Memórias
17 de outubro de 2008A crescente tendência do mercado editorial de se voltar cada vez mais para outras mídias fez com que a Feira do Livro de Frankfurt inaugurasse, há alguns anos, uma "seção cinematográfica". Um desses pontos de intereseção entre a literatura e o cinema deste ano é o livro de memórias do diretor Volker Schlöndorff, lançado em agosto último e apresentado para o público especializado durante a feira.
Luz, sombra e movimento descreve várias estações da biografia do cineasta: desde as primeiras experiências como assistente de direção na França, passando pelos primórdios do Novo Cinema Alemão, a mudança para os EUA, o trabalho com estrelas de Hollywood até o retorno à Alemanha depois da queda do Muro e da reunificação do país.
Narrativa em primeira pessoa
"No livro, falo da minha vida e dos meus filmes, mas principalmente da vida. Os filmes estão aí, mas as experiências da vida não são tão nítidas na minha trajetória, porque fiz muitas adaptações literárias para o cinema. Ou seja, meus filmes não foram rodados com uma narrativa em primeira pesoa. Agora fiz isso no livro: narrar em primeira pessoa", conta o diretor.
Schlöndorff associa em sua autobiografia situações pessoais e profissionais, que ocorreram paralelamente. "Há muitos exemplos. Um deles é Homo Faber, de Max Frisch. Posso dizer que esse livro salvou realmente a minha vida. Eu estava passando por uma profunda crise nos EUA e de repente me lembrei desse livro", recorda o diretor, que transformou a lembrança da obra de Frisch num longa-metragem.
Schlöndorff, mesmo antes de iniciar sua carreira no cinema, sempre manteve uma estreita ligação com a literatura. "Sempre escrevi. Quando era adolescente, tentei escrever alguns contos e tinha também um diário. Mas sempre quando algum escritor me aconselhava: 'escreva mesmo, para valer', eu achava que nunca iria conseguir. Ficar parado na frente da janela vendo a vida passar do lado de fora", brinca o diretor.
Solidão da escrivaninha
Mas para se dedicar às próprias memórias, ele acabou se rendendo mesmo à escrivaninha. Alugou um pequeno apartamento no prédio vizinho ao seu. "Sem telefone, sem nada. Sentei ali e começei a escrever sem hesitar. Sozinho comigo mesmo, com muitos vivos e mortos na memória. Me lembrei dos amores antigos, que já tinham sido esquecidos. É assim: você de repente descobre uma frase num diário velho, que, de repente, se transforma no ponto de partida para um novo capítulo do livro", descreve o diretor.
Certamente uma tarefa não muito difícil para aquele que, no mais tardar nos anos 1970, já era considerado o "cineasta das adaptações literárias" na Alemanha. A tendência de partir de um romance para criar um roteiro tem uma explicação, argumenta o cineasta: "Sempre tive a impressão de que fazia filmes melhores quando havia um modelo literário". E a lista de suas adpatações passa por vários grandes nomes da literatura mundial: Heinrich Böll, Günter Grass, Max Frisch, Marcel Proust, Robert Musil e Arthur Miller, entre outros.