A outra face de Günter Grass
22 de julho de 2004Antes de se tornar romancista, Günter Grass foi escultor. Ao fim da Segunda Guerra Mundial, ele empunhou primeiro o cinzel. Aprendiz de entalhador de pedras, dedicou-se também ao estudo das artes gráficas. Mas quiseram as musas que a pena fosse sua principal arma de combate intelectual, pelo menos aos olhos do grande público, que ficou sabendo através de seus relatos das desditas do pequeno Oscar, aferrado a seu tambor de lata, e de tantas outras figuras que encarnaram a realidade da Alemanha devastada pelo nazismo e a guerra.
O primeiro amor
Sua produção literária lhe valeu o Prêmio Nobel em 1999, enquanto sua inclinação a pronunciar-se sem papas na língua sobre a situação política fez com que ele se convertesse numa espécie de "consciência moral" da Alemanha. Mas suas múltiplas atividades não conseguiram afastá-lo jamais de seu primeiro amor artístico: a escultura.
Pela primeira vez realiza-se agora na Alemanha uma exposição que abarca amplamente a obra escultórica do escritor. Na entrada da Igreja Paulina de Göttingen, onde as obras podem ser apreciadas, um braço de bronze levanta-se do chão, com um peixe na mão: um linguado. Um claro anúncio do que espera o visitante interessado em conhecer as 100 figuras de bronze e argila que compõem a mostra, intimamente ligada ao universo literário do autor.
À sombra da literatura
Segundo Günter Grass, as figuras tomaram forma "em silêncio, à sombra da literatura". Ele esclarece, porém, que cada uma é também uma "obra independente". O autor assegura que para ele a coexistência de literatura, escultura e pintura é completamente natural. Há ocasiões inclusive em que passou de um campo para outro em meio a uma obra. Quando empaca num romance, fazer um desenho pode estimular o fluxo das idéias. Logo esses esboços adquirem vida independente, ou acabam servindo de base para as figuras de bronze e argila.
A exposição inclui ainda uns 70 desenhos, aquarelas e gravuras, que complementam a criação de Günter Grass. Todas essas expressões têm para ele o mesmo valor. Portanto, não gostaria de abandonar nenhuma. E se uma fada malvada o obrigasse a optar por uma só, o que faria? Sua resposta: "Passaria a conversa na fada e a levaria a renunciar a seu ultimato."