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HistóriaAlemanha

Alemães ajudaram a formar a classe média paulistana

26 de maio de 2004

Em entrevista à DW-WORLD, Dirk Brinkmann, diretor do Instituto Martius-Staden, em São Paulo, conta sobre a imigração alemã no Estado de São Paulo e fala da contribuição dos alemães para a formação da capital paulista.

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São Paulo, no início do século 20: um dos centros da imigração alemãFoto: H. Rosenthal

A história da imigração alemã para São Paulo começa em 1827 – três anos depois do Rio Grande do Sul – com a chegada de 227 pessoas ao porto de Santos, levadas a Santo Amaro e Itapecerica da Serra. Um contingente que foi aumentando com os anos. O Memorial do Imigrante, no bairro da Mooca, de grande importância para a memória da cidade que como poucas atraiu tantos imigrantes, registra 375 mil nomes alemães no correr dos anos.

Em São Paulo esperava-se um avanço na agricultura, com base na experiência desses colonos. Mas "na verdade, as condições da agricultura e da vida em geral eram tão precárias, que a maioria não ficou muito tempo nessas terras [Santo Amaro, Itapecerica]. Eles começaram a se deslocar para São Paulo, que era uma pequena cidade, com pouco mais de 20 mil habitantes na época", relata Dirk Brinkmann, diretor do Instituto Martius-Staden. Em sua sede, na Rua Sete de Abril, 59, em São Paulo, ele abriga um grande arquivo relacionado à imigração alemã no Brasil.

O que Sampa deve aos alemães

Em entrevista à DW-WORLD, Brinkmann destacou dois pontos, perguntado sobre o que São Paulo deve aos alemães: "A primeira leva de alemães, aqueles três mil do século 19, formava um grupo bastante coeso e forte na cidade de São Paulo. A principal herança que deixaram, a meu ver, foi constituir o primeiro núcleo para uma classe média paulistana. Ou seja, devido ao comércio por eles praticado, criaram uma certa infra-estrutura que se mostrou importantíssima a partir do momento em que chega a grande massa de imigrantes, com as ferrovias, com a chegada dos italianos".

O segundo é a contribuição das indústrias alemãs: "Eu diria que a partir de 1950, muitas empresas alemãs realmente empurraram o Brasil para a modernidade. Se considerarmos que o Estado de São Paulo conta hoje com quase 1200 empresas de capital alemão, isso faz de São Paulo a maior cidade industrial do mundo, incluindo a própria Alemanha". Diante desse número, não poderia haver maior indicador do forte papel que desempenharam no desenvolvimento industrial do Brasil as empresas alemãs que se radicaram no país a partir da segunda metade do século 20.

Arquitetos, engenheiros e urbanistas

Antes disso, arquitetos e urbanistas alemães deram uma contribuição significativa para dar estrutura à cidade, para formar uma base para que ela pudesse crescer nas décadas posteriores. "O primeiro grande engenheiro de São Paulo foi um alemão, Carlos (ou Karl) Rath. Ele foi praticamente o primeiro engenheiro que se empenhou em instalar uma canalização em alguns bairros de São Paulo", informou Dirk Brinkmann.

Depois, há alemães entre os primeiros urbanistas, Victor Notmann, por exemplo, que juntamente com o suíço Frederico Glete dá origem a um empreendimento imobiliário nos Campos Elíseos, iniciando a expansão da cidade para além do Vale do Anhangabaú. Por volta de 1875 são construídas as primeiras casas e palacetes onde só havia chácaras e, no máximo ruazinhas, transformando o cenário urbano. Com o dinheiro da cafeicultura, São Paulo tornava-se "mais mundana, mais elegante".

Artífices e hoteleiros

"Como bons artífices e artesãos, os alemães logo se destacaram em alguns ofícios, tornando-se pequenos comerciantes, chapeleiros, sapateiros e hoteleiros, no que foram os primeiros da cidade." Calcula-se que em 1860, São Paulo teria 30 mil habitantes, dos quais 10% seriam alemães.

Os primeiros colonos trazidos para trabalharem nas fazendas de café chegaram por volta de 1840-1850. Conseqüentemente, grande foi também a influência alemã em cidades do interior de São Paulo, como Campinas, Rio Claro, Limeira. No caso de Lins, o próprio nome da cidade reflete a influência alemã (há uma Linz à beira do Reno, na Alemanha, e uma cidade maior com esse nome, na Áustria).

Os colégios

Colegio Alemao Institut Martius-Staden in Sao Paulo
Os primórdios: Escola Alemã em São Paulo

Em Rio Claro foi fundado o Colégio Koelle, em 1883. Antes disso, já havia sido criada a primeira escola alemã, a Deutsche Schule, na capital paulista, em 1878, que funcionou inicialmente na Rua Florêncio de Abreu. A seguir surgiu uma associação de professores da escola, em 1916, que foi o embrião do Instituto Hans Staden, explica seu diretor – hoje o instituto se chama Martius-Staden, em homenagem aos dois grandes viajantes alemães. Quanto à escola, transformou-se no Colégio Visconde de Porto Seguro, o conceituado colégio alemão de São Paulo.

Juntamente com o Arquivo do Estado de São Paulo, o Instituto Martius-Staden lançou, no ano passado, o livro Uma São Paulo Alemã, da pesquisadora Sílvia C. Lambert Siriani, abordando a vida dos alemães na cidade, desde sua chegada até o fim do Império, em 1889.

Anos 50: VW e outras indústrias

Embora já houvesse muitas indústrias alemãs no Sul do Brasil, no Vale do Itajaí, em Blumenau e Joinville, foi só depois da Segunda Guerra que os grandes grupos começaram a se instalar em massa no Brasil. A Siemens, nessa época, já estava há muito tempo no Brasil, onde foi uma das pioneiras, ao lado da Bayer. Com a Volkswagen, em 1953, a indústria automobilística marca sua entrada no país. E com a VW vieram muitas outras, não apenas fornecedoras.

"Tivemos uma forte entrada de experts que trabalhavam na indústria da década de 70, o milagre brasileiro. Aí chegaram muitos administradores, engenheiros, técnicos, empresários, executivos. Mas isso diminuiu muito nos últimos dez ou quinze anos" – avalia Dirk Brinkmann – "porque a grande maioria das empresas teuto-brasileiras optaram por executivos brasileiros." Hoje, eles não ficariam nada a dever aos alemães.

O fim da imigração

Assim sendo, já não se pode mais falar de uma imigração alemã para o Brasil, um capítulo que estaria encerrado. No entanto, há alemães que, tendo trabalhado para firmas alemãs, decidiram ficar no Brasil. O próprio Brinkmann, que chegou há mais de 15 anos em São Paulo para ensinar inglês e história no Colégio Porto Seguro, considera seu caso exemplar para o de muitos alemães que sucumbiram aos encantos do país. Agora, "com duas filhas brasileiras, fortemente enraizadas e com seu grupo de amigos", é tarde para voltar, o Brasil transformou-se na nova pátria.

Texto originalmente publicado em 2004