Ao passar recentemente pela vitrine de uma loja, uma foto gigantesca de uma jovem com um sorriso hesitante chamou minha atenção. Embaixo dela, em letras garrafais, estavam as palavras "o futuro é brilhante". Uma declaração ousada, em muitos sentidos. No entanto, apesar de todo o alarido da mensagem, a expressão no rosto da modelo parecia sussurrar uma história diferente.
Talvez ela soubesse que estava posando para uma mentira. Para um futuro em que o brilho mais imediato é o do laranja incandescente dos incêndios climáticos, no qual as temperaturas aumentam e as camadas de gelo continuam a derreter enquanto os combustíveis fósseis são extraídos e queimados como se não soubéssemos de nada; por um futuro no qual seca e inundações competem por socorro e furacões atingem regiões costeiras – enquanto políticos dão de ombros, num abandono irresponsável.
Tais realidades, tal dissociação devastadora estão no cerne da greve global desta sexta-feira (25/09). Organizada pelo movimento climático internacional Fridays for Future (FFF), trata-se de mais um apelo por metas e ações ambiciosas, mais uma tentativa de transmitir a simples verdade de que realmente temos apenas um planeta e outro lembrete aos críticos que menosprezam o FFF como uma fase passageira da adolescência de que nada poderia estar mais longe da verdade.
Temperaturas recordes e desmatamento
Mais de dois anos se passaram desde que a fundadora da FFF, Greta Thunberg, embarcou em sua primeira greve solitária em frente ao Parlamento sueco. E um ano se passou desde que o movimento de greves escolares que se expandiu em torno dela mobilizou pelo menos 6 milhões de pessoas em 150 países para exigir ações climáticas.
Muita coisa aconteceu nesse tempo: os mais altos recordes de temperatura já foram quebrados; Sibéria, Austrália e Estados Unidos sofreram incêndios sem precedentes relacionados ao aquecimento global; as geleiras continuaram a recuar; ciclones na África ceifaram mais de mil vidas, e a seca atingiu a agricultura em grande parte do Europa.
Enquanto isso, o desmatamento continua na Amazônia; o presidente dos EUA, Donald Trump, deu luz verde para o desenvolvimento de petróleo e gás no refúgio ártico do Alasca e a Alemanha não planeja largar o carvão até 2038.
Durante todo esse tempo, os ativistas do FFF têm pressionado os líderes mundiais a agirem. Menos visivelmente, é verdade, já que a pandemia os forçou a protestar online em vez de se reunir em massa, mas eles continuaram pressionando.
Só nas últimas semanas e meses, Thunberg teve uma audiência com a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, e com a chanceler federal alemã, Angela Merkel. Antes da pandemia, ela e outros membros do FFF conquistaram a reputação de não terem medo de dizer verdades cruéis a chefes de Estado e da indústria em eventos de alto escalão no mundo todo.
Metas climáticas insuficientes
Tais reuniões e aparições públicas são amplamente apontadas como truques publicitários. Por ambos os lados. No entanto, cidades, governos e até mesmo a UE declararam emergências climáticas, e no início deste mês, Von der Leyen, que apresentou um Green Deal para a Europa no final de 2019, disse que o bloco deve agora ter como meta um corte de 55% nas emissões de carbono até 2030.
E esta semana, a China – a maior emissora de CO₂ ‚do mundo – anunciou planos de atingir seu próprio pico de emissões em 2030 e se tornar neutra em carbono até 2060. Essa data infelizmente está muito longe, e ele não manterá o aumento da temperatura abaixo de 1,5 grau Celsius. Mas está sendo considerada um passo significativo no caminho da ação climática global.
Políticos, claro, dificilmente atribuirão grandes mudanças em suas políticas a um grupo – embora grande – de adolescentes e jovens de 20 e poucos anos. Porém, é difícil imaginar que eles não tenham sido tocados pela influência e tenacidade desse movimento que gerou inúmeros subgrupos e provou ser difícil de ignorar.
A greve global desta sexta-feira será diferente daquele evento eufórico massivo observado nesta mesma época do ano passado, pois será adaptado às restrições impostas pela covid-19 em cada local. Mas não será menos determinada. Como os próprios ativistas do FFF dizem, eles continuarão protestando enquanto a exploração da natureza continuar. Até que a crise climática seja superada.
Isso, é claro, exigirá uma ação ousada e organizada num nível político e regulatório. Isso exigirá que os políticos de todo o mundo sejam tão tenazes em suas ações quanto os adolescentes que convocam a greve. Se nossos chefes de governo, de Estado e da indústria seguissem esse exemplo, o futuro assumiria um brilho totalmente novo. E isso seria algo digno de um sorriso genuíno.
Tamsin Walker é editora de meio ambiente da redação em inglês da DW. O texto reflete a opinião pessoal da autora e não necessariamente da DW.
Adaptação: Isadora Pamplona