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Alemanha deporta afegãos pela primeira vez sob o Talibã

30 de agosto de 2024

Sob pressão para endurecer leis de imigração, governo alemão anuncia ter deportado 28 criminosos para o Afeganistão. Anistia Internacional afirma que Berlim corre risco de se tornar cúmplice do Talibã.

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Avião no aeroporto de Leipzig
Avião com 28 afegãos a bordo partiu de Leipzig rumo a CabulFoto: Jan Woitas/dpa-Zentralbild/dpa/picture alliance

Pela primeira vez desde que o Talibã voltou ao poder no Afeganistão, há três anos, a Alemanha deportou criminosos afegãos de volta a seu país natal nesta sexta-feira (30/08). A medida foi adotada num momento em que o governo alemão enfrenta crescente pressão para endurecer as leis de imigração.

Os 28 cidadãos de nacionalidade afegã deportados foram "condenados por crimes e não têm direito a permanecer na Alemanha", disse o porta-voz do governo federal, Steffen Hebestreit. Segundo a agência de notícias DPA, todos são homens.

Um voo fretado partiu do aeroporto de Leipzig, no leste da Alemanha, rumo a Cabul, capital afegã, pouco antes das 5h desta sexta-feira, exatamente uma semana após um atentado a faca reivindicado pelo grupo terrorista "Estado Islâmico" chocar o país.

O ataque ocorreu numa festa de rua em Solingen, no oeste do país, e deixou três mortos e oito feridos. O principal suspeito é um homem sírio de 26 anos, que deveria ter sido deportado.

A primeira deportação de afegãos em anos também foi realizada às vésperas de duas eleições regionais no leste da Alemanha, marcadas para domingo. Pesquisas colocam o partido de ultradireita e anti-imigração Alternativa para a Alemanha (AfD) em primeiro lugar no estado da Turíngia e em segundo lugar, quase empatado com a União Democrata Cristã (CDU), na Saxônia.

"Nossa segurança importa, e nosso Estado de direito está agindo", declarou a ministra do Interior alemã, Nancy Faeser.

Na segunda-feira, o chanceler federal alemão, Olaf Scholz, havia afirmado que o governo agiria para reforçar os controles de armas e acelerar as deportações de pessoas que tiveram seus pedidos de asilo negados no país. Nesta quinta, foi anunciado um pacote de medidas nesse sentido.

"Um sinal para criminosos"

Segundo a revista alemã Der Spiegel, o voo de deportação para o Afeganistão foi resultado de dois meses de "negociações secretas", nas quais o Catar atuou como intermediário entre Berlim e autoridades do Talibã.

Hebestreit não quis comentar se o Catar, de fato, desempenhou um papel, tendo afirmado apenas que a Alemanha pediu apoio a parceiros regionais para facilitar as deportações. O porta-voz ressaltou que não houve discussões diretas com autoridades talibãs.

Flores, velas e mensagens em homenagem aos mortos em Solingen
Deportação ocorre uma semana após sírio matar três pessoas a facadas em SolingenFoto: Ina Fassbender/AFP/Getty Images

A Alemanha fechou sua embaixada em Cabul e interrompeu as deportações para o Afeganistão após o Talibã voltar ao poder, em agosto de 2021. Tendo aplicado uma interpretação rígida da lei islâmica e sendo criticado internacionalmente sobretudo por restringir os direitos das mulheres, o governo talibã não foi oficialmente reconhecido por nenhum país.

Hebestreit afirmou que, com a retomada das deportações, a Alemanha envia "um sinal para criminosos em potencial ou pessoas planejando crimes no país".

Segundo autoridades alemãs, criminosos violentos e sexuais estavam entre os afegãos deportados nesta sexta. Um deles era um homem que participou de um estupro coletivo de uma menina de 14 anos.

Governo federal sob pressão

O governo de Scholz tem enfrentado crescente pressão para conter a migração ilegal e adotar medidas mais duras contra requerentes de refúgio considerados perigosos ou condenados, após uma série de crimes de grande repercussão.

O suspeito de cometer o ataque em Solingen na semana passada deveria ter sido deportado para a Bulgária há algum tempo, mas a operação falhou após as autoridades não conseguirem localizá-lo.

Antes disso, em maio, um afegão de 25 anos foi acusado de matar um policial em um ataque a faca em uma praça na cidade de Mannheim. O crime reacendeu o debate sobre a deportação de criminosos graves, mesmo que eles venham de países considerados inseguros, como Afeganistão e Síria.

Nesta quinta-feira, a ministra do Interior anunciou que deportações para ambos os países fariam parte de um pacote de medidas para reforçar a segurança e as políticas de refúgio.

Viaturas da polícia e dos bombeiros em uma praça
Em maio, um afegão foi acusado de matar um policial em MannheimFoto: Rene Priebe/dpa/picture alliance

A insatisfação com a imigração deve desempenhar um papel crucial nas eleições de domingo nos estados da Saxônia e da Turíngia. Enquanto a AfD está em alta nas pesquisas, os partidos da coalizão de Scholz – Partido Social Democrata (SPD), Partido Verde e Partido Liberal Democrático (FDP) – se preparam para uma grande derrota.

"Ninguém está seguro no Afeganistão"

O grupo de direitos humanos Anistia Internacional condenou a decisão de retomar as deportações para o Afeganistão, acusando Berlim de usar táticas eleitorais e de violar obrigações sob o direito internacional.

"Ninguém está seguro no Afeganistão. Todos temos direitos humanos, e ninguém deve ser deportado para um país onde há ameaça de tortura", disse Julia Duchrow, chefe da Anistia Internacional na Alemanha. "Se o governo alemão, mesmo assim, deportar pessoas para o Afeganistão, corre o risco de se tornar cúmplice do Talibã."

A ministra do Exterior alemã, Annalena Baerbock, e seu Partido Verde também vinham manifestando ceticismo em relação a deportações para o Afeganistão e alertado que isso significaria reconhecer indiretamente o governo talibã. Baerbock afirmou que deportações para a Síria e o Afeganistão são possíveis em casos isolados.

Em entrevista à Spiegel publicada nesta sexta-feira, Scholz disse que o governo "respeita a Constituição" em tudo o que faz. "Mas é claro que alguém que comete uma ofensa grave em nosso país não pode gozar da mesma proteção que alguém que se comporta decentemente", ressaltou.

lf/le (afp, dpa)