China, Cuba e Rússia entram em Conselho de Direitos Humanos
14 de outubro de 2020Mesmo com históricos controversos, China, Rússia e Cuba conquistaram nesta terça-feira (13/10) vagas no principal órgão de direitos humanos da Organização das Nações Unidas, apesar dos alertas de grupos ativistas.
O Conselho de Direitos Humanos da ONU renovou 15 dos seus 47 assentos, em votação secreta da Assembleia Geral. Também foram eleitos Bolívia, França, Gabão, Malawi, México, Nepal, Paquistão, Senegal, Costa do Marfim, Ucrânia, Reino Unido e Uzbequistão.
O Conselho é o órgão máximo da ONU contra a opressão, a discriminação e a tortura. Os membros competem de acordo com a posição geográfica. Via de regra, a escolha dentro dos grupos de países já é determinada por acordos prévios. O mandato é de três anos e só é possível acumular dois mandatos consecutivos.
Cuba e Rússia foram beneficiados pela falta de concorrentes nas regiões da América Latina e Caribe e Leste Europeu, respectivamente. Já a China enfrentou competição na área da Ásia-Pacífico, onde cinco nações disputavam quatro vagas. A segunda maior economia do mundo conquistou a última vaga, deixando a Arábia Saudita de fora. O Paquistão teve 169 votos, o Uzbequistão, 164, o Nepal, 150, a China, 139 e a Arábia Saudita, apenas 90.
Organizações de direitos humanos como a Human Rights Watch (HRW) e a Anistia Internacional alertaram previamente contra a adesão de China, Rússia e Arábia Saudita no Conselho. A ONG disse que adversários notórios dos direitos humanos não deveriam ter assento e votar no órgão da ONU.
"O fato de a Arábia Saudita não ter obtido um assento no Conselho de Direitos Humanos é um lembrete bem-vindo de que deve haver mais competição nas eleições da ONU", disse Louis Charbonneau, diretor de Nações Unidas na HRW.
Charbonneau disse na semana passada que "quando os estados não têm escolha, os piores candidatos facilmente encontram o seu caminho para o Conselho". De acordo com ele, se houvesse mais candidatos, China, Cuba e Rússia também poderiam ter ficado de fora.
Para Charbonneau, porém, a adição desses países, os quais chamou de "indignos" ao posto, não impedirá o Conselho de lançar luz sobre abusos e defender as vítimas. "Na verdade, por estarem no Conselho, esses abusadores estarão diretamente no centro das atenções", disse.
Em entrevista recente à DW, Sarah Brooks, do programa asiático da ONG International Service for Human Rights (ISHR), comentou sobre a eleição da China, afirmando que ela coloca em cheque a credibilidade do Conselho.
"Quando a China está no conselho e ativamente engajada, coloca-se em risco uma série de esforços para usar o Conselho para tratar de violações em todo o mundo. Isso não se limita à China, mas também em Myanmar, Venezuela, Arábia Saudita ou Filipinas."
Também em declaração à DW, Sophie Richardson, diretora da HRW para a China, disse que a eleição do país "chamará mais atenção do próprio Conselho e dos mecanismos de direitos humanos da ONU para a ameaça que Pequim representa para eles".
Apesar dos planos de reforma anunciados pela Arábia Saudita, a HRW e outras organizações se opuseram veementemente à sua candidatura, alegando que a nação do Oriente Médio continua a visar defensores dos direitos humanos, dissidentes e ativistas dos direitos das mulheres e demonstrou pouca responsabilidade por abusos anteriores, incluindo o assassinato do colunista do jornal Washington Post Jamal Khashoggi, no consulado saudita em Istambul há dois anos.
Candidaturas desqualificadas
Na semana passada, uma coalizão de grupos de direitos humanos da Europa, Estados Unidos e Canadá pediu aos países membros da ONU que se opusessem à eleição de China, Rússia, Arábia Saudita, Cuba, Paquistão e Uzbequistão, justificando que seus históricos de direitos humanos os tornam "desqualificados" para o Conselho.
"Eleger essas ditaduras como juízes de direitos humanos da ONU é como transformar uma gangue de incendiários no corpo de bombeiros", disse Hillel Neuer, diretora-executiva da UN Watch.
A organização de direitos humanos publicou um relatório conjunto com outras entidades da área avaliando candidatos a assentos no Conselho. O relatório aponta como qualificados apenas Reino Unido e França. Bolívia, Costa do Marfim, Nepal, Malawi, México, Senegal e Ucrânia são listados como "questionáveis".
A China é acusada por diversas entidades de violações em massa dos direitos humanos em Hong Kong e no Tibete e contra os uigures étnicos na província chinesa de Xinjiang, além de ataques a jornalistas, advogados e críticos do governo. Contra a Rússia pesam as operações militares em conjunto com o governo sírio que provocaram a morte de civis e destruíram hospitais e outras infraestruturas.
No ano passado, aeleição da Venezuela para o Conselho já havia causado controvérsia. Em 2018, os Estados Unidos anunciaram sua retirada do conselho, em parte por considerarem o conselho anti-israelense.
O Conselho de Direitos Humanos foi criado em 2006 para substituir a então Comissão de Direitos Humanos, extinta após 60 anos de trabalhos devido à crise de legitimidade, motivada por decisões vistas como parciais, politizadas e desequilibradas.
LE/lusa/ap/ots