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Após escândalo de dados, ficar ou sair do Facebook?

Arthur Sullivan rk
26 de abril de 2018

Lucros da plataforma ainda não foram afetados por vazamento de dados de mais de 80 milhões de contas. Mas anunciantes ainda temem debandada de usuários e que alterações nas políticas de privacidade afetem publicidade.

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Dezenas de reproduções em cartolina de Mark Zuckerberg e uma faixa dizendo "conserte o Facebook" diante do Capitólio, em Washington, no dia 10 de abril, antes do depoimento do fundador da rede social sobre escândalo de vazamento de dados
Protesto diante do Capitólio, em Washington, antes de depoimento de Mark ZuckerbergFoto: Reuters/A.-P. Bernstein

Com o passar dos anos, a divulgação dos resultados trimestrais do Facebook se tornou monotonamente previsível. As curvas tanto dos gráficos que medem os lucros quanto os do número de usuários subiram constantemente em proporções astronômicas. Nascida num dormitório estudantil, num intervalo de 14 anos a empresa passou a registrar um lucro anual de 40 bilhões de dólares.

Porém, no primeiro trimestre de 2018, a imagem de sucesso foi arranhada. O escândalo de uso de dados envolvendo o Facebook e a consultoria britânica Cambridge Analytica expôs a rede social a críticas e escrutínio diferentes de tudo o que a companhia já havia vivenciado. O preço das ações despencou, e o fundador e CEO do Facebook, Mark Zuckerberg, foi forçado a se explicar diante do Congresso dos Estados Unidos.

Leia também: Facebook admite vazamento de dados de 87 milhões de usuários

Uma plataforma com mais de 2 bilhões de usuários – o equivalente a espantosos 29% da população mundial –, repentinamente enfrentava questões existenciais. A hashtag #deletefacebook passou a alarmar muita gente, e surgiram temores de que anunciantes, responsáveis por 98% do fluxo de receitas do Facebook, abandonassem a plataforma.

Apesar das previsões catastróficas, o gigante da tecnologia lucrou 4,99 bilhões de dólares no primeiro trimestre – um salto de 63% em relação ao mesmo período do ano passado. Acontece que a rede social só admitiu as falhas de segurança envolvendo a Cambridge Analytica em meados de março, o que pode explicar por que o escândalo ainda não abalou as contas da empresa.

Algumas empresas adotaram medidas decisivas contra o Facebook imediatamente após a revelação de que dados sensíveis de 87 milhões de contas foram fornecidos à consultoria britânica, que usou as informações para construir softwares de algoritmos capazes de influenciar comportamentos eleitorais. A empresa de internet Mozilla, o banco alemão Commerzbank e a companhia de eletroeletrônicos Sonos estavam entre as mais conhecidas a cortarem seus anúncios na rede social.

O que disse Mark Zuckerberg nos depoimentos

Nas semanas desde então, o Facebook vem se empenhando em processos tanto de 
mea culpa quanto de contenção dos danos, em ações que vão da presença de Zuckerberg em Washington à divulgação de várias promessas e mudanças nos parâmetros de privacidade.

"Nós nos importamos com a proteção da sua privacidade", diz um desses pronunciamentos recentes. "Não vendemos os seus dados e configuramos o nosso sistema de anúncios para mostrar a você publicidades relevantes e úteis, sem dizer aos anunciantes quem você é."

Em certa medida, os esforços funcionaram. O Commerzbank, por exemplo, voltou a anunciar na plataforma. "Desde que suspendemos a publicidade na plataforma, iniciamos uma discussão justa e construtiva com o Facebook", disse Uwe Hellmann, do banco, à DW. "Recebemos uma garantia específica sobre as medidas que serão tomadas para assegurar que incidentes como esse não se repetirão no futuro."

