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Grass: "Tradutores são os leitores mais precisos"

Simone de Mello7 de junho de 2004

O prêmio Nobel de literatura Günter Grass se encontra com tradutores de diversos países do mundo no Centro Europeu de Tradutores, em Straelen, para discutir problemas de tradução em seus textos.

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Tradutores exigem de autores um novo olhar sobre suas próprias obrasFoto: AP

"Tradutores são os leitores mais precisos. Eles tomam o autor ao pé da letra. Estão sempre ao seu encalço, de forma implacável. Não se dispõem a aceitar, como um símbolo plurissignificante e difuso, nada de incompreensível ou qualquer imprecisão que tenha escapado ao autor. Querem saber de tudo exatamente. Penetram o autor", declarou o escritor alemão Günter Grass, em 2001, num discurso em homenagem ao tradutor, escritor e germanista dinamarquês Per Øhrgaard.

O autor responde

— Confirmando mais uma vez sua iniciativa de apoiar o ofício do tradutor, Grass, prêmio Nobel de literatura de 1999, participou de uma oficina de tradução sobre sua obra, organizada pelo Centro Europeu de Tradutores (Europäisches Übersetzerkollegium, EÜK) na cidade renana de Straelen. Numa mesa-redonda com tradutores de 11 idiomas diferentes, o autor de O Tambor (Blechtrommel, 1959) e Em Passo de Caranguejo (Im Krebsgang, 2003) se dispôs a responder perguntas de toda espécie, sem deixar de ressaltar que — em se tratando de tradução literária — nenhuma questão é inoportuna.

Buchcover: Grass - Krebsgang
Capa da edição alemã de 'Im Krebsgang'

Memória e Ki-Suco — No espectro de diferentes línguas, isso fica ainda mais nítido. Questões irrelevantes para um tradutor do alemão para o inglês, por exemplo, podem representar um problema insolúvel para um chinês. As dúvidas de quem traduz Grass são de todos os tipos. Sejam questões semânticas, como a diferenciação exata dos termos Erinnerung (recordação) e Gedächtnis (memória), conceitos-chave em sua obra, ou coisas mais prosaicas, como a tradução do termo Brausepulver, uma espécie de Ki-Suco efervescente. Trata-se de um prazer de infância de Günter Grass, relevante numa passagem de O Tambor e em alguns poemas. Na China, não existe nada do gênero: como traduzi-lo?

Pressionando editoras

— Desde 1978, Grass costuma se reunir com seus tradutores, não apenas para elucidar passagens de seus romances recém-publicados, mas muitas vezes para acompanhá-los pelos cenários onde se passam seus livros, geralmente ligados a Danzig, atual Gdansk, na Polônia. Uma das condições que ele impõe às suas editoras na Alemanha é que elas financiem tais encontros, sendo que os editores estrangeiros interessados em adquirir os direitos de seus livros devem se comprometer a pagar a passagem aérea do tradutor.

Tradução e releitura

— Para ele, o encontro regular com seus tradutores não significa apenas uma garantia de qualidade para a veiculação de sua obra em outras línguas. Grass confirma que os tradutores o desafiam a reler sua obra própria de uma forma tão intensa, como nenhum crítico o faria; em alguns casos, o prêmio Nobel de literatura se propôs a alterar o texto original após tais releituras.

Tarefa política

— Durante o evento que contou com a presença do governador do Estado da Renânia do Norte-Vestfália, Peer Steinbrück, um autor tão político como Grass não poderia perder a oportunidade de reivindicar publicamente um maior incentivo estatal à tradução. Destacando que os tradutores "são mal remunerados e exageradamente modestos" para reivindicar melhores condições de trabalho junto às editoras, "pelas quais eles são apenas minimamente recompensados", Grass destacou a importância do apoio estatal a instituições como o Centro Europeu de Tradutores.

Centro de Straelen

— A associação financiada com verbas estaduais e européias oferece bolsas de permanência e condições de trabalho ideais para tradutores de todas as línguas européias. Sua biblioteca contém mais de 110 mil volumes, entre os quais aproximadamente 25 mil dicionários em mais de 270 línguas e dialetos. Mais do que as condições materiais, o centro de tradutores de Straelen — um modelo institucional pioneiro, fundado em 1978 por iniciativa do tradutor Klaus Birkenhauer — proporciona que tradutores literários estejam em contato, não apenas para resolverem em conjunto questões textuais, mas também para trocarem informações sobre questões legais, contratuais e corporativas.