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O que é estagflação?

Ashutosh Pandey
14 de outubro de 2021

Interesse pelo fenômeno econômico descrito como "o pior de dois mundos" vem crescendo, alimentado por notícias sobre gargalos de fornecimento e alta dos preços de energia que dificultam a recuperação pós-pandemia.

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Preços de combustível num posto de gasolina
Na Alemanha, a alta dos preços da energia levaram a inflação a seu maior patamar em 28 anosFoto: Rolf Poss/imago images

"O que é estagflação?", "A estagflação está chegando?" são perguntas que os alemães têm feito insistentemente ao Google nos últimos dias. O súbito interesse por esse fenômeno econômico um tanto extremo foi alimentado por alguns comentários preocupados de investidores e analistas, citando o crescimento econômico vacilante e a alta acentuada dos preços de energia.

Estagflação é um evento econômico caracterizado por inflação alta e crescimento estagnado, associados a altos níveis de desemprego. O termo foi cunhado pelo político britânico Iain Macleod em 1965, para descrever o que considerava "o pior dos dois mundos: não só inflação de um lado ou estagnação do outro, mas ambas juntas".

Segundo dados do Google Trends, no momento o interesse da Alemanha pelo fenômeno alcança seus níveis mais altos desde a crise financeira global de 2008-2009. Não é diferente em outras grandes economias, inclusive nos Estados Unidos, que têm acusado uma forte alta de preços.

Aparentemente os mais preocupados de todos são os habitantes do Reino Unido, assustados com as longas filas das últimas semanas nos postos de gasolina – um sinistro lembrete do período de estagflação na década de 1970.

Duplo impacto para o cidadão

A estagflação pode complicar muito o trabalho de governos e bancos centrais, responsáveis por impulsionar o crescimento e manter os preços controlados. Isso, porque políticas visando conter a inflação podem desacelerar o crescimento e gerar desemprego, enquanto medidas de incentivo ao desempenho econômico e geração de empregos talvez acabem causando aumento de preços.

Como é impossível implementar ambos os grupos de medidas ao mesmo tempo, "não há nenhuma reação óbvia que a política macroeconômica possa tomar", afirma Andrew Kenningham, economista-chefe para a Europa da consultora de pesquisa londrina Capital Economics.

Para a população, o impacto da estagflação é duplo. Em primeiro lugar, significa menos empregos, à medida que a economia entra em recessão ou o crescimento recua. Em segundo, preços em alta resultam em menor poder aquisitivo: os cidadãos acabam tendo que dedicar uma parcela maior de sua renda a bens essenciais, como comida e combustível, restando menos para gastar com outros itens.

Fornecimento e preços de energia problemáticos

A apreensão com a estagflação se deve principalmente aos gargalos na cadeia de abastecimento e aos altos preços da energia. Os colapsos de fornecimento debilitaram a recuperação econômica da pandemia de covid-19: na Alemanha, a produção industrial acusou em agosto sua queda mais dramática desde abril de 2020, agravada pela redução de 17,5% na fabricação de automóveis, por escassez de componentes e matérias-primas.

Esses fatores, combinados com a energia mais cara, catapultaram em setembro a inflação do país a 4,1% - a mais alta em quase três décadas. Contam-se com taxas ainda mais elevadas nos próximos meses, com a persistência dos nós de fornecimento e da escassez de gás natural, petróleo e carvão mineral.

Mesmo assim, economistas afirmam que a Alemanha se encontra ainda longe de uma onda de estagflação, argumentando que, apesar da desaceleração, a economia está crescendo, contando-se com uma expansão de 3% no ano corrente e quase 5% em 2022. O desemprego no país segue relativamente baixo.

Alemanha em "estagflação light"

Kenningham define o atual período como "estagflação light": "A economia, como um todo, ainda está em expansão, pois o setor de serviços reabre após a pandemia, e achamos que os atuais gargalos de fornecimento passarão com o tempo, depois disso a perspectiva econômica é razoavelmente boa."

O G7, formado pelas principais economias industrializadas, testemunhou fases semelhantes de "estagflação light" em 2003, 2008 e 2015, causadas sobretudo pela alta dos preços do petróleo, mas que não duraram muito, segundo a Capital Economics.

Também para a economista-chefe do Fundo Monetário Internacional (FMI); Gita Gopinath, a atual situação "não se parece, nem de longe, com estagflação", como prova a robusta demanda continuada. No entanto, ela adverte para riscos, já que os preços estão sendo inflados por problemas no suprimento.

"Isso complica a adoção de medidas, porque, ao contrário de um aumento da inflação ditado pela demanda, contra o qual a política monetária está equipada, aqui os choques de abastecimento é que estão reduzindo a atividade, e ao mesmo tempo empurrando a inflação."

De volta aos anos 70?

A economia global atravessou a pior estagflação na década de 70, marcada pelo aumento dos preços do petróleo, em grande parte devido ao embargo da Organização do Países Exportadores de Petróleo (Opep) em 1973 e às economias minguantes dos países industrializados.

Em diversas economias avançadas, a inflação alcançou dois dígitos. A Alemanha evitou o pior, mas viu a taxa disparar até espantosos 8%. No Ocidente, o desemprego se alastrou, subindo na Alemanha de 0%, em 1970, a 10% no fim da década.

Apesar de analistas rechaçarem um paralelo, as atuais pressões inflacionárias provavelmente serão tão persistentes e disseminadas como nos anos 70. O Banco Central Europeu tem enfatizado que a alta da inflação tem sido motivada por fatores temporários – como ruptura das cadeias de abastecimento, demanda acumulada e preços de energia mais altos –, devendo arrefecer sensivelmente em 2022.