Tesouros árabes
4 de fevereiro de 2012O Museu de Arte Islâmica em Berlim, apresenta a exposição Roads of Arabia – Tesouros arqueológicos da Arábia Saudita, com mais de 400 objetos abrangendo quase seis milênios de história da Península Arábica, desde a Pré-História até o Islã Moderno. A maioria das peças foi emprestada por museus da Arábia Saudita cerca de 80 obras vêm de coleções de Berlim. "Nossa intenção é contribuir para o debate sobre o Islã, dentro de uma dimensão cultural e histórica", afirma Stefan Weber, diretor do Museu de Arte Islâmica, situado no Museu de Pérgamo.
A mostra, aberta até 9 de abril de 2012, já passou por Paris, Barcelona e São Petersburgo, antes de chegar à Alemanha. Ela documenta uma mudança de paradigma: do estereótipo de árido país do deserto à imagem de uma nação que escreveu história da arte. Por muitos anos, a Arábia Saudita negligenciou seus tesouros, mas nos últimos anos, o país tem feito muito para preservar o próprio patrimônio, observa Weber.
Roads of Arabiaé uma viagem no tempo, ao longo das antigas rotas comerciais e de peregrinação, começando com os primeiros rastros humanos. Partindo de pontas de flecha pré-históricas, o visitante passa cronologicamente por estelas de pedra com formato humano do 4º milênio antes de Cristo até os artefatos de antigos assentamentos nômades. Planejada ao longo de quatro anos, a exposição dá forte ênfase à Antiguidade, detalhe inesperado, em se tratando do país central do Islã.
Idade da ignorância
No islamismo, o tempo antes da revelação de Maomé é denominado Jahiliyyah, que se pode traduzir como "idade da ignorância". No sentido ortodoxo, o período pré-islâmico é considerado uma era de barbárie e politeísmo. Na exposição, é possível sentir um afastamento da obscura Jahiliyyah. A visão se estende para a continuidade da história da Península Arábica, o que certamente pode ser considerado um sinal de mudança.
A exposição leva adiante, até as colossais estátuas do reino de Dedã do primeiro milênio antes de Cristo. Os gigantes olham rigidamente de cima para baixo em direção aos visitantes, dispostos em amplo contraste, numa sala negra espelhada. O estilo das figuras de pedra deixa transparecer influências do Egito antigo, comprovando, assim, uma recepção artística suprarregional.
Uma outra seção é dedicada às rotas históricas de peregrinação, que também eram importantes rotas comerciais na era pré-islâmica. Mas somente sob o califado dos Omíadas e Abássidas foi desenvolvida uma ampla infraestrutura para abastecimento dos fluxos de peregrinos ao largo das rotas de peregrinação de Damasco e Bagdá para Medina. Objetos do cotidiano e cerâmica importada são testemunhos de uma vida social intensa.
Visitante como peregrino
Como se tivesse feito, ele mesmo, uma peregrinação, o visitante se vê diante do Portal de Caaba, após haver descido uma escada estreita. O esplendor e grandeza do portal iluminado por refletores levam o espectador a fazer uma pausa e refletir por um instante, dentro da mostra inteligentemente planejada.
O maciço portão de entrada prateado, com ornamentos florais e caligrafias, data do período otomano e foi substituído no curso dos trabalhos de renovação na Caaba. Na lateral da sala, está pendurada uma grande cortina de porta que – assim como a kiswa, o tecido negro ao redor do santuário – é renovado a cada ano. Segundo um costume da era pré-islâmica, a kiswa é cortada em pedaços e distribuída entre personalidades honoráveis. Alguns desses fragmentos são exibidos ao lado das edições ilustradas de livros de peregrinação iranianos.
Os objetos da Caaba e a história urbana de Meca são, assim como toda exposição, uma novidade em um museu na Alemanha. "A Arábia Saudita remete em nosso imaginário a coisas como areia, príncipes e um lugar onde as mulheres não podem dirigir carro", diz Christian Gierlichs, curador da exposição. Roads to Arabia nos abre uma perspectiva diferente sobre um país que se pensa conhecer, mas que continua bastante estranho para muitos de nós.
A exposição também é promoção para o reino saudita, claro. E logo se impõe a questão: é certo cooperar com um Estado autoritário? Stefan Weber é repetidamente confrontado com criticas nesse sentido, porém não concorda que o alvo seja sempre a cooperação cultural. Por outro lado, pouca gente vê um problema em abastecer seu carro com gasolina saudita, lembra o diretor do Museu de Arte Islâmica de Berlim.
Autor: Marian Brehmer (md)
Revisão: Augusto Valente