pôde embarcar 2,2 milhões de toneladas, segundo a Associação Ucraniana de Cereais.
Pior ainda: 22 milhões de toneladas da safra de 2021 estão retidas, devido à guerra. Além disso, como noticiou a semanário americano The Wall Street Journal, Moscou estaria "discretamente institucionalizando" o roubo de centenas de milhares de toneladas de cereais da Ucrânia, exportando-os para países pró-russos do Oriente Médio.
Em contraste a tudo isso, o Kremlin afirma que a Ucrânia está livre para embarcar os grãos em seus portos. Segundo o ministro russo do Exterior, Sergei Lavrov, Moscou estaria pronto a negociar as exportações com a Ucrânia e a Turquia.
Urgência de estocar e exportar grãos
Em julho, os agricultores ucranianos começam suas colheitas, mas teme-se que não terão onde estocar os novos grãos, caso o bloqueio russo não seja levantado. Conta-se com uma safra de pelo menos 50 milhões de toneladas, e Kiev está procurando rotas alternativas para suas exportações.
Uma opção possível são os portos ao longo do rio Danúbio, no sudoeste do país, capazes de embarcar uns 30% da safra. Outra seriam as 12 passagens de fronteira com outros países da União Europeia, já apelidadas "alamedas de solidariedade". No entanto, apesar de sua capacidade ter sido dobrada em junho para 5,8 milhões de toneladas, a infraestrutura europeia não tem como absorver volumes maiores.
A Ucrânia dispõe de uma capacidade de estocagem comercial de cereais entre 65 milhões e 67 milhões de toneladas. Como cerca de 20% das instalações se encontram nos territórios atualmente sob ocupação russa, só sobram para os agricultores entre 20 milhões e 25 milhões de toneladas de capacidade. Assim, muitos se apressam em criar armazéns temporários.
Anna Nagurney, da Universidade de Massachusetts, lembra que cereais como trigo e cevada são "perecíveis, e precisam ser levados aos mercados o mais depressa possível" e, como "produtos de qualidade mais alta rendem preços mais altos", os custos de transporte são "uma grande questão".
Alternativas para contornar altos custos de transporte
Uma vez que o pico da exportação de cereais na Ucrânia é de julho a dezembro, os agricultores estão pressionados a vender a maior quantidade, o mais rápido possível. O atual preço da tonelada da cevada, para entrega em Constanta, o maior porto da Romênia, é de USnbsp;160 a USnbsp;180, contra USnbsp;40 a USnbsp;45 em 2021.
Dessa quantia, os agricultores ucranianos ficam com menos de USnbsp;100 por tonelada, enquanto os mediadores levam USnbsp;60, devido aos altos custos para retirar o produto do país em guerra, do combustível mais caro aos atrasos nas fronteiras.
Constanta se revelou um dos principais canais de exportação para os produtos agrícolas da Ucrânia. O porto ostenta o terminal de embarque de grãos mais veloz da Europa, tendo processado quase 1 milhão de toneladas desde o início da invasão, em 24 de fevereiro.
No entanto, os operadores portuários alertam que em breve poderá ficar impossível manter esse volume sem apoio da UE. Gennadiy Ivanov, diretor executivo da empresa BPG Shipping, sublinha que a meta principal permanece a mesma: "desbloquear os portos marítimos da Ucrânia".
Nesse ínterim, a Romênia também abriu um mês antes do previsto a conexão ferroviária da época soviética entre o porto de Galati, no Danúbio, e a Ucrânia. Desse modo, os cereais que vêm do país sob invasão russa, podem chegar a Galati diretamente, via o rio Moldávia, para ser transferidos a barcaças e depois seguir para outros portos, inclusive o de Constanta.
Saída pela Polônia, ajuda questionável da Turquia
No contexto dos esforços para salvaguardar a safra ucraniana, os Estados Unidos se comprometeram a construir celeiros temporários perto da fronteira polonesa. A infraestrutura atual só permite o transporte de 1,5 milhão de toneladas por mês para a Polônia, enquanto a demanda da Ucrânia é de 5 milhões de toneladas. Segundo Varsóvia, a expansão da infraestrutura levará de três a quatro meses.
"Com muitas estradas e outras vias de transporte comprometidas na Ucrânia, mais diversos gargalos logísticos e a necessidade de reservar suficientes veículos e motoristas, determinar onde localizar os celeiros na Polônia é, em si, um problema importante", explica Nagurney.
Também há aspectos políticos a resolver: recentemente o primeiro-ministro polonês, Mateusz Morawiecki, sentiu-se obrigado a assegurar os agricultores nacionais de que o cereal ucraniano não será vendido na Polônia, mas exportado para a África e o Oriente Médio.
Por sua vez, o presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, declarou que Ancara está trabalhando junto às Nações Unidas, Ucrânia e Rússia para encontrar uma solução, oferecendo corredores seguros para as cargas de trigo no Mar Negro. Isso resultaria em custos logísticos bem inferiores ao transporte através da fronteira oeste com a Polônia.
A questão é: de quem é o produto que a Turquia transportará? Segundo a agência de notícias russa Tass, na primeira semana de julho autoridades da região sob controle russo de Zaporíjia, no sudeste da Ucrânia, anunciaram um acordo para exportação de cereais, sobretudo para o Oriente Médio.
Para grande cólera da Ucrânia, a Rússia, de fato, enviou 7 mil toneladas de grãos a partir do porto ocupado de Berdyansk. O governo convocou o embaixador turco a Kiev, depois de ficar confirmado que a Turquia permitira ao navio de bandeira russa deixar o porto de Karasu.