A trajetória de Díaz-Canel, reeleito presidente de Cuba
20 de abril de 2023Sem margem para surpresas, a Assembleia Nacional do Poder Popular (ANPP) reelegeu nesta quarta-feira Miguel Díaz-Canel para um segundo e último mandato como presidente de Cuba.
O ex-professor universitário e engenheiro eletrônico que completa 63 anos nesta quinta-feira (20/04) governa o país desde 2018, tendo sido o primeiro civil a assumir o poder após os mandatos de Fidel e Raúl Castro. Ele obteve 459 votos (97,66%) dos 462 deputados presentes na sessão legislativa.
Díaz Canel é desde 2021 primeiro secretário do Partido Comunista de Cuba (PCC, o único legal do país) e encabeçou a única candidatura proposta pela presidência da ANPP. Salvador Valdés Mesa também foi reeleito como vice-presidente, com 93,4% dos votos (439 de 462).
"Tendo em conta os resultados anunciados, declaro eleito presidente da República o deputado Miguel Mario Díaz-Canel Bermúdez", disse Esteban Lazo, presidente da assembleia, antes da sessão plenária e na presença de um dos principais líderes da Revolução Cubana, Raúl Castro, de 91 anos. Em seu tradicional uniforme verde-oliva, Castro parabenizou com um aperto de mão o presidente, que compareceu à reunião de terno azul-escuro.
Assim que foi nomeado, Díaz-Canel propôs à ANPP Manuel Marrero Cruz como primeiro-ministro, que já ocupou esse cargo nos últimos cinco anos.
Crise no primeiro mandato
O primeiro mandato de Díaz-Canel e Valdés foi marcado pela grave crise, a pior em 30 anos, que o país atravessa, devido à conjugação das consequências da pandemia, do endurecimento das sanções americanas e de erros na política econômica e monetária. Há escassez de alimentos, remédios e combustível. Ao mesmo tempo, o presidente e seu vice conseguiram demonstrar ser possível manter o regime socialista sem a presença dos Castro.
Nesta quarta-feira foi também constituído o novo Parlamento cubano após as últimas "eleições" parlamentares. No dia 26 de março, os 470 candidatos foram eleitos para a ANPP. A grande maioria são membros do PCC.
Ao assumir o cargo, Díaz-Canel convocou seu gabinete a "enfrentar obstáculos e resolver ineficiências" para "aumentar a oferta de bens e serviços e controlar a inflação".
Sua reeleição ocorre após dois anos de escalada inflacionária de 39% em 2022 e 70% em 2021, números inéditos no país desde o triunfo da revolução em 1959.
Em seu discurso, Díaz-Canel criticou o "burocratismo, a indiferença ou a corrupção inaceitável" que retarda o progresso do país "em meio a profundas dificuldades".
Desde 2018, quando a crise atual começou, Díaz-Canel acelerou uma reforma econômica iniciada por seu mentor político Raúl Castro.
Reforma monetária
No início de 2021, implementou uma reforma monetária que acabou com a taxa artificial de um dólar por um peso cubano que vigorava há décadas e causava grandes distorções na economia nacional. Também promoveu o trabalho autônomo e deu luz verde à criação de pequenas e médias empresas, mas estas medidas revelaram-se insuficientes para melhorar a economia.
O analista político Arturo López-Levy assinala que o governo de Díaz-Canel "não fez uma transição completa e abrangente para uma economia mista".
"Algumas mudanças econômicas não aconteceram e outras que aconteceram deixaram muito ceticismo sobre sua implementação", avalia.
A reforma monetária também causou uma forte desvalorização da moeda cubana que fez disparar o custo de vida. O peso subiu em dois anos de 24 para 120 unidades por dólar à taxa oficial, enquanto no mercado negro é cotado a 185 pesos por moeda.
Um de seus maiores fracassos foi também a gestão dos protestos de julho de 2021, os maiores na ilha desde 1959, que deixaram um morto, dezenas de feridos e mais de 1.300 presos, segundo a organização de direitos humanos Cubalex, com sede em em Miami. Após os protestos houve um êxodo migratório sem precedentes: mais de 300 mil cubanos deixaram a ilha só em 2022.
Carreira meteórica
Proclamado novo presidente de Cuba pelo Parlamento em abril de 2018, Miguel Díaz-Canel chegou ao cargo por sua proximidade com o povo; pelo impacto deixado no período como primeiro secretário do partido na região de Villa Clara; e sua ativa presença como vice-presidente nas catástrofes seguidas a furacões como o Matthew, em 2016, e em importantes eventos internacionais. As aparições públicas frequentes fizeram parte da estratégia de Raúl Castro para estabelecê-lo como o candidato "ideal" à frente do país que, pela primeira vez em quase seis décadas passava a ter um presidente sem o sobrenome Castro.
Seu porte atlético e uma histrionice minuciosamente estudada nos momentos em que se aproxima do povo fazem com que muitos cubanos digam que ele "é um cara bacana"; que "é um homem carinhoso com a esposa"; que "até toma uns goles de rum com o pessoal simples do povo"; e até que, no contexto das últimas tendências esportivas em Cuba, "foi quem decidiu transmitir as partidas de futebol ao vivo na televisão" e que é "torcedor fanático" do Barcelona.
Sua proximidade a Raúl Castro permitiu que tivesse uma carreira meteórica, que o levou de segundo secretário da União de Jovens Comunistas, em 1990, a primeiro secretário do Partido nas províncias de Villa Clara (1994) e de Holguín (2003). Dali, passou a ministro da Educação Superior em 2009 e à vice-presidência de Cuba em 2013.
md/lf (DW, EFE, AFP)