A Mozilla, por sua vez, está entre empresas que ainda não retornou ao Facebook. Para o diretor de marketing da empresa, Jascha Kaykas-Wolff, dar o controle dos anúncios customizados aos usuários não é a mesma coisa que estabelecer configurações pré-definidas que vão oferecer uma privacidade significativa já de início.

"É claro que o essencial são as mudanças em políticas e práticas, e vamos continuar observando essa evolução. Ainda não estamos prontos para começar a anunciar na plataforma", destacou.

O produto é você

Quando eclodiu o escândalo e o preço das ações do Facebook começou a cair, vários líderes empresariais se perguntaram se também deveriam considerar "uma pausa" na rede social. A esperada enxurrada de deserções não aconteceu, mas muitos continuam em dúvida. Algumas empresas mundo afora chegaram a gastar milhões de dólares por ano em publicidade no Facebook.

A Nestlé, maior empresa de alimentos e bebidas do mundo, se preocupa com o Facebook e com a maneira como a empresa utiliza os dados dos usuários, ainda que não tenha abolido a publicidade na rede.

"Começamos a dialogar construtivamente com o Facebook pedindo que nos fornecessem detalhes do processo de revisão que está em curso e como isso vai oferecer mais transparência aos usuários", disse um porta-voz à DW. A companhia deverá controlar as mudanças do Facebook na política de privacidade nos próximos meses.

Apesar das reações alarmadas ao escândalo, muitas das posturas das empresas parecem mais uma bronca amena do que algo mais sério. Daniel Kostyra, especialista em Facebook da agência de marketing digital Cocomore, em Frankfurt, presta consultoria a empresas como a Nestlé sobre campanhas publicitárias na rede social. Até agora, ele diz não ter notado grandes mudanças nas atitudes de seus clientes em relação à plataforma. "Ate agora, não houve nenhuma mudança no seu comportamento de gastos", afirma.

Uma vez que o valor do Facebook para os anunciantes é quase que exclusivamente baseado no fornecimento de dados e nas chamadas "campanhas direcionadas", Kostyra acredita que, no fundo, os clientes já sabem que, "se você não está pagando pelo produto, então você é o produto". Ou, em outras palavras, seus dados são o produto.

Como as redes sociais nos influenciam?

Pam Aungs, presidente da Pam Ann Marketing, empresa americana de marketing na internet, acredita ser "altamente improvável" o Facebook perder qualquer receita oriunda de publicidade no curto prazo, e diz que a única inquietação óbvia e aparente entre os anunciantes desde que surgiu o escândalo tem relação com o risco de as mudanças nas configurações de privacidade do Facebook poderem tornar os anúncios menos eficazes.
"Os anunciantes têm medo de perder opções de direcionamento de publicidade", destacou.

Novamente: quem está bravo com o Facebook são os usuários, não os anunciantes. Empresas de marketing como a nossa temem que, à medida que o Facebook aumentar as ações relativas à privacidade, nossas opções de publicidade direcionada ficarão mais limitadas. Isso já começou a acontecer e pode continuar."

Não posso viver (com ou) sem você

Isso sugere que os anunciantes só deixarão maciçamente a rede social quando usuários comuns o fizerem, levando seus dados com eles e tornando o Facebook menos útil para a publicidade. Vários usuários já deixaram o Facebook em 2018. 

Mas nem todos parecem estar dispostos a deletar a própria conta. A berlinense Nadja, por exemplo, usa a rede social há mais de uma década como forma de ficar em contato com amigos e família que moram longe. Embora não esteja contente com o escândalo de dados, ela não considerou seriamente sair da plataforma.

"Se eu sair, pessoas com que eu quero ficar em contato ainda poderão ficar e eu posso não ter mais contato com elas", explicou à DW. "E todo mundo teria que sair e entrar em outra coisa. Esse é um dos motivos que vêm me impedindo de sair."

O Facebook parece esperar exatamente que esse tipo de emoção ajude a superar a atual crise, mesmo estando destinado a perder alguns devotos no caminho. 
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