A casa onde se consolidou o Holocausto
27 de janeiro de 2020Em 20 de janeiro de 1942, um grupo de funcionários do alto escalão do regime nazista se reuniu numa bela mansão às margens do lago Wannsee, num encontro que entrou para a história como a Conferência de Wannsee. No palacete, foi consolidado oficialmente o extermínio em massa dos judeus na Europa.
Hoje, a mansão se transformou num museu que retrata como foi desenhado um dos capítulos mais sombrios da história da Alemanha. Recentemente, a exposição permanente do local passou por uma reestruturação e foi reinaugurada há uma semana.
Um dos pontos centrais da nova exposição interativa é o protocolo que documentou a reunião sobre "a solução final para a questão dos judeus". Apesar de eu conhecer a história, o documento foi um dos aspectos que mais me chamou atenção na visita. As 15 páginas revelam o grau de perversidade e a banalização do próximo num nível extremamente chocante.
Os nazistas reunidos naquela sala discutiram o extermínio de um grupo de seres humanos e, em nenhum momento, acharam que isso poderia ser um crime terrível do qual seria preferível não deixar provas. Não, a conversa simplesmente foi protocolada, num ato administrativo rotineiro de qualquer repartição pública, como se estivessem falando de um problema banal.
Escrito por Adolf Eichmann, que depois da guerra fugiu para se esconder na Argentina, o protocolo da Conferência de Wannsee revela a burocratização do extermínio em massa e estampa a apatia dos nazistas pelos judeus, que simplesmente não eram mais percebidos como seres humanos. Apenas uma cópia do protocolo sobreviveu à guerra.
Com a conferência, os nazistas apenas oficializaram algo que já estava em curso há algum tempo e estabeleceram normas administrativas para organizar oficialmente o Holocausto.
Embora seja centrada na Conferência de Wannsee, a exposição aborda a perseguição e genocídio dos judeus como um todo. Ela começa mostrando que a morte de judeus já era praxe antes mesmo da reunião administrativa. Também traz relatos de vítimas e apresenta os 15 nazistas que participaram do encontro e o destino de cada um deles.
Outro aspecto abordado é o silêncio da população alemã. Sem esse consentimento, o Holocausto provavelmente jamais seria possível. Além daqueles que fechavam os olhos para as barbaridades cometidas contra seus próprios vizinhos ou para o sumiço deles, muitos alemães inclusive lucraram com a perseguição aos judeus. Com o fim da guerra, o jargão "eu não sabia de nada" tomou conta da Alemanha.
A exposição trata ainda do trabalho de reflexão crítica sobre o Holocausto que ocorreu após o fim da Segunda Guerra Mundial e relembra a importância de manter essa memória viva para evitar que esse passado volte a se repetir, principalmente em tempos de ascensão do extremismo de direita pelo mundo.
A Casa da Conferência de Wannsee fica na rua Am Großen Wannsee 56 – 58. A exposição gratuita é aberta ao público de segunda à domingo das 10h às 18h.
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Clarissa Neher é jornalista da DW Brasil e mora desde 2008 na capital alemã. Na coluna Checkpoint Berlim, escreve sobre a cidade que já não é mais tão pobre, mas continua sexy. Siga-a no Twitter @clarissaneher
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