Charges de Maomé
28 de fevereiro de 2008Uma declaração do ministro alemão do Interior, Wolfgang Schäuble, à imprensa reacendeu a polêmica em torno da publicação de caricaturas de Maomé. Numa entrevista ao semanário Die Zeit, o político social-cristão defendeu a liberdade de imprensa em detrimento da sensibilidade do mundo islâmico pela representação gráfica do profeta Maomé, ainda mais quando de forma depreciativa, como neste caso.
"Fato é que nos adaptamos a coisas novas. Por exemplo, na política de integração. Não pertenço ao coro daqueles que instrumentalizam o problemático discurso que o Sr.[primeiro-ministro da Turquia, Recep Tayyip] Erdogan, fez em Colônia, para instigar o conflito entre turcos e alemães.
Ao mesmo tempo, tenho respeito pelos jornais dinamarqueses decididos a publicar as caricaturas de Maomé que reacenderam a ira, mostrando assim que nós não nos deixamos dividir. Na verdade, todos os jornais europeus deveriam publicar essas caricaturas agora, explicando que as consideramos miseráveis, mas que a defesa da liberdade de imprensa não pode servir de motivo para se praticar a violência."
Schäuble nega intenção de incitar imprensa
A declaração de Schäuble na edição desta quinta-feira (28/02) do jornal Die Zeit foi interpretada pelo mundo árabe como uma tentativa de instigar toda a imprensa ocidental a propagar as caricaturas de Maomé. A popular emissora árabe Al Jazira citou Schäuble no noticiário da véspera, como se ele tivesse conclamado à propagação das charges publicadas em meados de fevereiro na imprensa dinamarquesa.
O Ministério do Interior em Berlim negou que essa tenha sido a intenção de Schäuble. O ministro estaria apenas defendendo a liberdade de imprensa. A publicação prévia da declaração pelo jornal de Die Zeit foi considerada "irresponsável" pelo Ministério. O redator-chefe do semanário, Giovanni di Lorenzo, ressaltou que as declarações foram divulgadas em versão literal e com a autorização do ministro.
Cartunista sob proteção policial há meses
Em meados de fevereiro, uma controversa caricatura do profeta Maomé, representado com uma bomba no turbante, foi publicada por jornais dinamarqueses. Com isso, a imprensa reagiu diretamente à descoberta de planos de atentado contra o caricaturista Kurt Westergaard.
Em novembro de 2007, Westergaard fora obrigado a abandonar sua casa, por recomendação do serviço secreto dinamarquês. As autoridades alegaram que três homens de alguma forma envolvidos com islamismo estariam planejando um atentado contra o desenhista. Dois deles, de nacionalidade sudanesa, foram extraditados. O terceiro, dinamarquês nascido no Marrocos, foi posto em liberdade.
Mundo islâmico reage com indignação à publicação
A atual disputa entre defensores da liberdade de imprensa e muçulmanos indignados com a depreciação de temas religiosos espelha, em dimensões bem menores, o conflito internacional ocasionado no início de 2006 pela publicação de charges de Maomé na imprensa dinamarquesa alguns meses antes. Na época, os protestos internacionais contra o desrespeito da imprensa ocidental ao preceito islâmico que proíbe a representação do Profeta Maomé causaram a morte de 150 pessoas.
Desta vez, o mundo islâmico também reagiu à publicação com uma onda de protestos e violência. Na quarta-feira, centenas de milhares de manifestantes saíram às ruas da capital sudanesa, Cartum, segundo noticiou a emissora Al Jazira. O governo do Sudão ameaçou romper contatos oficiais com Copenhague e lançar um boicote contra produtos dinamarqueses.
No Egito, as autoridades tiraram de circulação quatro edições de jornais ocidentais, inclusive os alemães Frankfurter Allgemeine e Die Welt, pelo fato de eles terem publicado artigos sobre a nova polêmica das caricaturas. No Paquistão, o portal de vídeos YouTube foi interditado pelo mesmo motivo. Ondas de protestos também ocorreram no Oriente Médio, no Iraque, na Indonésia e nos países do Golfo.
Jovens imigrantes protestam em cidades dinamarquesas
Em meados de fevereiro, Copenhague e outras cidades dinamarquesas foram palco de violentos protestos de jovens imigrantes muçulmanos, logo após a publicação da charge de Maomé. Na periferia da capital, uma escola foi alvo de atentado incendiário.
A polícia dinamarquesa usou de rigor contra os manifestantes. Políticos e autoridades policiais negaram que a onda de violência gerada nos bairros de imigrantes se justifique apenas pela publicação das caricaturas. (sm)