Estreia nos cinemas saga da imigração alemã para o Brasil
3 de outubro de 2013Quando, em meados do século 19, a Europa foi tomada pela fome, pobreza e dominação arbitrária, centenas de milhares de europeus procuraram a sorte na longínqua América do Sul. Tendo como pano de fundo a imigração alemã da região do Hunsrück para o Brasil, o diretor Edgar Reitz lança agora seu novo filme Die andere Heimat – Chronik einer Sehnsucht (A outra pátria – Crônica de um desejo).
O filme de quase quatro horas estreou no Festival de Veneza e está sendo lançado nesta quinta-feira (03/10), Dia da Unidade Alemã, nos cinemas do país. Trata-se da quarta parte do épico do diretor alemão de 81 anos, iniciada há três décadas como série televisiva. No total, as quatro partes somam 56 horas.
A primeira temporada da série Heimat, no início da década de 1980, garantiu ao diretor Edgar Reitz um dos maiores sucessos do cinema alemão. A série também desencadeou um debate na Alemanha em torno do conceito Heimat ("pátria" ou "terra natal"), que após muitos anos, passava a ser redefinido de forma positiva.
"Pátria": um, dois e três
Em 1984, Heimat 1 estreou na televisão. Milhões de telespectadores acompanharam a história de três famílias do vilarejo fictício de Schabbach, na região do Hunsrück, entre 1919 e 1982. A história começa com um dos personagens, Paul Simon, voltando para casa após ter passado algum tempo num campo de prisioneiros, em seguida à derrota alemã na Primeira Guerra Mundial. A saga das três famílias vai se misturando à história do próprio país.
Em 1992, Reitz deu prosseguimento à série com Die Zweite Heimat – Chronik einer Jugend (A segunda pátria – Crônica de uma juventude), onde conta a história de um dos filhos de Simon, Hermann, que deixa Schabbach para estudar música em Munique. Em 2004, Heimat 3 dava prosseguimento à história de Hermann, que encontra seu antigo amor, Clarissa, na noite da queda do Muro de Berlim, em 1989. Os dois voltam a ser um casal e retornam ao Hunsrück, de volta às raízes de Hermann.
Embora as duas últimas temporadas não tenham alcançado o sucesso de público da primeira, na ocasião a teórica da cultura Erna Lackner comentou: "O diretor Edgar Reitz alcançou o que até agora nenhum autor conseguiu na literatura alemã: contar o século 20 como romance com muitas histórias de vida. Um sóbrio triunfo para a arte cinematográfica".
Felicidade no Novo Mundo
Concluída a trilogia, parecia que a saga de Heimat chegara ao fim. Mas agora Reitz completa seu universo hunsriqueano com "A outra pátria": uma prequela, pois o filme mergulha fundo no passado de Schabbach, em meados do século 19. Ali, dois irmãos reconhecem que somente o sonho pode salvá-los do vilarejo em que vivem.
Jakob, o irmão mais novo, deixa para trás todos os limites impostos a um jovem camponês. Ele lê todos os livros que lhe caem nas mãos, aprende a língua dos índios e faz planos de aventuras românticas nas florestas brasileiras. Ele sonha com o recomeço numa nova pátria, porém os golpes do destino dificultam a realização de seu sonho.
Por meio de grandes imagens de época, o filme narra o êxodo dos camponeses e artesãos alemães para o Rio Grande do Sul, para o Brasil, para o Novo Mundo. Em infindáveis caravanas de carroças puxadas a cavalo, os emigrantes atravessam montanhas e vales ao longo do Rio Reno, em direção aos portos marítimos onde navios esperam para levá-los numa viagem sem volta, em busca da felicidade.
"Pátria é algo perdido"
Assim como as demais partes do épico, o novo filme cativa pela observação detalhada e pela poesia. Ele documenta como as dificuldades econômicas expulsaram centenas de milhares de sua terra natal. Ao mesmo tempo, o filme mostra como a educação e a leitura dão asas à imaginação e ao desejo de conhecer outros lugares.
Estrelado por Jan Dieter Schneider (Jakob) e Maximilian Scheidt (Gustav), e com o aclamado cineasta Werner Herzog no papel de Alexander von Humboldt, Die andere Heimat foi rodado em locações originais na região do Hunsrück (no estado da Renânia-Palatinado, oeste da Alemanha), onde também nasceu o diretor Edgar Reitz.
Indagado sobre onde é sua terra natal, o cineasta de 81 anos responde: "Acho que aquilo que chamamos de pátria é uma sensação, que só pode se tornar perene através da realização artística. Na realidade, a pátria é sempre algo perdido".
O filme estreou na Alemanha, no último sábado, na cidade de Simmern, no Hunsrück. Como lembra o jornal regional Rhein-Zeitung, o Hunsrück e outras regiões rurais do sudoeste alemão eram muito pobres. Assim, as pessoas deixavam as suas "Schabbach" para tentar a sorte em lugares como o Rio Grande do Sul.
No dia da estreia em Simmern, foi anunciada uma parceria entre a cidadezinha renana e a gaúcha Igrejinha. Desta têm vindo grupos de viagem visitar o Hunsrück, nos últimos anos, a fim de conhecer a pátria de seus antepassados. "Eles fazem uma viagem na própria história, na outra pátria", comentou o Rhein-Zeitung.