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O jogo de Putin com Snowden

Roman Goncharenko (md)11 de novembro de 2013

Alemães cogitam interrogar o americano na Rússia sobre o suposto grampo no telefone de Merkel, o que pode abalar as relações entre Berlim e Washington. Russos não teriam nada contra.

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Foto: picture-alliance/dpa

O relacionamento entre Alemanha e EUA pode estar diante de uma nova prova de fogo. O governo alemão cogita interrogar na Rússia o ex-colaborador da Agência de Segurança Nacional dos EUA (NSA) Edward Snowden sobre denúncias de espionagem em território alemão, incluindo o grampo no telefone celular da chanceler federal Angela Merkel.

Alguns políticos alemães estão até mesmo pedindo que Berlim dê asilo a Snowden. A eles uniu-se a revista semanal Der Spiegel, que deu capa ao assunto. O governo alemão descarta essa hipótese.

Ainda não se sabe como, quando e se o desejado encontro com Snowden em Moscou de fato acontecerá. Mas analistas dizem que o caso pode afetar as relações entre EUA e Alemanha. E os russos não teriam nada contra.

O ex-diplomata Steven Pifer, do think tank norte-americano Brookings Institution, diz que a Rússia pode se valer de Snowden para produzir um racha entre Washington e Berlim. "A Rússia não ficará desapontada se Snowden causar ainda mais danos", observa.

Sem evidências de participação russa

Há especulações de que Moscou estaria por trás de revelações de Snowden. Para o jornal sensacionalista russo Komsomolskaya Pravda, a notícia sobre a escuta promovida por agentes americanos no telefone de Merkel foi uma "resposta assimétrica russa" ao plano dos EUA de implementar um sistema de defesa antimísseis na Europa. Pifer duvida disso, mas diz que a Rússia "provavelmente está muito feliz" com o azedamento das relações entre Berlim e Washington.

Hans-Christian Ströbele bei Edward Snowden
Deputado alemão Hans-Christian Ströbele se encontrou com Snowden em MoscouFoto: picture-alliance/dpa

Já o cientista político Dimitri Trenin, diretor do centro de estudos Carnegie Moscow Center, discorda. "Embora possa haver, na Rússia, pessoas que estejam bebendo champanhe e se divertindo com a briga entre alemães e americanos", reconhece.

Ele argumenta que a Rússia não tira vantagem direta com a disputa e que o Kremlin só iria se beneficiar se a Alemanha e a Europa decidissem sair da área de influência dos Estados Unidos. "Isso se encaixaria numa ordem mundial multipolar, almejada por Moscou", observa. Ele diz que isso dificilmente acontecerá. Além disso, não há evidência alguma de que a Rússia esteja por trás das revelações de Snowden.

Putin evita falar sobre Snowden

O posição do presidente russo também chama a atenção. Oficialmente, Putin e Snowden nunca se encontraram. Em suas aparições públicas, o russo evita tocar no nome do ex-colaborador da NSA.

A última vez que Putin falou sobre o americano foi em 6 de setembro, após a cúpula do G20, em São Petersburgo. "Nós não o convidamos para vir à Rússia", disse na ocasião, argumentando que Snowden ficou acidentalmente preso no país durante sua fuga rumo à América Latina porque os EUA haviam cancelado seu passaporte.

O líder russo nunca se pronunciou sobre as revelações de Snowden em relação à Alemanha, embora dificilmente deixe passar uma oportunidade de alfinetar os Estados Unidos. Snowden também continua respeitando o acordo com Moscou de não fazer mais revelações que prejudiquem as relações russo-americanas. Informações são divulgadas sempre através da imprensa ocidental.

Denunciante ou traidor?

"Putin não está jogando nenhum jogo", avalia Trenin. Mesmo que as revelações de Snowden sejam úteis como propaganda política, o Kremlin preferiria que ele as divulgasse a partir de um outro país, opina.

Para Trenin, Snowden é um denunciante clássico, ou seja, alguém que revela abusos. O especialista diz não acreditar que o americano colabore com o serviço secreto russo durante seu exílio em Moscou. Até mesmo o presidente Putin, ele próprio um ex-agente da KGB, nega que Snowden coopere com as agências de inteligência russas.

Pifer vê a coisa de maneira bem diferente. Para ele, Snowden é um traidor e não um denunciante. "Ficaria muito surpreso se Snowden, depois de quatro meses na Rússia, não tivesse contato algum com a inteligência russa", observa o analista do Brookings Institution. "Se for assim, os serviços secretos russos não fazem bem o seu trabalho."

Governo alemão na mira russa

O especialista Hans-Henning Schröder, do Instituto Alemão de Relações Internacionais e de Segurança (SWP), duvida que o escândalo do grampo no telefone de Merkel tenha sido lançado pela Rússia. "Acho um exagero", diz. "Os russos devem ter consciência de que as relações econômicas, a aliança entre a Alemanha e os EUA são tão sólidas que não haverá um cisma."

Quanto ao recente encontro entre Snowden e o deputado do Partido Verde alemão Hans-Christian Ströbele em Moscou, Schröder afirma que este não ocorreu sem o consentimento de autoridades russas de alto escalão. "Foi autorizado mirando especificamente a política interna alemã", crê o especialista.

Na opinião dele, o encontro tinha como meta provocar inquietação e incerteza no governo alemão. Um possível motivo pode ser, na avaliação do especialista, o esfriamento das relações entre Berlim e Moscou. Nos últimos dois anos, o governo alemão tem frequentemente manifestado seu desapontamento com os desenvolvimentos políticos internos na Rússia.