Muitos em Washington são a favor de Assad, diz especialista
3 de setembro de 2013Um dos principais desafios do presidente americano, Barack Obama, é retaliar o regime de Bashar al-Assad, porém sem entrar numa nova guerra. Uma das consequências seria, diante de um eventual vazio de poder em Damasco, ter que lidar com uma força política totalmente desconhecida, emersa de uma oposição fragmentada e repleta de facções radicais.
Para o especialista em política de defesa e inteligência John Pike, fundador e diretor do think tank GlobalSecurity.org, muitos em Washington temem enfraquecer Assad por receio de que, com isso, a Al Qaeda ganhe terreno na Síria.
"Obama quer fazer apenas o suficiente para não parecer um tolo. Ele não quer fazer algo que realmente possa mudar a situação na Síria ou mesmo derrubar Assad", diz Pike.
Deusche Welle: Muitos se perguntam por que Assad usaria armas químicas, cruzando a linha vermelha estabelecida por Obama, justamente quando a situação parecia estar a seu favor.
John Pike: Talvez realmente tudo tivesse se desenvolvido mesmo a seu favor, mas talvez ele também tenha visto a coisa diferente. Ele tem um grande Exército, mas a maioria de seus soldados é sunita. Ele não pode confiar politicamente em parte de seus soldados. E Assad não tem tantos soldados assim para o combate. Porque se trata de uma guerra também urbana, entre edifícios, muito desgastante. Após dois anos de guerra intensa, seus homens de confiança também vão perdendo a vontade incondicional de lutar.
Então, o que vai acontecer? É este o início do fim para Assad?
Talvez. Eu não sei. Mas se presumirmos que no dia 21 de agosto foi realmente usado gás venenoso, então precisamos entender por que ele fez isso. Caso contrário, será muito difícil evitar que ele volte a usar essas armas. Eu ainda não ouvi de ninguém uma explicação sequer para o comportamento de Assad, nem mesmo uma má explicação.
E se não entendermos por que ele teria feito algo que deixa o mundo surpreso, então estamos realmente em águas desconhecidas. Não entendemos por que uma figura-chave dessa guerra age assim como age. Talvez Assad tenha observado que Obama não teve uma linha clara já em sua política para o Egito. Assad poderia, portanto, ter perdido o medo dos EUA e acreditado que ele sairia impune, mesmo com um ataque de gás venenoso.
Como o senhor vê o anúncio de Obama de que pedirá aprovação ao Congresso para um ataque militar?
Esta é uma autolimitação muito incomum e nova de alguém que é comandante em chefe das Forças Armadas. Nunca houve tal coisa antes, principalmente numa operação militar relativamente reduzida como a que se pretende.
Se o primeiro-ministro britânico, David Cameron, não tivesse perdido sua votação parlamentar a respeito do ataque à Síria, Obama também teria pedido a aprovação do Congresso dos EUA?
Provavelmente não. Os EUA são uma república presidencialista e não uma democracia parlamentarista. Lá, as coisas são tratadas de forma diferente. Obama é o comandante em chefe das Forças Armadas. E ele não pode prever o resultado da votação.
Os mísseis vão ter algum efeito sobre Assad? O senhor acha que os EUA vão conseguir destruir, desta forma, algumas armas químicas?
Claro que não. Um míssil Tomahawk, com uma ogiva convencional, poderia até liberar o gás venenoso. Se acreditarmos que Assad usa gás venenoso, pois ele já não tem as coisas sob controle, então nós obviamente tentaríamos afetar seus centros de controle. Mas por mais incrível que possa parecer, Assad tem muitos admiradores em Washington, porque ele é um baluarte que impede que a Síria seja tomada pela Al Qaeda.
Há gente em Washington que é a favor de Assad?
Sim. Muitos que pensam ser melhor um vilão que conhecemos do que um que não conhecemos. Muitos consideram um risco enfraquecer a posição de Assad. Muitos temem que a Al Qaeda possa chegar ao poder. Acho que Obama está à procura de um meio-termo. Ele quer fazer apenas o suficiente para não parecer um tolo. Por outro lado, ele não quer fazer algo que realmente possa mudar a situação na Síria ou mesmo derrubar Assad.
Obama, então, não quer necessariamente derrubar Assad?
Pelo menos há muita gente em Washington que não quer isso. O problema na Síria é que a maioria dos rebeldes, a maioria dos combatentes do Exército Livre Sírio, defende apenas seu próprio distrito. E eles não os vão deixar para lutar em outro lugar devido ao receio, justificável, de que, então, os homens de Assad venham e massacrem suas mulheres e crianças. Portanto, não há uma estrutura de comando. Não há nem mesmo algo semelhante a um exército de oposição organizado. E caso Assad caia, há o temor de que a Síria se torne um grande caos.