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Berlim tenta combater discriminação na polícia

15 de junho de 2020

Nova lei quer impedir abordagens policiais com bases em "perfis raciais", mas encontra resistências entre conservadores e liberais. Sindicatos das polícias também se manifestam contra.

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Policiais em Berlim
Segundo secretário da Justiça de Berlim, lei não muda nada para maioria dos policiais que não age de forma discriminatóriaFoto: picture alliance/dpa/P. Zinken

Berlim se tornou o primeiro estado da Alemanha a aprovar uma lei antidiscriminação, que proíbe as autoridades públicas — incluindo a polícia — de discriminar cidadãos devido à cor da pele, gênero, religião, identidade sexual, entre outros. Na prática, a legislação deve inibir, por exemplo, abordagens policiais com bases em "perfis raciais", o chamado racial profiling.

A lei, no entanto, está sendo duramente criticada, principalmente por políticos da legenda da chanceler federal Angela Merkel, a União Democrata Cristã (CDU), de sua sigla-irmã na Baviera, a União Social Cristã (CSU), e pelos liberais do Partido Liberal Democrático (FDP). Sindicatos das polícias de vários estados alemães também se manifestaram contra a mudança.

Os críticos alegam que a legislação colocaria os policiais "sob suspeita generalizada" e inibiria o trabalho das autoridades, que precisam provar que não estão agindo de maneira discriminatória e poderiam enfrentarem processos. Alguns governadores disseram que não enviarão mais a polícia de seus estados quando Berlim pedir reforço, por exemplo, em grandes eventos na cidade.

O secretário da Justiça de Berlim, Dirk Behrendt, do Partido Verde, argumenta que a lei não limita o trabalho da polícia, apenas ajuda a combater o "racismo sistêmico". Segundo ele, a legislação não mudará nada para a grande maioria dos policiais, que não age de forma discriminatória.

O debate gerado pela lei e a resistência contra ela por parte de alguns grupos, para mim, só reforça que realmente há um problema de discriminação em algumas práticas policiais. Já ouvi várias histórias de pessoas que são controladas pela polícia apenas devido à sua aparência física. Muitos nasceram e cresceram na Alemanha e enfrentam essa situação desde sempre. Também é fácil de perceber esse tipo de comportamento.

Certa vez voltando da República Tcheca de trem, ao cruzar a fronteira, policiais alemães passaram nos vagões controlando alguns passaportes. Estávamos em cinco no meu grupo, e apenas a minha cunhada, que é descendente de japoneses, teve o documento checado. Essa situação é bastante comum em controles em trens, quando apenas aqueles que têm "cara de estrangeiro" precisam mostrar os documentos.

Se para mim já é uma situação bastante constrangedora e revoltante, imagino como deve ser para aqueles que são abordados pela polícia. Esse tipo de discriminação é algo muito simples de ser resolvido, por exemplo, ao solicitar o passaporte e documentos de identificação de todos.

O racial profiling é algo aprendido na polícia aqui. Conversando com dois conhecidos que trabalham na Polícia Federal da Alemanha, contei que, sempre ao passar pelo controle para pegar um avião, era retirada da fila para a verificação mais detalhada da minha bagagem de mão para drogas. Um dos colegas disse que era porque eu era mulher e jovem viajando sozinha e me encaixa no perfil de "mula", continuou dizendo que eles aprendiam na escola de polícia o racial profiling e que baseavam o trabalho nisso. De repente, ele ficou quieto e disse apenas: "Não podia estar falando isso, porque na verdade não podemos dizer que aprendemos desta maneira".

De fato, esse tipo de abordagem possui raízes discriminatórias, privilegiando algumas determinadas aparências e alimentando e propagando estereótipos racistas, além de ir contra o "ideal alemão" da integração. Como alguém que é constantemente abordado pela polícia por parecer estrangeiro pode se sentir bem-vindo em determinado país? Como alguém que nasce e cresce aqui, mas continua sendo visto como estrangeiro por "não ter cara de alemão", pode se identificar com esse país? Qual a necessidade de basear atualmente práticas policiais em conceitos tão atrasados?

A lei berlinense não proíbe que a polícia controle suspeitos, mas quer evitar que alguém com determinado perfil se torne automaticamente suspeito. Policiais precisam apoiar a abordagem em observação. A revolta de alguns políticos mostra que já passou da hora desse tipo de legislação entrar em vigor, para que pelo menos um pouco do "uns são mais iguais do que outros" perca seu valor.

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Clarissa Neher é jornalista da DW Brasil e mora desde 2008 na capital alemã. Na coluna Checkpoint Berlim, escreve sobre a cidade que já não é mais tão pobre, mas continua sexy. Siga-a no Twitter.

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