Europeus divididos sobre acordo com Mercosul
24 de agosto de 2019Os incêndios que devoram a Floresta Amazônica provocaram comoção e declarações de preocupação por parte de líderes europeus. Chefes de Estado e governo, contudo, estão divididos sobre até que ponto a crise deve influenciar o acordo comercial entre a União Europeia (UE) e o Mercosul.
A questão amazônica será um dos temas centrais da cúpula do G7, que teve início neste sábado (24/08) na cidade de Biarritz, na costa sudoeste da França. Até o fim da cimeira, na segunda-feira, o anfitrião Emmanuel Macron, presidente francês, deverá tentar arrancar resultados concretos em relação à Amazônia dos colegas presentes, muitos deles líderes europeus.
Neste sábado, Macron lançou um apelo a todas as potências mundiais para que ajudem o Brasil e outros países da América do Sul a combater os incêndios na Floresta Amazônica, que chamou de "nosso bem comum". "Devemos responder de maneira concreta ao apelo das florestas que queimam agora na Amazônia", disse o francês em discurso transmitido na televisão.
Antes da cúpula, o governo de Macron deixou claro que se opõe à ratificação do acordo de livre-comércio com o bloco sul-americano, afirmando que Jair Bolsonaro mentiu ao assumir compromissos em defesa do meio ambiente, dados como condição para o pacto.
"Dada a atitude do Brasil nas últimas semanas, o presidente da República [francesa] só pode constatar que o presidente Bolsonaro mentiu para ele na cúpula [do G20] em Osaka. Nessas circunstâncias, a França se opõe ao acordo com o Mercosul", diz uma nota do governo francês, emitida na sexta-feira.
O acordo UE-Mercosul foi fechado em junho, à época da cúpula do G20 no Japão, após 20 anos de negociações. Macron afirmara na ocasião que o fechamento só foi bem-sucedido porque Bolsonaro deu garantias de preservação do meio ambiente brasileiro. Os parlamentos de todos os países-membros do bloco europeu ainda precisam ratificar o pacto.
Na linha de Macron, o presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk, afirmou neste sábado que considera difícil imaginar que a União Europeia ratifique o acordo com o Mercosul enquanto o Brasil não detém os incêndios florestais na Amazônia.
"A Floresta Amazônica em chamas tornou-se outro sinal deprimente dos nossos tempos. É claro que apoiamos o acordo UE-Mercosul, que também se trata de proteger o clima e o meio ambiente, mas é difícil imaginar um processo harmonioso de ratificação pelos países europeus enquanto o governo brasileiro permitir a destruição dos pulmões verdes do Planeta Terra", disse Tusk em nota.
Também em Biarritz para a cúpula do G7, o presidente do Conselho Europeu acrescentou que a UE está "pronta para oferecer ajuda financeira para combater os incêndios".
O governo da Irlanda, país-membro do bloco europeu, mas não do G7, foi outro a afirmar que não deve ratificar o acordo devido à falta de comprometimento dos brasileiros em "honrar seus compromissos ambientais".
A posição, contudo, não é a mesma de outras nações europeias, como Alemanha e Reino Unido, que compõem o Grupo dos Sete ao lado de Canadá, Estados Unidos, França, Itália e Japão.
A chanceler federal alemã, Angela Merkel, afirmou neste sábado que compartilha da preocupação de Macron em relação à Amazônia, mas declarou que vetar o acordo comercial com o Mercosul não contribuirá para combater a destruição das florestas.
Em nota, o governo alemão disse que o pacto de livre-comércio "inclui um capítulo ambicioso sobre sustentabilidade com regras vinculantes sobre proteção do clima", sob o qual ambas as partes do acordo se comprometeram a implementar o Acordo de Paris sobre o clima.
"Portanto, a não conclusão [do acordo] não é, do nosso ponto de vista, a resposta apropriada ao que está acontecendo atualmente no Brasil", acrescentou o gabinete de Merkel.
Em mensagem de vídeo neste sábado, a chanceler federal deixou claro, contudo, que os líderes do G7 "não podem se silenciar" diante das queimadas amazônicas, e prometeu trabalhar para que tudo seja feito para combater os incêndios. "Emmanuel Macron está certo – nossa casa está queimando, e não podemos ficar em silêncio", afirmou.
Por sua vez, o primeiro-ministro do Reino Unido, Boris Johnson, foi mais duro em suas declarações ao rebater os líderes europeus que sugeriram que a destruição na Amazônia deve afetar o acordo comercial com a região.
"Há todo tipo de gente que aceita qualquer desculpa para interferir no comércio e para frustrar acordos comerciais, e eu não quero ver isso", disse o chefe de governo britânico neste sábado, ao chegar a Biarritz para a cúpula do G7.
Ele concordou, contudo, que a cimeira na cidade francesa precisa discutir a situação das queimadas, que chamou de "tragédia do que a humanidade está infligindo ao mundo natural". Johnson ainda ofereceu a ajuda do Reino Unido para combater os incêndios.
Bolsonaro vem trocando farpas com líderes internacionais sobre a questão ambiental há tempos. Mais recentemente, reclamou das declarações de Macron sobre a Amazônia, acusando-o de "mentalidade colonialista" e de "instrumentalizar uma questão interna do Brasil". Em pronunciamento na sexta-feira, o presidente afirmou que os incêndios não podem servir de pretexto para retaliações internacionais.
EK/afp/ap/dpa/ots
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