Já fazia um tempinho que o futebol alemão não marcava presença no maior torneio de clubes do mundo como na atual temporada. Dos 16 finalistas da Champions League, quatro são alemães. Somente a Espanha conseguiu classificar também os seus quatro participantes da fase de grupos, enquanto Inglaterra e Itália amargaram a eliminação já nessa etapa de um de seus clubes – respectivamente Manchester United e Inter de Milão.
Não bastasse esse bom desempenho do futebol alemão na Champions, Leverkusen e Hoffenheim também fizeram bonito na Europa League. Ficaram em primeiro lugar nos seus grupos e estão no mata-mata da competição.
A última vez que quatro representantes germânicos passaram à fase decisiva do torneio da elite do futebol europeu foi na temporada 2014/2015. O atual desempenho dos clubes alemães no palco internacional é uma evidência da progressiva evolução da Bundesliga. Basta dizer que, há apenas dois anos, ela não teve nenhum representante nas quartas de final do torneio. Os únicos dois times que sobreviveram à fase de grupos – Bayern e Dortmund – foram eliminados logo de cara nas oitavas.
O maior exemplo da nova força emergente do futebol alemão é o Leipzig que, sob o comando do talentoso jovem técnico Julian Nagelsmann, tornou-se um adversário a ser levado a sério não apenas na Bundesliga, mas também em qualquer torneio internacional. Já na campanha passada chegou às semifinais, e, na atual, eliminou o Manchester United, além de jogar de igual para igual com o Paris Saint Germain, de Neymar, Mbappé e cia.
Além do sucesso esportivo, a passagem para a próxima fase representa também um alívio nas finanças dos clubes, que se ressentem da total ausência de público nos estádios por conta da pandemia. Cada ponto conquistado na fase de grupos dá direito a 900 mil euros em caixa. O Bayern, por exemplo, só pelo quesito pontos ganhos recebeu 14,4 milhões de euros acrescidos de 15,25 milhões por sua participação nessa etapa e mais 9,5 milhões pela passagem às oitavas de final. São quase 40 milhões de euros que certamente vão dar uma aliviada no fluxo de caixa dos clubes.
Resta saber se a jornada auspiciosa dos alemães na primeira fase dessas duas competições europeias vai se repetir na etapa do mata-mata. Já na próxima rodada, em fevereiro e março do ano que vem, vamos saber se o sexteto formado por Bayern, Dortmund, Leipzig, Gladbach, Leverkusen e Hoffenheim vai dar conta do recado.
As perspectivas são boas, a começar pela Europa League. O Leverkusen, em grande forma, vai pegar o suíço Young Boys Bern e, em condições normais, deve passar às oitavas de final, mesmo porque o jogo de volta, que costuma ser decisivo, será na BayArena. Por sua vez, se o Hoffenheim repetir sua excelente campanha invicta da fase de grupos, é claro favorito diante do norueguês Molde. O sorteio acabou dando sorte para os dois alemães, visto que poderiam ter que enfrentar adversários bem mais difíceis.
Na Champions League o panorama é um pouco diferente. Especialmente o Borussia M'Gladbach não terá vida fácil. É bom lembrar que os "potros" não conseguiram vencer nem a Inter de Milão nem o Real Madrid. Acabaram se classificando às oitavas porque Inter e Shakhtar não saíram do 0x0 na última rodada. E agora os comandados do bom técnico Marco Rose terão o Manchester City, de Pep Guardiola, pela frente, com chances remotas de passar adiante.
Leipzig e Liverpool prometem um bom duelo, mesmo porque são dirigidos por dois dos melhores técnicos da atualidade, Julian Nagelsmann e Jürgen Klopp. O Liverpool aparentemente não dispõe mais do mesmo ímpeto dos dois anos anteriores, enquanto o Leipzig dá claros sinais de um considerável desenvolvimento coletivo e se encontra numa espiral ascendente.
O Borussia Dortmund passou relativamente bem pela fase de grupos, na qual teve adversários fáceis, exceto a Lazio, de quem não conseguiu ganhar (uma derrota e um empate), e agora vai se confrontar com o Sevilla, um clube que desde 2015 conquistou quatro títulos da Europa League. Será um osso duro de roer para os aurinegros, que atualmente tentam superar uma crise interna no clube depois da demissão do técnico Lucien Favre, que não resistiu após ter levado uma sapatada de 5x1 do Stuttgart na Bundesliga.
Resta o Bayern, o eterno campeão alemão, que não repete suas brilhantes atuações da última campanha e comete falhas clamorosas no setor defensivo. Algumas vezes o jogo dos bávaros se apresenta de forma desordenada, e caso sua defesa insistir nos erros vistos ultimamente em partidas da Bundesliga, o sonho do bi pode virar fumaça. Provavelmente não diante da Lazio, a adversária nas oitavas, mas daí para frente os comandados de Hansi Flick certamente não terão moleza.
Seja como for, na atual conjuntura do futebol europeu, não se vê uma ou duas equipes se destacando soberanamente sobre as demais. Mesmo entre os chamados grandes, como Real Madrid, Barcelona, PSG, Manchester City e o próprio Bayern, há um maior equilíbrio. Talvez tenha chegado a hora e a vez de uma nova força se estabelecer na Europa.
Leipzig, Sevilla e Atalanta estão à espreita.
--
Gerd Wenzel começou no jornalismo esportivo em 1991 na TV Cultura de São Paulo, quando pela primeira vez foi exibida a Bundesliga no Brasil. Atuou nos canais ESPN como especialista em futebol alemão de 2002 a 2020, quando passou a comentar os jogos da Bundesliga para a OneFootball de Berlim. Semanalmente, às quintas, produz o Podcast "Bundesliga no Ar". A coluna Halbzeit sai às terças.