Debatendo o câncer
22 de setembro de 2009David Kerr, professor da Universidade de Oxford, é um dos 15 mil especialistas reunidos de 20 a 24 de setembro de 2009 em Berlim no Congresso Europeu de Oncologia. Segundo ele, apesar de ser conhecido como doença dos países industrializados, o câncer passou a afetar principalmente países em desenvolvimento. Quase a metade dos 28 milhões de pessoas que o contraem a cada ano provêm dessas regiões.
"É interessante que pensemos sempre que o câncer é uma doença dos países ricos do Norte. Mas, no ano 2030, haverá mais mortes por câncer do que por aids, tuberculose e malária juntos. E a maioria das vítimas será dos países em desenvolvimento, devido à mudança do estilo de vida e à modificação das infecções, e também porque as pessoas estão ficando mais velhas. A gravidade do câncer atinge particularmente países em desenvolvimento, por estes terem uma infraestrutura clínica muito ruim e muito pouco dinheiro para o setor de saúde. Por esse motivo, tais países são os que estão menos preparados para o iminente tsunami do câncer", explicou o professor.
Kerr sabe do que está falando. Ele atuou durante muito tempo na África e foi conselheiro do governo de Tony Blair em questões de saúde. Ele prepara agora um plano nacional do câncer para o presidente de Gana. Trata-se de ajudar os pobres na África a encontrar um caminho para tornar acessíveis os enormes custos das terapias do câncer.
Falta o básico na África
Segundo o professor de Oxford, o ministro da Saúde de Gana dispõe somente de 10 dólares por ano para cada habitante do país. E o país é uma das democracias mais estáveis e mais desenvolvidas da África Subsaariana, acrescentou.
Falta o básico, diz Kerr. "Ali não podemos oferecer o padrão ocidental de tratamento aos doentes de câncer, é simplesmente impagável. Devemos providenciar o tratamento básico, para uma quimioterapia segura, por exemplo. No entanto, os pacientes com câncer avançado sofrem dores terríveis no final da vida – e tudo que tenho é paracetamol e aspirina. Mesmo o acesso à morfina, que é comum no Ocidente, é muito complicado no Sul do Saara. Precisamos de uma prevenção abrangente do câncer, precisamos de um plano abrangente para todas variedades do câncer. Isso é um enorme empreendimento. Mas nós temos que começar agora, pois uma série de formas de câncer irão duplicar nos próximos dez anos."
O caminho da Índia
O mesmo vale para países como a Índia, relatou o médico G.S. Battacharyya, membro do programa governamental de controle do câncer na Índia. Os custos do câncer são um problema crescente em todos os países em desenvolvimento, explicou.
"Eles não dispõem de recursos. E eu falo da Índia, onde temos 10% da população com renda similar àquela de países industriais desenvolvidos. Outros 20% podem ser comparados com os com o resto do mundo que são assegurados; 60% ainda vivem em regiões com renda inferior a dois dólares diários", disse Battacharyya.
Segundo o médico indiano, essa situação implica duas tarefas principais: quanto melhor o conhecimento sobre o câncer e sua origem, mais cedo ocorre sua detecção; a outra tarefa é a prevenção. "Observando-se as causas, pode-se notar que a maioria das doenças cancerígenas se devem ao estilo de vida: tabaco, promiscuidade ou doenças relacionadas com infecções que podem ser evitadas, como a hepatite, e contra as quais há vacina", explicou.
Otimismo científico
Também contra o vírus do papiloma humano (VPH) existe vacina. O VPH é responsável pelo câncer do colo de útero, que depois do câncer de mama, é o que mais causa mortes entre as mulheres na África e em muitos países asiáticos. Somente na Alemanha, morrem anualmente cerca de 1.700 mulheres vítimas desses tumores e constatam-se 6.500 novos casos de câncer do colo de útero. Apesar disso, os pesquisadores no congresso em Berlim estão otimistas. Novas terapias contra o câncer se tornarão mais brandas, precisas e individualizadas, em parte graças a novas técnicas de irradiação.
Peter Schlag, presidente do congresso e membro do Comprehensive Cancer Center do Hospital Charité de Berlim, afirma que nos últimos dez anos os pesquisadores se aproximaram e compreendem cada vez mais as causas das doenças cancerosas, "que em termos genéticos estão naturalmente nos genes dos tumores. E quando entendemos algo melhor, podemos então tratá-lo de forma mais direcionada, assim como desenvolver objetivamente novos medicamentos".
Intercâmbio internacional
Para que os cientistas não se encontrem e conversem somente em congressos, como em Berlim, há atualmente um intercâmbio ativo e contínuo entre a comunidade científica internacional.
Para Jacek Jassem, da Universidade de Gdansk, o intercâmbio científico e a discussão com outros especialistas são importantes. Segundo o oncologista polonês existe em vários países do Leste Europeu uma grande demanda de prevenção e tratamento adequados contra o câncer.
Entre esses países, ele constata também grandes diferenças. Há os ricos, como a Eslovênia, os com bem menos recursos, como Romênia e Bulgária, e países muito pobres, como os Estados da antiga União Soviética. Segundo Jassem, a Polônia ocuparia uma posição intermediária entre todos esses. Mas o dinheiro não é tudo, e alguns países ocidentais altamente industrializados poderiam aprender com o Leste Europeu, acrescenta.
"Mesmo nos países mais ricos do mundo, como nos EUA, não se pode permitir-se tudo. Ou quando se pensa que é possível, então se vai à falência. O sistema de saúde norte-americano está praticamente falido, porque eles gastam um monte de dinheiro de forma não pragmática, gastam absurdamente com medicamentos muito caros. É uma medicina baseada no dinheiro. Podemos certamente aprender das nações altamente desenvolvidas, mas elas também de nós, ou seja, como tirar o maior proveito de recursos limitados", explicou o cientista polonês.
Autor: Thomas Prinzler (ca)
Revisão: Augusto Valente