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PolíticaFrança

A dura luta da França contra o radicalismo islâmico

Barbara Wesel Studio Brüssel
Barbara Wesel
22 de outubro de 2020

O brutal assassinato de um professor levou o governo francês a reagir com firmeza contra radicais islâmicos. Mas Macron também precisará de paciência e bom senso se não quiser perder a luta, opina Barbara Wesel.

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O presidente da França, Emmanuel Macron
O presidente da França, Emmanuel MacronFoto: Abdulmonam Eassa/Pool/Reuters

No final de setembro, um grave ataque com faca contra transeuntes em frente ao antigo prédio do jornal satírico Charlie Hebdo em Paris sinalizou que, depois de alguns meses de calmaria, o espectro do islamismo violento voltou a assombrar a França.

Após esse episódio, no início de outubro o presidente Emmanuel Macron fez um discurso há muito planejado para anunciar um novo impulso no combate à violência islâmica. Foi uma fala equilibrada, sem retórica de direita ou mesmo islamofóbica. Mas, com a França acumulando 240 mortes em ataques de origem radical islâmica nos últimos cinco anos, Macron sabe o que está enfrentando.

O horrível assassinato do professor Samuel Paty na semana passada provou mais uma vez que um movimento clandestino islâmico se espalhou na França, e que ele até agora tem sido capaz de escapar aos olhos e aos braços do Estado. "Separatismo islâmico" é como Macron classificou o fenômeno que se espalhou desde o ataque ao World Trade Center em 2001 e ainda mais com a ascensão do "Estado Islâmico" (EI) e de governos islâmicos autoritários no Oriente Médio.

O presidente turco, Recep Tayyip Erdogan – que abusa da religião como instrumento de opressão e manutenção do poder –, é um deles, mas há muitos outros. Aqui, como já ocorria antes, os assassinos encontram proteção e apoio ideológico. Com sua nova postura dura contra as ações agressivas de Erdogan no Mediterrâneo oriental, o presidente Macron demonstra como encara o contexto global.

No entanto, ele tem que travar essa luta principalmente em solo francês. Muito do que o governo está fazendo agora tem a abordagem certa: garantir que o treinamento de pregadores muçulmanos ocorra em solo francês, assegurar escolaridade obrigatória para crianças muçulmanas, agir para deportar radicais islâmicos e estender um controle estrito sobre associações culturais que toleram pregadores violentos em suas fileiras.

Ninguém deve falar em "islamofobia" na França agora, já que essas casas de oração e organizações tiveram muitos anos para rever sua tolerância ou apoio à violência entre seus seguidores.

Rigor político

No entanto, o rigor político é apenas um meio contra a violenta sociedade islâmica paralela que se desenvolveu nas cidades francesas e entre alguns imigrantes. Na melhor das hipóteses, pode alcançar sucessos de curto prazo e tranquilizar os eleitores.

Observadores de todas as matizes políticas na França sabem que o problema é muito mais profundo. O presidente abordou abertamente duas das causas: o passado colonial não processado do país, especialmente a Guerra da Argélia, e a miséria social e econômica nos subúrbios.

O próprio Estado francês criou esses guetos e tem culpa pelo "separatismo" que ali se desenvolveu. Eliminá-lo levará gerações. E isso não funciona apenas com pressão. É preciso dinheiro, treinamento, moradia e infraestrutura – a lista é interminável.

Há 25 anos, o filme O ódio causou furor ao explicitar a realidade dos moradores dos subúrbios. Neste ano, Les Misérables, seu sucessor, chegou às telas, e a França burguesa ficou chocada ao ver quão pouco essas regiões mudaram.

Essa será uma tarefa e tanto para Macron, que deve se candidatar à reeleição em pouco mais de um ano. Ele bem que poderia iniciar imediatamente um exame honesto do passado. Isso pode vir a custar-lhe votos da direita, mas seria uma tarefa historicamente importante para um presidente de padrões históricos tão elevados.

Paciência e persuasão

O rígido secularismo do Estado francês, com a exclusão total da religião das funções públicas, também contribui para a intensidade dessa disputa.

Por um lado, o governo exige acertadamente que a população muçulmana se submeta às leis e normas do país. Por outro lado, quase não dá espaço para expressão religiosa. Talvez a classe política na França deva se questionar se a reverência às suas tradições seculares ainda constitui uma base sólida numa realidade multiétnica e multirreligiosa.

Por outro lado, há o fracasso do islã organizado na França. E o número de vítimas do terrorismo islâmico nos últimos anos afasta qualquer desculpa. Existem pregadores admiráveis ​​no país que lutam pela tolerância. Ma há também o florescimento nas sombras de salafistas e outros linhas-duras que continuam a pregar a violência contra os "infiéis". Uma rápida olhada nas redes sociais dos envolvidos no assassinato do professor Samuel Paty é capaz de fazer o sangue congelar de horror.

O presidente Macron precisará de paciência, persuasão, dureza e flexibilidade se quiser ganhar algum terreno nesta luta. Ele não pode realmente vencê-la. Isso porque a França se afastou dessa camada da sociedade por muito tempo. No final das contas, é preciso mais do que um chefe de governo. Isso também significa que a sociedade civil da França deve finalmente enfrentar os erros do passado.

Barbara Wesel é jornalista da DW. O texto acima reflete a opinião pessoal do autor, e não necessariamente da DW.