Pesquisadores dizem que não endossaram plano de vacinação
13 de dezembro de 2020O Ministério da Saúde informou neste domingo (13/12) que os pesquisadores que tiveram seus nomes citados no plano nacional de vacinação contra a covid-19 foram convidados a discutir a estratégia, mas não tiveram "poder de decisão na formalização do plano".
O comunicado da pasta veio um dia depois de um grupo de 36 cientistas ter divulgado uma nota pública afirmando que não deu anuência ao documento apresentado ao Supremo Tribunal Federal (STF), embora seus nomes tenham sido citados como colaboradores.
O ministério afirmou que os pesquisadores listados são técnicos convidados que se envolveram "de alguma forma, técnica e cientificamente, com alguns dos eixos de discussão do plano".
"Vale destacar que os convidados especiais foram indicados ao Programa Nacional de Imunizações para participarem de debates, com cunho opinativo e sem qualquer poder de decisão", diz a pasta.
O grupo chamado "Eixo Epidemiológico do Plano Operacional Vacinação Covid-19" assessorou o governo federal na elaboração do plano de imunização, mas disse que só tomou conhecimento da existência de um documento final através da imprensa.
"Nos causou surpresa e estranheza que o documento no qual constam os nomes dos pesquisadores deste grupo técnico não nos foi apresentado anteriormente e não obteve nossa anuência", dizia a nota conjunta, publicada no sábado após a divulgação do plano.
Segundo os pesquisadores, é "importante destacar que o grupo técnico havia solicitado reunião e manifestado preocupação pela retirada de grupos prioritários e pela não inclusão de todas as vacinas disponíveis que se mostraram seguras e eficazes".
O grupo afirma que todas as populações vulneráveis deveriam ser consideradas como prioritárias para a vacinação, incluindo quilombolas, comunidades ribeirinhas, pessoas privadas de liberdade e pessoas com deficiência.
O plano do governo, por sua vez, pretende priorizar profissionais de saúde, idosos, indígenas, pessoas com comorbidades, professores, forças de segurança e salvamento e funcionários do sistema prisional, somando um total de 50 milhões de pessoas.
Em relação a acordos para compra de imunizantes com laboratórios, os pesquisadores pedem "esforços do Ministério da Saúde para que sejam imediatamente abertas negociações para aquisição de outras vacinas que atendam aos requisitos de eficácia, segurança e qualidade".
"Um atraso na campanha de vacinação significa vidas perdidas", acrescenta o texto, frisando ser necessário neste momento "utilizar a ciência para a tomada de decisão que norteará o que mais importa, a preservação de vidas de milhares de brasileiros e brasileiras".
Antes da divulgação da nota pública, a pesquisadora Ethel Maciel – enfermeira, epidemiologista e professora da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), que integra o grupo técnico – já havia se pronunciado em rede social sobre o caso.
"Nós, pesquisadores que estamos assessorando o governo no Plano Nacional de Vacinação da Covid-19, acabamos de saber pela imprensa que o governo enviou um plano no qual constam nossos nomes e nós não vimos o documento. Algo que nos meus 25 anos de pesquisadora nunca tinha vivido!", escreveu ela no Twitter.
Em entrevista ao jornal Folha de S. Paulo, Maciel afirmou que pesquisadores que participam de uma pesquisa ou ação normalmente recebem a versão final do documento antes da publicação, o que não aconteceu com o plano de vacinação do governo. O grupo solicitou uma reunião com o Ministério da Saúde, que foi agendada para esta segunda-feira.
O plano do governo
O plano nacional de imunização contra a covid-19 foi entregue pelo governo federal ao STF, e divulgado pelo ministro Ricardo Lewandowski no sábado. A estratégia, no entanto, não aponta uma data para o início da imunização em massa ou um cronograma de vacinação. Também lista como "garantidas" vacinas que ainda estão sendo negociadas pelo governo.
Nas últimas semanas, o governo Jair Bolsonaro vinha sendo alvo de críticas intensas por não apresentar um plano nacional de vacinação. Agora, a divulgação ocorre em meio ao agravamento de uma disputa entre o presidente da República e o governador de São Paulo, João Doria (PSDB), sobre o protagonismo na vacinação no país.
Segundo o documento do ministério, a data de início da campanha nacional ainda depende do registro de uma vacina na Anvisa e de sua liberação.
O governo estima que serão necessárias 108,3 milhões de doses para imunizar todos os grupos prioritários. Isso deve ocorrer em quatro fases, levando em conta a aplicação de duas doses. O governo ainda estima uma perda de 5% do material durante o processo. Essas doses cobririam cerca de 50 milhões de brasileiros, menos de um quarto da população.
Na primeira etapa de vacinação, devem ser incluídos os profissionais de saúde, pessoas com mais de 75 anos e indígenas com mais de 18 anos. Já a segunda fase inclui pessoas de 60 a 74 anos.
A terceira fase tem como alvo pessoas com comorbidades – diabetes mellitus, hipertensão, doença pulmonar, doença cardiovascular crônica, câncer, doença renal, obesidade grave, entre outras. Na quarta e última fase estão os professores, forças de segurança e funcionários do sistema prisional.
O texto ainda aponta que "o Brasil já garantiu 300 milhões de doses de vacinas covid-19 por meio dos acordos" com laboratórios internacionais.
"Fiocruz/AstraZeneca: 100,4 milhões de doses, até julho de 2020, mais 30 milhões de doses/mês no segundo semestre; Covax Facility: 42,5 milhões de doses; Pfizer: 70 milhões de doses (em negociação)", aponta o documento.
Há nessa lista vacinas cujo fornecimento ainda depende de negociações, como a da Pfizer. Na última semana, o governo federal passou a pressionar a farmacêutica a fornecer doses após ter ignorado ofertas da empresa nos últimos meses. A mudança ocorreu após o governo de São Paulo ter anunciado que pretende começar a vacinar a população do estado em 25 de janeiro.
O documento do governo federal lista um total de 13 vacinas, entre elas a Coronavac, que está sendo fabricada pelo Instituto Butantan, ligada ao governo paulista, em parceria com a fabricante chinesa Sinovac. No entanto, o governo não aponta quantas doses da vacina do Butantan podem eventualmente ser adquiridas.
EK/abr/ots