Onde os populistas encontram terreno na Alemanha
18 de agosto de 2017Os populistas de direita da Alternativa para a Alemanha (AfD) já viram dias melhores. Em 2016 seu partido conquistou assentos em oito legislativos estaduais, chegando a obter mais de 20% em dois pleitos. Agora eles concentram meros 7% a 8% nas pesquisas de intenção de voto para as eleições ao Parlamento alemão de 24 de setembro.
Analistas concluem que cada vez mais a AfD se transformou numa legenda de um tema só, ao articular a irritação popular pela política de boas-vindas aos refugiados no país. Mas quem deduz que o apoio aos populistas seja maior nas áreas de maior concentração de requerentes de refúgio, se engana.
Leia a cobertura completa sobre a eleição na Alemanha em 2017
Na Alemanha eles são distribuídos pelos 16 estados segundo os níveis populacionais e de renda – portanto as unidades federativas mais pobres e menos populosas do Leste – antes pertencentes à Alemanha comunista – recebem menos refugiados do que as do Oeste. Mas a AfD continua tendo bom desempenho nas regiões orientais, contrariando a tendência nacional.
Isso se aplica em particular a Mecklemburgo-Pomerânia Ocidental, no Nordeste alemão, estado natal de ninguém menos do que a chanceler federal Angela Merkel. Com 1,6 milhão de habitantes, ele apresenta o menor número de refugiados per capita do país.
Na sondagem mais recente, divulgada em 23 de julho, 20,5% dos consultados disseram ser a favor da AfD – apenas três pontos percentuais a menos do que alcançaram os populistas na eleição de setembro último. Cabe investigar o que está acontecendo no único estado em que o apoio à AfD cresceu desde o começo de 2017.
Medo fala nas urnas
A presidente do Conselho de Refugiados de Mecklemburgo-Pomerânia Ocidental, Ulrike Seemann-Katz, não tem papas na língua. Indagada por que um grupo anti-imigração tem tamanha aceitação numa região com tão poucos migrantes, sua resposta é bem direta: medo.
"Psicologicamente é fácil explicar: seres humanos temem o que não conhecem", diz Seemann-Katz. Segundo ela, os residentes das zonas rurais do nordeste alemão quase não têm experiências pessoais com os solicitantes de refúgio, e os poucos abrigos para refugiados existentes funcionam como ilhas isoladas, com pouco apoio ou contato com o mundo exterior.
Os migrantes enviados para lá tendem a seguir rapidamente para as cidades. E, numa região com taxa de desemprego três vezes mais alta do que a média nacional, muitos se ressentem do que percebem como tratamento preferencial para os refugiados.
Seemann-Katz fica sensivelmente emocionada ao ler em voz alta os e-mails cheios de "puro racismo" que sua organização recebe regularmente. Um reclama por ter que varrer a calçada defronte da própria casa enquanto candidatos a refúgio desfilam o dia todo para baixo e para cima ,"com um smartphone na mão esquerda e um Red Bull na direita". Outro simplesmente pontifica: "Muito obrigado, Alemanha. A gente precisa de novas leis e mais deportações."
A funcionária não tem dúvida de que a força da AfD em sua região se explica pela hostilidade com os forasteiros e em especial com os refugiados. E não vê solução para quebrar o círculo vicioso da falta de familiaridade que gera medo e desprezo.
"Não acho que haja algo que possamos fazer. Os refugiados não querem ficar onde não são particularmente bem-vindos, isso é natural. Se você passar com um grupo de refugiados diante da casa [de um autor de e-mails de ódio], ele rapidamente baixará as persianas."
Vitória com ajuda de Merkel?
Para explicar o que motiva o eleitorado a votar na AfD, a prefeita da cidade de Pasewalk, Sandra Nachtweih, apresenta uma lista de ressentimentos.
"O fato de eu me sentir prejudicado pelo que tenho aqui; por não me oferecerem nada; porque ninguém parece se importar. Porque os refugiados recebem tratamento especial: eles ganham uma geladeira e um apartamento novos e eu não. Essa é a frustração que vemos em relação aos nossos esforços para assistir aos refugiados", explica a política independente de esquerda.
Os políticos da AfD de Mecklemburgo-Pomerânia Ocidental negam que seu partido seja de um tema só. No entanto, os refugiados são a primeira coisa que mencionam para explicar o sucesso de sua legenda. E parecem estar bem cientes de que a ausência de requerentes de asilo na região, na verdade, não importa, ou até lhes facilita o recrutamento de eleitores.
"As pessoas têm medo, elas não querem ser invadidas por estrangeiros", argumenta o deputado Jürgen Strohschein. "No que se refere às políticas de refúgio, pode-se dizer que Merkel foi a nossa maior ajuda na eleição."
A ironia é que, segundo um relatório de 2016 da comissária do governo federal para o Leste Alemão, Iris Gleicke, os cidadãos de Mecklemburgo-Pomerânia Ocidental só estão se prejudicando com a própria ansiedade. O Nordeste alemão é abençoado com o litoral do Mar Báltico, uma enorme região de lagos e algumas das mais belas paisagens da Alemanha, mas precisa atrair migrantes para resistir aos desafios demográficos e ter sucesso no futuro.
Tema de campanha?
Num ano eleitoral como o corrente, contudo, os políticos dos partidos estabelecidos preferem não contrariar os eleitores potenciais do Leste, evitando confrontá-los com os aspectos negativos de suas atitudes regionais.
Após a eleição de 2016, o chefe da bancada estadual da União Democrata Cristã, Lorenz Caffier, atribuiu o mau desempenho do partido de Merkel em Mecklemburgo-Pomerânia Ocidental a um ressentimento emocional pela política de refugiados da chefe de governo. "Só havia um tema, que era e é: os refugiados", disse, embora recusando-se a comentar sobre a popularidade da AfD em seu estado.
Em contrapartida, o adversário eleitoral de Merkel pelo Partido Social-Democrata (SPD), Martin Schulz, tem explorado o tema: recentemente ele ventilou a possibilidade – e instigou os medos – de uma segunda onda de solicitantes de asilo na Alemanha.
A representante dos migrantes Ulrike Seemann-Katz desaprova essa manobra de campanha. "Acho muito problemático que isso tenha se transformado numa questão eleitoral. Sempre houve um consenso de mantê-la fora das campanhas. Agora Schulz a recolocou na pauta, e eu acho que é um grande erro."