Berlim em 2010
31 de dezembro de 2009Em seu pronunciamento de Ano Novo, a chanceler federal alemã, Angela Merkel, resgatou a memória da Queda do Muro e da reunificação alemã, ocorrida há 20 anos. Como alemã-oriental, ela se lembrou do Ano Novo de 1989: "Foi o meu primeiro réveillon em liberdade após 35 anos de vida na República Democrática Alemã. Foi uma ocasião única, maravilhosa."
Apesar do otimismo naturalmente inspirado pela data, a premiê alemã não deixou de tocar em assuntos críticos. Ela alertou para a tendência de usar a crise econômica como pretexto para não encarar importantes desafios da humanidade, como a proteção do clima.
"Economia e meio ambiente não são antagônicos; mais do que nunca, condicionam-se reciprocamente", declarou ela, acrescentando que as pessoas não devem se deixar impressionar por abalos como a recente Cúpula do Clima, em Copenhague. Merkel assegurou que a Alemanha está disposta a ir além das metas de contenção de emissões de CO2 definidas pela União Europeia.
Déficit orçamentário e experimento fiscal
A premiê alemã também não escondeu que a crise ainda vai demorar para passar. Certas coisas vão se tornar ainda mais difíceis em 2010, afirmou. E de fato, nos últimos dias de dezembro, começaram a se acumular os problemas com que se confrontará a coalizão de governo democrata-cristã e liberal empossada há três meses.
Um dos mais graves é o rombo nas finanças públicas. Nos primeiros nove meses de 2009, a União, os estados e municípios fizeram cinco vezes mais dívidas do que no ano anterior: quase 100 bilhões de euros.
Pouco antes do Natal, a coalizão de governo chegou a um consenso quanto a um pacote de reduções fiscais, por exemplo, para herdeiros e proprietários de hotel. Norbert Lammert, correligionário amigo de Merkel e – como presidente do Bundestag (câmara baixa do Parlamento) – o segundo mais alto representante do Estado, havia criticado esse acerto há poucos dias.
Essa é uma das medidas da chamada "lei de aceleração do crescimento", o pacote de medidas para redução fiscal a vigorar a partir de 1º de janeiro de 2010. O governo espera que isso dê impulso à conjuntura. No entanto, o que primeiramente ganhará novo impulso será o endividamento estatal. No início de novembro, a premiê Merkel já havia advertido que primeiro os problemas aumentariam, para depois se atenuarem.
Soldados no Afeganistão e CPI
Quanto à polêmica participação de soldados alemães na operação internacional da Otan no Afeganistão, outro desafio a ser enfrentado pela coalizão de governo, a premiê Merkel declarou – em seu pronunciamento de Ano Novo – que a meta da missão é estabilizar o país central-asiático.
"Politicamente, é necessário criar as condições para que a responsabilidade seja passada pouco a pouco para os afegãos nos próximos anos", disse ela, sem especificar quantos soldados alemães continuarão participando da operação da Otan.
O bombardeio de dois caminhões-tanques em Kunduz, comandado pelas forças alemãs em setembro passado e responsável por diversas mortes entre a população civil, levou à renúncia do ex-ministro da Defesa Franz Josef Jung e tornou o atual ministro, Karl-Theodor zu Guttenberg, alvo de críticas.
As críticas também recaíram sobre Merkel, acusada de ter declarado – no início de setembro – um número de vítimas civis inferior ao que era de seu conhecimento. O caso deverá ser investigado por uma comissão parlamentar de inquérito, que deverá começar a colher depoimentos em janeiro.
O tema Afeganistão também é polêmico dentro da coalizão. O liberal Guido Westerwelle, ministro das Relações Exteriores, já havia declarado antes do Natal que não pretende comparecer à conferência de Londres sobre o Afeganistão, no final de janeiro, caso a meta do encontro seja apenas estipular o número de soldados a ser enviado por cada país.
O ministro alemão quer que a conferência discuta basicamente as metas e estratégias para a operação militar da Otan. A resistência contra o envio de mais tropas de combate para o Afeganistão já não é mais uma atitude exclusiva da oposição, portanto, tendo chegado dentro do próprio governo.
Diante das dívidas, primeiro gastar
Apesar da urgência dessa questão, a prioridade do Parlamento alemão em janeiro será definir o orçamento do Estado em 2010. O projeto acertado pelo governo pouco antes do Natal prevê mais despesas e mais dívidas.
Essa decisão foi defendida da seguinte forma pelo ministro das Finanças, Wolfgang Schäuble: "Diante de uma crise tão grave, cujas causas não residem na Alemanha, os peritos desaconselham um comportamento pró-cíclico e recomendam usar os meios da política financeira para contrabalançar".
O Estado vai começar a economizar só a partir de 2011. Em que âmbitos e de que forma, isso o ministros da Finanças pretendem anunciar apenas após a próxima estimativa fiscal. E não é por acaso que elas serão divulgadas somente após as significativas eleições estaduais da Renânia do Norte-Vestfália, em 9 de maio próximo.
Autores: Peter Stützle / Martin Schrader (sl)
Revisão: Alexandre Schossler