"Iraque não é ameaça grave"
20 de fevereiro de 2003Na conversa que teve com repórteres do diário conservador de Berlim, o ministro verde negou que a declaração conjunta da União Européia admitindo o uso da força militar no Iraque como último recurso tenha sido um revés para a política alemã. "Nos EUA, o documento foi recebido como uma vitória da Alemanha e da França. Os europeus estão unidos no desejo de uma solução pacífica." Jürgen Trittin garante que Berlim não mudará sua postura antibelicista no conflito iraquiano.
"Não vamos aprovar (no Conselho de Segurança da ONU) nenhum resolução legitimadora de uma guerra. As manifestações em todo o mundo mostraram que o chanceler – ao contrário do que afirmam com freqüência – não está isolado. Não apenas em relação aos nove milhões de pessoas que foram às ruas (no fim de semana), mas também no Conselho de Segurança, estamos do lado da maioria."
O ministro do Meio Ambiente não considera sua postura e a dos pacifistas como antiamericana. "Temos que separar bem a América e o governo americano. Todos os oradores (da manifestação em Berlim) enfatizaram haver boas relações com os EUA. O antiamericanismo é uma fábula vista somente pelos representantes da CDU, que só conseguem pensar em termos de guerra fria."
A base das desavenças
Trittin contesta que declarações unilaterais do governo alemão tenham causado a crise entre Berlim e Washington. "A mudança estratégica na política externa do governo Bush – a abolição do primado do direito e da multilateralidade – gerou o conflito. O governo americano declarou como recurso legítimo a guerra preventiva. É uma mudança fundamental."
O ministro apontou o que ele considera a origem do unilateralismo do governo republicano: "A clara declaração do vice-presidente (Dick Cheney), em agosto de 2002, de que os EUA atropelaria a ONU em caso de necessidade, se as Nações Unidas não se comportassem em conformidade com os interesses americanos. Esta pretensão unilateral é o centro do problema." Para o membro do diretório nacional do Partido Verde, a nova ordem mundial depende da opção de Washington entre unilateralismo e multilateralismo.
Análise da crise iraquiana
Trittin esquivou-se entretanto de avaliar se um ataque ao Iraque com respaldo da maioria do Conselho de Segurança não seria um ato resultante de uma política multilateral. Ele preferiu responder com sua análise do quadro atual: "Sejamos claros. Saddam Hussein é um criminoso que já usou gás venenoso contra seu próprio povo, quando ainda era apoiado por alguns ocidentais contra o Irã. Os inspetores não têm conhecimento até agora da existência de armas de extermínio no Iraque. Eles mesmos dizem que estão no caminho certo e precisam de mais tempo. Não haveria ameaça grave. A democracia deve manter a relação entre objetivos e meios. Uma guerra, portanto, não se justifica. Este debate se desvia dos interesses próprios dos EUA", ou seja, geoestratégicos e em matérias-primas. "Os críticos estão certos com seu lema: nada de guerra por óleo", esclareceu.
Questionado se não seria graças à ameaça dos EUA que os inspetores da ONU puderam retomar seus trabalhos no Iraque, Trittin respondeu: "Já antes do retorno dos inspetores o Iraque não representava mais perigo para seus vizinhos, pois as inspeções destruíram, até 1998, mais armas do que a Guerra do Golfo de 1991. A lógica da ameaça de guerra é terminar sempre em guerra."
Em defesa dos elos com Israel e França
O político identificado com correntes esquerdistas do Partido Verde não acha nem que uma guerra se justificaria no caso de Israel sentir-se ameaçado pelo vizinho. "Pelo contrário. Exatamente porque a Alemanha possui responsabilidade especial na segurança de Israel, temos de evitar uma guerra que ameaça toda a região."
Jürgen Trittin não teme que a França rompa a aliança pacifista com a Alemanha. "Aprendi com Helmut Kohl (ex-chanceler democrata-cristão) que a aliança com os franceses é um dos grandes aprendizados da história alemã. A CDU esqueceu esta lição por completo e se colocou contra a França no séquito cego da administração Bush."