Paralisação do governo reforça frustração dos americanos
2 de outubro de 2013Em Washington e em outras partes dos Estados Unidos, poucos eram capazes de crer no que acontecia enquanto passavam os últimos segundos anunciando a terça-feira (01/10). Até mesmo o presidente Barack Obama esperava que o Congresso ainda pudesse chegar a um consenso antes da meia-noite e evitar a paralisação quase total dos serviços públicos federais.
Em dias normais, a capital americana é marcada pela agitação. Mais de 700 mil funcionários públicos trabalham na cidade e milhões de turistas visitam anualmente os marcos políticos dos EUA. O governo é o maior empregador do país – mais de 2 milhões de pessoas trabalham para o Estado.
Estima-se que 800 mil tenham que, agora, entrar em licença forçada não remunerada. Somente os postos de trabalho absolutamente necessários para manter o país funcionando continuam a ser ocupados.
Muitos dos funcionários públicos que chegaram a ir trabalhar na terça-feira em Washington tiveram de voltar para casa.
"Ao chegar aqui soube que meu empregador estava fora de atividade temporariamente", disse um deles. "Agora estou esperando que os trens voltem a funcionar e eu possa ir para casa." Outros se mostram menos calmos: "Os salários daqueles lá em cima também tem que ser cortados. Se não recebemos nenhum dinheiro, eles também não devem receber."
Posições-chave do serviço público, como escolas, transportes públicos e forças de segurança não foram afetadas pela paralisação. Por outro lado, dezenas de museus, memoriais e até mesmo os zoológicos públicos foram fechados. Especialistas advertem que, somente na região da capital, o fechamento custará até 200 milhões de dólares diariamente.
Maioria contra interrupção
É um novo ponto baixo na luta de poder num Congresso que já não gozava de popularidade. Em todo o país, falta compreensão sobre o fato de os representantes eleitos pelo povo não terem sido capazes de se sentarem à mesa e chegarem a um consenso sobre o orçamento do ano fiscal de 2014.
Segundo pesquisa de opinião da CNN, 70% dos americanos reprovam a paralisação do serviço público, mesmo que por alguns dias. Observadores da política em Washington temem que, atualmente, o clima esteja tão envenenado que até mesmo simples propostas legislativas possam ser instrumentalizadas, com o intuito de prejudicar adversários.
Para Travis Culliton, que na trabalha na Força Aérea americana, a paralisação é mais um sinal de que os deputados deixaram de lado as pessoas que os elegeram. "Acredito que somente muito poucos dos nossos representantes escutam o que as pessoas lhe dizem", declarou o pai de família, de 41 anos.
Como único assalariado na família, ele, como muitos outros, tem problemas em lidar com os abrangentes cortes orçamentais que atingiu muitos órgãos federais já há alguns meses. Segundo Culliton, a paralisação seria como um chute em alguém que já se encontra no chão.
"Minha família vive do meu salário e temos de ser muito econômicos. Os cortes forçados têm nos levado à ruína. Eu havia acabado de começar a pagar contas atrasadas. A hipoteca de nossa casa ameaça ser executada caso eu não receba meu salário completo este ano", conta.
Nenhuma melhoria à vista
Culliton responsabiliza os republicanos na Câmara dos Representantes pela paralisação do governo federal. Segundo ele, a oposição estaria usando as famílias de camadas médias como reféns para bloquear a reforma sanitária de Obama. A opinião, segundo pesquisas, é compartilhada por um em cada sete americanos.
"Os republicanos tentaram chantagear os Estados Unidos e o Congresso para revogar uma lei que não conseguiram bloquear de forma legal", diz um advogado, enquanto está a caminho do trabalho em Washington.
De acordo com estimativas do pesquisador Jacob Kirkegaard, do Instituto Peterson de Economia Internacional, a situação deverá se acirrar ainda mais. Ele diz que o movimento conservador Tea Party, encabeçado pelo senador texano Ted Cruz, assumiu praticamente o controle do Partido Republicano.
Segundo o pesquisador, os membros do Tea Party não se mostrarão satisfeitos até que a reforma do setor de saúde, conhecida como "ObamaCare", seja revogada.
Analistas já estão de olho no próximo confronto em Washington, que ameaça ter efeitos ainda mais amplos: o debate sobre o teto da dívida. Como democratas e republicanos trafegam de uma crise para outra em velocidade máxima, os americanos provavelmente terão se ajustar para mais uma batalha entre os blocos políticos.
No entanto, caso não se chegue a um consenso sobre a elevação do teto da dívida, as consequências são tão graves, que ambos os lados terão de voltar à mesa de negociações. O limite atual da dívida deverá ser atingido já no próximo dia 17 de outubro. A partir daí, os EUA estariam inadimplentes. A pressão sobre os políticos aumenta a cada dia.