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Crise política pode atrasar soluções para economia de Portugal

Tilo Wagner/Lauren Frayer/Nina Haase (ca)5 de julho de 2013

A coalizão de governo viveu esta semana uma de suas piores crises. Após renúncia de dois ministros, cúpula política tenta reanimar aliança governamental. Discussões poderiam dificultar execução de soluções econômicas.

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Foto: Reuters

O analista Nicolas Veron, do instituto de pesquisas econômicas Bruegel, em Bruxelas, não se diz surpreso com uma aparente volta da crise na zona do euro, a união monetária europeia: "A crise nunca passou", afirmou, taxativo, em entrevista à DW. Veron também não se assustou com os últimos desenvolvimentos políticos em Portugal e as reações dos mercados, "relativamente calmos nos últimos meses. Mas os problemas continuaram lá: problemas financeiros, crescimento econômico baixo, questões fiscais e as tensões sociais e políticas do país."

Veron faz alusão à crise política que culminou esta semana no país europeu endividado. Nesta sexta-feira (05/07), o primeiro-ministro Pedro Passos Coelho anunciou ter encontrado uma "fórmula" para assegurar a estabilidade do governo, sem precisar o conteúdo da solução, resultado de negociações com Paulo Portas, ministro das Relações Exteriores cujo pedido de demissão acentuou a crise política portuguesa na última terça-feira.

Portas é chefe do partido Centro Democrático e Social – Partido Popular (CDS-PP), minoritário na coalizão de governo. A aliança com o Partido Social-Democrata (PSD) de Passos Coelho permitiu que a coligação, no poder desde 2011, tivesse a maioria no parlamento.

O anúncio da "fórmula" de Passos Coelho se seguiu a um encontro com o presidente português, Aníbal Cavaco Silva, a quem o primeiro-ministro deveria apresentar uma solução de saída da crise. Cavaco Silva não se pronunciou. Ele tem o poder de dissolver a Assembleia legislativa e, segundo especialistas, poderia assumir uma posição após encontro, na próxima segunda-feira (08/07), com representantes dos partidos da esquerda portuguesa. Assim como o Partido Socialista (PS), principal formação da oposição, estas legendas reclamam a demissão do governo português e a convocação de eleições legislativas antecipadas.

Crise na economia e na política

A renúncia do ministro das Finanças Vítor Gaspar provocou a crise na coalizão de centro-direita. Pedro Passos Coelho indicou Maria Luis Albuquerque, uma colaboradora próxima de Gaspar, para assumir o Ministério das Finanças, ofendendo, assim, Paulo Portas.

Protest in Portugal Juni 2013
Portuguesa pede renúncia do governo durante protesto, em junhoFoto: FRANCISCO LEONG/AFP/Getty Images

Ele havia se manifestado contra a continuação das duras medidas de austeridade econômica, arquitetadas por Gaspar para conter a crise em Portugal e para atender às exigências da chamada troica de credores internacionais, formada pelo Fundo Monetário Internacional (FMI), pelo Banco Central Europeu (BCE) e pela Comissão Europeia.

As medidas do governo português foram tomadas em comum acordo com as instituições internacionais quando, em 2011, ficou muito caro para Portugal se financiar nos mercados financeiros. O país aceitou um programa de auxílio financeiro internacional de 78 bilhões de euros. Em troca, prometeu à troica que aumentaria impostos e que cortaria salários de funcionários públicos e seus benefícios.

Porém, observadores avaliam que as medidas de austeridade foram rígidas demais e que Portugal exagerou ao cumpri-las. Por isso, acabaram mergulhando o país numa recessão mais profunda, com um aumento inesperado da taxa de desemprego, o que causou protestos e greves. Alguns portugueses, por exemplo, viram a carga tributária dobrar, o preço dos programas de saúde aumentar e os postos de trabalho desaparecer. Esses fenômenos diminuíram o apoio da população às medidas econômicas.

Até o final do ano, a economia portuguesa deverá recuar 2,3%, enquanto a taxa de desemprego poderá atingir o patamar recorde de 18,2%. Os credores aceitaram, por duas vezes, aliviar os objetivos orçamentários do governo. Portugal tem até 2015 para diminuir o déficit público para abaixo dos 3% exigidos pela União Europeia.

Na quarta-feira (03/07), a Bolsa de Valores de Lisboa perdeu 3 bilhões de euros num único dia de pregão. Ao mesmo tempo, os juros sobre os títulos públicos portugueses subiram 40%.

