Arte Sacra
20 de agosto de 2007Neste sábado (25/07), está sendo inaugurado o mais novo vitral da catedral de Colônia. Assinado por Gerhard Richter, o alemão considerado o artista vivo mais caro do mundo, o caráter abstrato da obra vem provocando discussões desde que seu projeto foi apresentado ao público, no ano passado.
O vitral de Richter é o novo tesouro do prédio que tomou mais de 600 anos de construção. O mais precioso é com certeza a urna de ouro onde estão depositadas as relíquias dos Três Reis Magos, que elevaram Colônia ao status de cidade sagrada do cristianismo, além de Jerusalém, Roma e Santiago de Compostela.
Depois de sete séculos, Barbara Schock-Werner é a primeira mulher a tornar-se arquiteta da catedral de Colônia. DW-WORLD a entrevistou.
Um importante golpe de marketing
Schock-Werner explica que os restos mortais dos Três Reis Magos foi um "presente" de Milão para Colônia. O imperador alemão, que lutava contra o norte italiano durante o século 12, conquistou a cidade de Milão, entregando as relíquias ao seu chanceler, o então arcebispo de Colônia Reinald von Dassel. O ano era 1164.
Por todo o caminho de volta, Von Dassel fez espalhar que as preciosas relíquias iriam então para Colônia. Um importante golpe de marketing, explica a arquiteta, pois relíquias significavam muitos peregrinos e muitos peregrinos significavam muito dinheiro.
Uma urna de ouro com centenas de pedras preciosas foi encomendada ao mais importante ourives da época, Nicolas de Verdun. Até safiras do Ceilão são encontradas na maior e mais ricamente decorada urna funerária de então. Algo espetacular por volta do ano de 1200, Schock-Werner comenta. Para receber relíquias e peregrinos, foi iniciada a construção da nova igreja sobre a antiga catedral carolíngia do século 9°, em 15 de agosto de 1248.
Quanto à veracidade ou não das relíquias, a arquiteta afirma que os três crânios e as vestimentas encontrados na urna são realmente de três homens que viveram no século 1°. De qualquer forma, o aspecto mais valorizado pela Igreja não seria a autenticidade, mas a força espiritual embutida nas relíquias.
Exemplo para a Torre Eiffel
Durante três séculos, até o início do século 16, trabalhou-se intensamente nas obras da catedral. A redução do número de fiéis e, por conseqüência, das contribuições financeiras por causa da Reforma; a decadência do gótico como estilo arquitetônico, já que na época o Renascimento estava em moda, e o cansaço advindo de 300 anos de obras fizeram com que a construção da catedral parasse por mais três séculos.
As obras somente foram reiniciadas no início do século 19 com a expulsão dos franceses da região. A finalização da catedral tornou-se símbolo da pátria unificada. O apoio prussiano e a retomada da Idade Média pelo Romantismo fizeram com que a Igreja fosse construída com a tecnologia mais avançada da época, mas seguindo, absolutamente, o projeto do século 13. Metade do atual prédio é medieval, a outra metade foi terminada em 1880.
A estrutura metálica do teto que encobre as naves da catedral é um outro tesouro do prédio. "Um monumento dentro do monumento", explica a arquiteta. Esta foi uma das primeiras estruturas executadas em ferro que se tem notícia. Schock-Werner afirma que seus detalhes serviram de exemplo para uma outra famosa estrutura em metal, a Torre Eiffel, inaugurada 20 anos mais tarde, em Paris.
Sobrevivendo a revoluções e guerras
Um outro tesouro mencionado pela arquiteta é a Cruz de Gero, encomendado pelo arcebispo homônimo, por volta do ano de 980. O crucifixo é especial por vários motivos.
Devido aos então recentes conflitos iconoclastas, o realismo da Cruz de Gero se tornou um exemplo para outras cruzes monumentais. Foi, por assim dizer, a primeira cruz monumental, explica Schock-Werner.
Uma outra particularidade é o fato de o crucifixo estar há mais de mil anos pendurado na catedral. Este fato é tão pouco óbvio como a sobrevivência da urna de ouro dos Três Reis Magos. Durante a ocupação francesa, ela foi escondida em um carro de feno e transportada para um convento na região de Sauerland. Sobrevivendo a revoluções e guerras, o ouro da urna não foi derretido e as relíquias ainda estão lá, explica Schock-Werner.
O melhor e não outro qualquer
A novidade em tesouros fica, no entanto, por conta do novo vitral. Diretamente voltado para o sul, o vitral tem 113 metros quadrados de área, começando a 22 metros de altura e indo a quase 45 metros.
Questionada a respeito da escolha de Gerhard Richter para o trabalho, Schock-Werner respondeu: "Na arte vitral contemporânea, não encontrei nenhum outro artista, ao nível desta catedral, que pudesse executar este trabalho. Gerhard Richter mora em Colônia, tem relação com a Igreja Católica, já trabalhou com o figurativo e com o ornamental e é uma pessoa excepcionalmente sensível", afirma a arquiteta.
Bom século para restauração
As cores são as mesmas encontradas nos outros vitrais da catedral. Os 72 tons de cores foram misturados por computador. O capelão da catedral e Schock-Werner haviam pensado na representação figurativa dos santos do século 20. Richter os convenceu que o figurativo não funcionaria.
Uma vitral figurativo, como o que Chagal fez para a catedral de Reims, concorreria com os demais. Sobretudo agora que Schock-Werner decidiu repor os vitrais do século 19, retirados e depositados em caixas durante a Segunda Guerra.
"O século 19 foi muito bom no que se propôs. Foi um século ótimo para restaurações que fez muito bem a este prédio. Após a Segunda Guerra houve, aqui, muitas intervenções com as quais não concordo. Por esta razão, se escolho um artista contemporâneo para intervir na catedral, tem que ser o melhor e não outro qualquer", conclui Schock-Werner.