"Abóbada Verde" mostra maior tesouro real da Europa
30 de setembro de 2006Ouro, prata, marfim, pedras preciosas: para o príncipe Augusto, o Forte, da Saxônia e Polônia, o melhor ainda era pouco. Entre 1723 e 1729, transformou a sala do tesouro, situada na ala oeste do castelo de Dresden, em um museu para as jóias da coroa.
No espaço – que ficou conhecido por Grünes Gewölbe (Abóbada Verde), devido à cor das paredes – o monarca reuniu a coleção de jóias reais mais valiosa da Europa, incluindo obras-primas da joalheria e da ourivesaria, além de peças de marfim, bronze e pedras preciosas.
O castelo de Dresden, maior e mais pomposa construção profana da Renascença em solo alemão, é um símbolo da continuidade da dinastia Witten, que reinou sobre a Saxônia até 1918. Em 1889, a casa real festejou seus 800 anos. O atual chefe dos Witten é o marquês Maria Emmanuel von Meißen, de 80 anos, que já designou seu sobrinho, príncipe Alexander da Saxônia Gessaphe, 52, como sucessor.
Na Segunda Guerra Mundial, o castelo foi quase completamente destruído. O precioso tesouro teve de ser transferido para um espaço provisório, onde nos 30 anos seguintes foi visto por 20 milhões de visitantes, embora apenas um terço das peças estivessem expostas.
As ruínas do castelo – a mais antiga construção de pedra da cidade – por pouco teriam sido removidas pelo governo da Alemanha Oriental (RDA). Na reinauguração da Semperoper, em 13 de fevereiro de 1985, o então chefe de Estado da RDA, Erich Honecker, anunciou que o edifício, tombado pelo patrimônio histórico, seria reconstruído.
Restauração cara
A construção original da Grünes Gewölbe custou 60 mil talers no tempo de Augusto – uma família normal, que vivesse de um bom salário, teria de trabalhar 600 anos para obter tal quantia. Mesmo assim, segundo peritos, foi um preço razoável, considerando o valor dos 4909 diamantes, 160 rubis, 164 esmeraldas, uma safira, 16 pérolas, dois camafeus e outras 319 pedras preciosas conservados até hoje.
A reconstrução do castelo inteiro foi orçada em 337 milhões de euros no início dos anos 90 (valor suficiente para construir duas Frauenkichen – veja link abaixo). Deste total, 198 milhões já foram gastos. Ao todo, 45 milhões de euros foram injetados na Nova e na Histórica Abóbada Verde. Oitenta por cento das obras foram realizadas por firmas da Saxônia, cujo governo estadual cobre os custos.
Condições ideais
Há dois anos, o tesouro de Augusto, o Forte, foi transferido para a Nova Abóbada Verde, cuja restauração acabava de ser concluída. Desde então, as obras-primas da Renascença e do barroco expostas em dez salas com área de 1200 metros quadrados, no primeiro andar da ala oeste do castelo, já foram admiradas por 1,2 milhão de pessoas.
"Aqui o visitante pode dedicar-se a cada objeto, sua forma de produção, seu significado, sua história, seu contexto. E obras como essas não existem em nenhum outro lugar do mundo", garante o diretor geral dos acervos de arte estatais de Dresden, Martin Roth. "Eu costumo ser cuidadoso com superlativos, mas nesse caso eu não hesito".
As vitrines oferecem as condições ideais para a conservação de cada objeto. Lá estão não apenas peças de difícil conservação, mas também outras que não condiziam com o conceito barroco do príncipe Augusto, como o caroço de cereja, em cuja superfície estão cravados 185 rostos. Ou a fragata de Jacob Zeller, uma escultura de 115 centímetros de marfim, datada de 1620. A embarcação, que parece navegar nas próprias mãos do deus Netuno, é ao mesmo tempo uma árvore genealógica da dinastia saxônia.
Mas Dresden já era, antes mesmo do período augustino, uma cidade de suntuosos costumes palacianos e intensa atividade artística. Exemplo disso são as várias salas com peças em marfim torneado, taças de pedra lapidada, armários luxuosos e copos feitos de chifres de animais.
Inspiração absolutista
A sala mais espetacular, no entanto, é a que reúne as obras-primas feitas na oficina de Johann Melchior Dinglinger. O artista não era apenas responsável pela produção de novos engastes para as jóias reais, mas também era admirado por suas tão incomuns quanto dispendiosas obras de arte. A mais famosa delas é uma placa, no qual miniaturas celebram o aniversário do grão-mogol indiano Aurangzeb.
Tanto a placa, com 58cm de altura e cerca de um metro quadrado de tamanho, como as construções são de ouro e prata. Sobre ela estão ao todo 132 figuras – pessoas, animais e presentes – em ouro esmaltado. O ourives investiu sete anos de minucioso trabalho, quatro mil diamantes, centenas de pedras preciosas, muita imaginação e um talento técnico e artístico fora do comum. E, claro, 58 mil talers – na época, pagava-se três mil talers por uma casa em Dresden.
A inspiração para tal obra veio dos ideais absolutistas em voga na época. Dinglinger possuía, além disso, uma enorme curiosidade pré-iluminista pelas culturas não-européias, que dividia com filósofos como Leibniz.
"Talvez Augusto, o Forte, tenha tomado nas mãos as pequenas figuras – de no máximo 5 centímetros, mas extremamente vivas com seus detalhes nas mãos, pés, cabeça e vestuário. Nós podemos apenas admirá-las através do vidro", disse Dirk Syndram, diretor da Nova Abóbada Verde.
Desde 15 de setembro de 2006, também a Histórica Abóbada Verde está aberta ao público, coroando 20 anos de reconstrução do castelo e dando mais espaço à exposição do tesouro. "Com o retorno da câmara barroca do tesouro real da Saxônia ao local de onde foi retirada em 1942, foi cicatrizada uma das maiores feridas da história dos museus da Alemanha", disse Martin Roth na inauguração. Por fora, a restauração do castelo de Dresden está concluída, mas por dentro ainda há muito o que fazer.