Seja no pico mais alto da Rússia, o Monte Elbrus, no Cáucaso; nas profundezas do metrô; ou nas fachadas de arranha-céus em Moscou, a transmissão do discurso de Vladimir Putin pôde ser vista por toda parte nesta quarta-feira (15/01).
Agora está claro por que a ampliação do alcance era tão importante: em seu discurso sobre o estado da nação, o presidente russo anunciou uma reforma constitucional fundamental, que pela primeira vez delineia o caminho para sua manutenção no poder após o fim de seu mandato em 2024.
Foi uma surpresa que os observadores já estavam esperando há algum tempo. E é certamente um terremoto político doméstico. A renúncia do governo Dmitri Medvedev, algumas horas depois, reforça essa impressão.
A Rússia não tem tempo a perder, disse Putin no início de seu discurso perante a Assembleia Federal em Moscou. Como esperado, o chefe do Kremlin dedicou a maior parte de sua fala a promessas sociais, destinadas principalmente a aumentar a baixa taxa de natalidade.
A verdadeira razão da pressa de Putin, no entanto, é seu próprio futuro: ele se posiciona para resolver o chamado "problema de 2024". Esse é o termo usado na Rússia para a questão de como Putin poderá permanecer no poder após o término de seu mandato. Segundo a Constituição russa, ele não pode mais concorrer após dois mandatos de seis anos.
Entre as muitas promessas de prosperidade, o chefe do Kremlin sugeriu, como que de passagem, mudar a Constituição da Rússia e, assim, seu sistema político. Típico de Putin: não há necessidade de reformar a Constituição russa de 1993, declarou, para logo em seguida propor várias mudanças fundamentais.
Essas reformas devem ser confirmadas pelo povo, embora o líder do Kremlin não tenha usado a palavra "referendo". Mas há décadas não há consultas populares na Rússia.
O projeto de Putin prevê várias correções políticas fundamentais: a câmara baixa do Parlamento em Moscou, a Duma Federal, deve receber mais poderes e, no futuro, determinar o primeiro-ministro e o gabinete de governo – o que até agora fora responsabilidade exclusiva do presidente.
Aparentemente Putin parte do pressuposto de que a Duma sempre vai decidir a seu favor. Afinal, os partidos seriam "patrióticos", em sua maioria, ou seja, leais ao Kremlin, disse. E declarou expressamente que de forma alguma a Rússia se tornará uma república parlamentar.
Ao mesmo tempo, ele propôs que os futuros candidatos à presidência cumpram critérios claros: devem viver na Rússia há pelo menos 25 anos e não ter outra nacionalidade. Isso visa, claramente, excluir políticos de oposição no exílio, como Mikhail Khodorkovsky.
Além disso, também ministros e parlamentares só devem possuir cidadania russa, supostamente para não serem chantageáveis pelo Ocidente – ou seja, passíveis de sanções. A sugestão de Putin de que a Constituição dê primazia ao direito russo frente ao direito internacional aponta para uma continuação do confronto com o Ocidente.
Esse novo sistema de poder abre dois caminhos imagináveis para o chefe do Kremlin: como entre 2008 e 2012, ele poderia se tornar primeiro-ministro. Ou ser eleito chefe do Conselho de Estado, cujos poderes ele deseja ampliar na Constituição. Uma coisa é certa: Vladimir Putin não está pensando em entregar o poder na Rússia.
A partir de agora começa para ele e o país uma nova etapa política, com resultado em aberto. Mesmo que 2024 ainda pareça distante, não resta muito tempo a Putin. A próxima eleição parlamentar está prevista já para o próximo ano, e até lá o chefe de Estado gostaria de ver sua reforma aprovada com sucesso.
Atualmente ele se encontra firme no poder, tendo, portanto, boas chances de determinar o destino da Rússia ainda por muitos anos.
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