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O Brasil na imprensa alemã (12/05)

12 de maio de 2021

Mídia da Alemanha aborda origens e consequências do massacre policial no Jacarezinho, bem como o trabalho de um fotógrafo sobre os muitos mortos da pandemia em São Paulo.

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Granada e mancha de sangue em telhado de alumínio
Violência policial no Jacarezinho é sem precedentes até para parâmetros cariocasFoto: Silvia Izquierdo/AP Photo/picture alliance

Süddeutsche Zeitung – Com rifles de assalto na favela (08/05)

Quando a polícia se retirou do Jacarezinho, no começo da tarde da quinta-feira, deixava para trás ruas cheias de sangue, crianças traumatizadas e moradores desesperados. O tiroteio no bairro da Zona Norte do Rio de Janeiro se estendera por horas: de um lado, presumíveis membros de uma quadrilha do narcotráfico, do outro, policiais. Mais de duas dezenas morreram, entre eles um agente.

Um porta-voz da polícia denominou a operação "bem planejada e necessária", veículos da imprensa marrom conservadora a aplaudiram como um sucesso. Em contrapartida, moradores contam sobre tortura e assassinato, e organizações de direitos humanos falam de um massacre como nunca houve na já sangrenta história da polícia do Rio.

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Os policiais, é preciso dizer, vivem perigosamente. Ao mesmo tempo, porém, não têm melindres quando se trata de combater as gangues. Caçando supostos criminosos, forças de assalto têm atirado de helicópteros em bairros densamente habitados. Ricochetes também matam moradores inocentes e até mesmo crianças. Os massacres se sucedem.

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Partes da população apoiam o procedimento brutal, assim como políticos conservadores e direitistas, sobretudo o presidente brasileiro, Jair Bolsonaro. Alguns anos atrás ele disse que um policial que não mata não é policial.

Mas também há resistência. Em 2020, durante uma operação numa favela, a polícia do Rio abateu, com um rifle de assalto e à queima-roupa, um jovem desarmado de 14 anos. O caso resultou em semanas de protestos e, no fim das contas, também em o Supremo Tribunal Federal proibir operações em favelas durante a pandemia, a menos que sejam urgentemente necessárias.

A sentença segue em vigor, e a questão agora também é se, com sua operação, a polícia não investiu contra a decisão dos juízes, já que se tratava, em primeira linha, de prender integrantes do Comando Vermelho por terem supostamente recrutado menores de idade para sua gangue.

Organizações de direitos humanos mencionam execuções extrajudiciais, e moradores relatam sobre agentes perseguindo nas casas os fugitivos desarmados e feridos, e os fuzilando sumariamente. Vídeos e fotos na internet mostram salas e até quartos de crianças manchados de sangue. Na quinta-feira, as autoridades cariocas anunciaram a abertura de inquéritos.

Frankfurter Allgemeine Zeitung – "Uma operação como no Afeganistão" (08/05)

Quando a polícia entra na favela, vai haver mortes. Justamente no Rio de Janeiro, essa é uma lei não escrita, que se confirma mês após mês. Segundo a organização Human Rights Watch, só no primeiro trimestre do ano corrente morreram mais de 450 cidadãos em operações policiais no estado, entre eles quatro agentes da lei.

Contudo, o que se desenrolou na quinta-feira, na favela do Jacarezinho, na Zona Norte da metrópole brasileira, foi pior do que tudo já ocorrido até hoje. Durante várias horas de confrontação entre a polícia e membros de uma quadrilha de traficantes, pelo menos 25 pessoas foram mortas, inclusive um policial. A operação entra para a história do Rio como a mais letal, até hoje.

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"Queremos justiça", diz mãe de morto no Jacarezinho

Especialistas em segurança ressaltam que o êxito da operação deve ser colocado em questão, já devido ao número de vítimas e à perda de um policial. O ex-secretário de Segurança Nacional e coronel reformado da Polícia Militar José Vicente da Silva Filho criticou o planejamento da operação e disse que não foram consideradas a reação dos membros da quadrilha nem a segurança da população.

Tanto faz se os mortos eram bandidos ou não: ele nunca viu uma intervenção com tantos mortos. Foi uma operação como no Afeganistão, afirmou o coronel ao jornal O Globo.

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A ação na favela do Jacarezinho desencadeou mais uma vez no Brasil a discussão sobre a forma como o Estado combate o crime organizado e o narcotráfico, e acirrou a crítica à confrontação frontal. Em 2019 foram mortos 50 mil brasileiros, a maioria vítima ou da violência dos bandos ou de ações policiais.

Em contrapartida, registram-se vitórias relativamente modestas no combate à criminalidade: na operação do Jacarezinho, foram confiscadas 16 pistolas, seis fuzis e uma metralhadora. Não é desse modo que se vai deter o narcotráfico com que os bandos criminosos se financiam e a seus arsenais de armas, criticam especialistas em segurança. E acrescentam: assim que, dentro de poucos dias, o Estado tiver deixado novamente o Jacarezinho à própria sorte, também os integrantes do Comando Vermelho vão estar de volta.

Süddeutsche Zeitung – A morte faz inventário (11/05)

[O fotógrafo de arquitetura de 44 anos] Leonardo Finotti documenta os efeitos da pandemia no Brasil, fotografa como em São Paulo gramados se transformam em cemitérios. Quando se viu pela primeira vez diante das sepulturas, ele ficou chocado: "Pensei: assim é que deve ser estar na guerra."

Era 3 de abril de 2020, e o Brasil, a terra natal de Finotti, estava sendo varrido pela primeira onda de covid-19. Havia cada vez mais doentes, cada vez mais mortos, e os coveiros cavavam cada vez mais fossas rasas na terra vermelha de Vila Formosa.

O cemitério fica na zona leste da metrópole São Paulo. Normalmente aqui há umas duas dezenas de enterros por dia, mas agora os familiares só tinham, no máximo, uns minutos para se despedir, e lá vinha o próximo cortejo fúnebre. Agora os túmulos estavam bem junto um do outro, em gigantescas fileiras: um sombrio presságio da mortandade que o Brasil ainda tinha pela frente.

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Necropoli(s)tics é o nome da série [de fotografias] que Leonardo Finotti fez sobre o primeiro ano da pandemia em Vila Formosa: são todas imagens aéreas, tiradas com um drone. Na perspectiva do alto, elas mostram lado a lado o cemitério e os telhados do bairro operário. Veem-se árvores em flor e ruas movimentadas – ou seja, a plena vida –, só que, logo ao lado, rolam as escavadeiras, cavando sem parar novos buracos no cemitério, um ao lado do outro, como se a morte tivesse feito risquinhos na terra para contar as vidas perdidas.

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Fotos são uma arma política, num país como o Brasil, afirma Finotti. Ele já as empregou antes, por exemplo, em projetos sobre os campos de futebol das favelas. Ainda assim, por muito tempo ele e a esposa não queriam publicar as imagens de Vila Formosa.

"Nossa intenção era apresentar um quadro geral, o processo de transformação desde o início da pandemia." Um memorial para todas as vidas perdidas, mas também para o fracasso da política, a qual, diz, parte do princípio de que gente pobre vai morrer.

Agora Necropoli(s)tics pode ser vista na rede, mas também numa galeria. A arrecadação com as vendas se destinará a projetos de assistência para os socialmente desfavorecidos de São Paulo. Em algum momento, diz Finotti, ele quer publicar as fotos num livro. Por enquanto, porém, continua indo toda semana à Vila Formosa. A pandemia ainda não acabou, e o cemitério não para de ganhar novas sepulturas.