Ação militar na Líbia
4 de março de 2011Diante das brutais ações do ditador Muammar Kadafi na repressão aos insurgentes líbios, a comunidade internacional debate cada vez mais a adoção de medidas militares na Líbia, incluindo a criação de uma zona de exclusão aérea no país ou o envio de tropas por terra.
O embaixador-adjunto da Líbia na ONU, Ibrahim Dabbashi, que rompeu com Kadafi, foi um dos primeiros a exigir uma área de não circulação aérea na Líbia. Ele falou de um início de genocídio em seu país, o qual só poderia ser impedido por meio de uma intervenção militar da comunidade internacional.
Do ponto de vista do direito internacional, o ONU poderia emitir um mandato com base na responsabilidade de proteger, compromisso assumido pelos países-membros na Assembleia Geral de 2005.
Segundo esse compromisso, a comunidade internacional tem o dever de proteger uma população em todo e qualquer lugar onde possa acontecer um genocídio, como lembra o cientista político Carlo Masala, da Universidade Militar de Munique.
Intervenção externa
Mas não há consenso entre especialistas internacionais se o que está acontecendo na Líbia pode ser chamado de genocídio. Além disso, até hoje a comunidade internacional poucas vezes pôs em prática o compromisso assumido em 2005.
"Mesmo que isso soe cínico, a situação na Líbia ainda é relativamente inofensiva se comparada com o que aconteceu, há alguns anos, no Darfur. E mesmo assim, nós não agimos no Darfur", enfatiza Masala. "Os países intervêm apenas quando querem defender seus próprios interesses e não motivados por um compromisso internacional", complementa.
Para instituir uma zona de exclusão aérea ou para avançar com a intervenção militar é necessária a aprovação do Conselho de Segurança da ONU. Na semana passada, o grêmio concordou em aplicar sanções contra a Líbia. Mas essa unanimidade dificilmente seria alcançada no caso de uma intervenção militar, mesmo que ela se restringisse ao fechamento do espaço aéreo.
A China e a Rússia provavelmente vetariam esta decisão. Ao Ocidente restaria apenas a opção de agir sem um mandato da ONU. Mas até mesmo na Otan, que dispõe dos meios para impor o fechamento do espaço aéreo, há restrições a uma ação militar.
Otan poderia agir
A Turquia, segundo maior exército da Otan, é contra. França e Alemanha hesitam. O especialista em política de segurança Henning Riecke, da Sociedade Alemã para Política Externa, também é cético: "A proibição do tráfego aéreo é uma questão tão complexa que a curto prazo seria quase impossível aplicá-la, embora a Otan esteja em condições de fazê-lo. Mas a questão é quanto tempo essa operação iria durar, quão ampla ela seria e o que exatamente o mandato das Nações Unidas iria prever."
A Otan dispõe de pessoal e recursos para implementar uma zona de exclusão aérea. A Nato Response Force – Força de Reação da Otan – possui uma tropa militar móvel capaz de enviar, em uma semana, 14 mil soldados para operações militares também fora da Europa.
Porém a Líbia apresenta riscos geopolíticos peculiares. A maior parte do país é um deserto. A Líbia é quase cinco vezes maior que a Alemanha e, para controlar o espaço aéreo de um território como este com eficiência, seriam necessários de 100 e 150 voos diários. Nem mesmo a Otan teria condições de fazer isso a longo prazo.
"Não vai funcionar"
Para Riecke, uma área de não circulação aérea não teria um impacto direto na luta entre as tropas de Kadafi e os rebeldes. "Daria-se início a uma operação muito complexa e de efeitos muito limitados para o confronto que ocorre no país", afirma.
Até hoje houve apenas dois casos de restrição de voos. No norte do Iraque em 1991, para proteger os curdos dos ataques aéreos de Saddam Hussein; e em meados dos anos 1990 com o mandato da ONU na Bósnia-Herzegovina. Mesmo assim, o massacre de Srebrenica não foi evitado.
Por isso, para a maioria dos especialistas, faz mais sentido uma intervenção de tropas por terra para proteger os oposicionistas da ação das forças leais a Kadafi e também para apoiar os serviços de ajuda humanitária às centenas de pessoas refugiadas nas fronteiras do país.
Autor: Daniel Scheschkewitz (br)
Revisão: Alexandre Schossler