Natal dos não cristãos
22 de dezembro de 2009Em dezembro, ninguém consegue escapar do Natal na Alemanha. As feiras e as decorações natalinas estão por toda parte. Na televisão, não se fala de outra coisa. Entre biscoitos de Natal e missas, cada vez mais pessoas que tradicionalmente não têm nada a ver com a festa terminam por comemorá-la.
A população alemã é formada por 70% de cristãos. O restante, sem nenhum vínculo religioso com o Natal, não deixa de se confrontar com a data, no entanto. Na maioria das vezes, essas pessoas participam de forma ativa e aberta do burburinho das festas de fim de ano.
O maior grupo de não cristãos da Alemanha – e também o maior grupo entre os imigrantes – é a comunidade muçulmana. "Temos nosso Ramadã e nele recebemos nossos presentes", diz Nourafza, uma jovem muçulmana de nacionalidade alemã.
Os muçulmanos e o Natal
Mas quem acaba de chegar à Alemanha pela primeira vez, vindo de uma outra cultura religiosa, tem suas dificuldades. Loay Mudhoon, especialista em Islã da Deutsche Welle, viveu essa experiência há 17 anos. "Na vida privada senti uma espécie de coerção não oficial. Temos que trocar presentes. A gente fica meio perplexa no começo. Você fica no canto, meio abobalhado, sem saber o que presentear. Havia alguns rituais que não eram tão familiares."
Os muçulmanos têm facilidade, no entanto, de descobrir semelhanças com seus vizinhos durante o Natal. Até porque Jesus aparece como um profeta no Alcorão. Por isso, os muçulmanos na Alemanha muita vezes acabam interiorizando o Natal como parte de sua própria cultura.
"Embora não seja possível especificar exatamente quando Jesus nasceu, a data é perfeitamente aceitável, e os muçulmanos também reconhecem a celebração do nascimento de Jesus. Então, há muita coisa em comum", afirma Aimann Mazyek, secretário-geral do Conselho Central dos Muçulmanos na Alemanha, empenhado em promover o diálogo entre cristãos e muçulmanos.
Mesmo quando não há muito em comum, parte dos migrantes experimenta o Natal na Alemanha como uma festa tranquila e bonita. Esse é o caso do monge budista Thalpawila Kusalagnana, do Sri Lanka. Ele vive há um ano em Bonn e se recorda como as decorações de fim de ano marcaram suas primeiras impressões do país. "No caminho todo do aeroporto, eu podia ver as decorações de Natal. Descobri que os alemães se animam mais com festas do que outros povos. Eles gostam de enfeites, de música, gostam de festejar mais do que outros".
Comercialização e materialismo
Um ponto em comum entre todos os não cristãos é a crítica à comercialização e ao materialismo do Natal alemão. Um episódio contado pelo jovem muçulmano Bahadir, residente em Bonn, ilustra bem isso. "A gente tinha uma professora que queria nos ensinar o verdadeiro espírito do Natal e pediu que cada um escrevesse seus desejos. Todo mundo escreveu Playstation 3, Playstation 2 e coisas do tipo. Eu e um amigo meu fomos os únicos que desejamos paz para o mundo".
A experiência de alguém recém-chegado na Alemanha durante a época do Natal pode ser estranha, na opinião de Aimann Mazyek, do Conselho Central dos Muçulmanos. "Acho que a pessoa vai perceber de imediato que há um monte de propaganda em toda a parte e que uma figura como o papai Noel, cuja origem é conhecida por uma minoria, aparece em todos os cartazes de anúncio", observa.
"Sempre acho estranha essa institucionalização da crença religiosa e essa distância cada vez maior das verdadeiras intenções, do verdadeiro valor da festa, que é o calor humano", diz Loay Mudhoon.
O monge Kusalagnana acha que, nessa época, os alemães tendem a se fartar em abundância, se esquecendo dos mais pobres. "Nos países mais pobres, às vezes encontramos pessoas que não têm sequer uma refeição no Natal. Na Alemanha, entretanto, a gente vê que as pessoas fazem comida demais, muito mais do que precisam."
Autor: Karsten W.N. Kurze (md)
Revisão: Simone Lopes