Falta de liderança política

Durante a semana, vários observadores políticos chegaram a considerar inevitável a renúncia do governo. Um deles é o cientista político Pedro Adão e Silva: "A ideia de que é possível resgatar esta situação política é completamente absurda. Mesmo antes dessa crise, o primeiro-ministro estava muito frágil. Agora ele é um cadáver político", explicou.

Mesmo assim, os dois partidos de coalizão tentam reanimar a aliança governamental. As negociações acontecem sob o temor de que Portugal venha a precisar de um segundo pacote de resgate, caso a estabilidade política não retorne ao país, já que a falta de liderança complicaria a concretização de um plano econômico.

Para o especialista Nicolas Veron, porém, um segundo pacote de resgate não é a única opção, já que, teoricamente, os parceiros de Portugal têm vários instrumentos para ajudar o país. "Eles [os parceiros] podem revisar as condições, reestruturar a dívida e o pagamento da dívida. Mas isso requer vontade política dos europeus."

Pressão de Bruxelas

Também o presidente da Comissão Europeia, José Manuel Durão Barroso, advertiu que uma crise política poderia anular os esforços de austeridade econômica dos portugueses. Mas nem todos os especialistas compartilham dessa opinião. Pedro Lains acusa os credores internacionais de tentar intimidar os portugueses, para que eles não pressionem por uma mudança política no país.

Portugal Premier Minister Pedro Passos Coelho in Berlin am 3. Juli 2013
Pedro Passos Coelho não renunciou a cargo de primeiro-ministroFoto: Reuters

Segundo Lains, essa "ameaça política" é parte de um jogo de poder. "Primeiro os cidadãos foram assustados com a troica e com a informação de que não havia mais dinheiro", disse Lains. Em tempos de crise, o medo é, infelizmente, um fenômeno muito comum, explicou o professor da Universidade de Lisboa.

O sociólogo acredita que o momento é até relativamente apropriado para novas eleições em Portugal. Até o início de 2014, o país não precisa captar mais dinheiro nos mercados financeiros e um novo governo teria tempo o suficiente para preparar o orçamento do próximo ano. E os socialistas, que nas pesquisas de opinião estão bem à frente dos partidos da coalizão de governo, enfatizaram repetidamente que, em princípio, querem ater-se ao programa de reformas e austeridade econômica da troica.

Questões sobre nova onda de protestos em Portugal

O cientista político José Maltez disse lamentar que os Estados democráticos sejam tratados de forma diferente na Europa: "Em circunstâncias democráticas normais, teriam que ser convocadas eleições gerais. O problema é que a democracia portuguesa vive sob uma espécie de regime de protetorado. Aquilo que é bom para grandes potências na Europa não é para as pequenas potências, que têm uma democracia condicionada."

Para observadores como Maltez, a estabilidade política não deverá retornar a Portugal, mesmo com a aparente abrandamento na cúpula do governo. A associação sindical comunista convocou protestos já para o próximo sábado e o Partido Verde pretende apresentar uma moção de censura no Parlamento (proposta da oposição para constranger ou derrubar o governo).

Muitos observadores políticos acreditam que o governo, que só consegue manter-se no poder pelo medo de novas eleições, não conseguirá reunir a força necessária para implantar medidas decisivas como a iminente reforma do Estado.

O cientista político Pedro Adão e Silva teme que Portugal seja governado futuramente por um grupo de tecnocratas, que não tenham base popular, mas que recebam o apoio das instituições internacionais.

Portugal Lissabon Politologe Pedro Adão e Silva
Adão e Silva teme governo tecnocrataFoto: T.Wagner

"A Europa não aprendeu com a história da Europa dos últimos anos. A ilusão dos governos tecnocráticos é uma ilusão que fracassou na Itália, fracassou na Grécia. E basta olhar para os resultados eleitorais depois da experiência dos governos tecnocráticos e para os resultados de gestão orçamentária e política desses governos para perceber que não vale a pena insistir no que já falhou", afirmou Adão e Silva.

Para garantir a continuação do atual governo, uma das exigências feitas pelo parceiro menor de coalizão foi o desejo por um fim das duras medidas de austeridade. Assim, um resultado da atual crise em Portugal já parece certo: com ou sem novas eleições, Portugal deverá se esforçar junto à troica para que as metas de déficit orçamentário sejam afrouxadas e para definir impulsos para um crescimento econômico sustentável.