Bibliothek: Walter Benjamin, de Berlim para o mundo
18 de julho de 2017Walter Benjamin talvez seja o pensador alemão mais influente, citado e estudado no campo da literatura no século 20. Não apenas seu pensamento, mas também sua vida gera admiração e paixão. Ainda que visto primordialmente como crítico literário e pensador da linguagem, seu trabalho sempre foi o de um criador devido a sua grande originalidade. Seu uso do fragmento e do esboço fazem dele um escritor eminentemente moderno.
O nome de Benjamin é muito associado a Paris por seus estudos sobre a capital francesa no século 19, mas para mim é impossível dissociar seu nome de Berlim, a cidade onde nasceu, no bairro de Charlottenburg.
O pensamento de Benjamin mais conhecido é aquele produzido no final dos anos 1920, quando escreveu a tese que o tornaria famoso: A origem do drama barroco alemão. Extremamente prolífico, vivendo para o pensamento e a escrita, este foi também o período de composição de um trabalho bastante diferente e um dos seus livros mais queridos, Rua de mão única (Einbahnstraße), formado por aforismos e fragmentos, um documento importante produzido durante a República de Weimar.
Na obra, Benjamin discute assuntos que não são convencionais no trabalho de um pensador: cartazes, monumentos, praças e mesmo seus sonhos, tudo ligado às ruas de sua cidade natal. O livro é frequentemente unido a outro trabalho bastante pessoal seu, Infância berlinense: 1900 (Berliner Kindheit um Neunzehnhundert), publicado postumamente em 1950.
Uma edição recente no Brasil, com tradução de João Barrento, traz os dois trabalhos em um único volume: Rua de mão única - Infância berlinense: 1900 (Belo Horizonte: Editora Autência, 2013). É uma edição muito bonita, importante para conhecer a mente do alemão e ter um retrato da Berlim dos anos 1920. As duas obras revelam algo da alma da Berlim da época, sua atmosfera, o que se perdeu e o que restou. Para quem talvez não esteja interessado em crítica literária ou nos trabalhos mais densamente filosóficos do autor, este dois pequenos trabalhos são excelentes. Guias interessantes para quem vive em Berlim ou se interessa por sua história.
Mas se foi em Berlim que Benjamin nasceu e cresceu, não seria permitido a ele morrer em sua cidade natal. Com a chegada dos nazistas ao poder, a vida de qualquer intelectual judeu tornou-se impossível na Alemanha. Em 1933, ele se exilou em Paris. Mas a guerra expandiu o poder nazista por círculos cada vez maiores.
Em 1940, como tantos outros, o berlinense estava em fuga pelo sul da Europa, tentando deixar o continente de qualquer maneira. A história é bastante triste. De Marselha, sua única esperança era chegar à Espanha e daí a Portugal. Com um grupo de refugiados, Benjamin se viu obrigado a cruzar as montanhas entre França e Espanha para chegar à cidade fronteiriça de Portbou.
Apesar de sua idade e seu estado de saúde precário, ele conseguiu chegar à pequena cidade onde não permitiram sua entrada e ameaçam enviá-lo de volta à França. Completamente esgotado, o grande pensador berlinense cometeu suicídio.
Um monumento belíssimo em Portbou, cavando uma trincheira na rocha até o mar – com projeto do artista Dani Karavan – marca esta perda gigantesca para Berlim, para a língua alemã, e para todos nós.
Na coluna Bibliothek, publicada às terças-feiras, o escritor Ricardo Domeneck discute a produção literária em língua alemã, fala sobre livros recentes e antigos, faz recomendações de leitura e, de vez em quando, algumas incursões à relação literária entre o alemão e o português. A coluna Bibliothek sucede o Blog Contra a Capa.