Zimbabué: Oposição rejeita vitória de Mnangagwa
3 de agosto de 2018No Zimbabué, o atraso reivindicado pela oposição no anúncio dos resultados das eleições presidenciais desta segunda-feira (30.07) veio confirmar o receio do partido liderado por Nelson Chamisa. Com 50,8% dos votos, Emmerson Mnangagwa é o novo Presidente do Zimbabué, declarou esta manhã a Comissão Eleitoral do país.
As reações não se fizeram esperar, com a oposição a rejeitar a vitória do adversário. O Movimento pela Mudança Democrática (MDC) insiste que os resultados foram manipulados e que o seu candidato, Nelson Chamisa, venceu o escrutínio com 57,10% dos votos contra 42,10% de Emmerson Mnangagwa.
Esta sexta-feira (03.08), a capital Harare acordou tranquila, mas com a polícia ainda presente no exterior da sede do MDC. No entanto, foram necessárias apenas algumas horas para o ambiente aquecer e não deixar esquecer os violentos protestos que, na passada quarta-feira (01.08), fizeram seis mortos na capital.
Conferência de imprensa do MDC boicotada
Ao início da tarde, a polícia de intervenção invadiu o Hotel Bronte, localizado em Harare, e para onde estava agendada uma conferência de imprensa com o líder da oposição Nelson Chamisa. Recorrendo a gás lacrimogénio, a polícia entrou no edifício e, sem dar explicações, fez dispersar as dezenas de jornalistas que ali se encontravam para ouvir Chamisa, que rejeita os resultados das eleições. Para o líder da oposição, o boicote policial é "inaceitável e desnecessário".
Quem também não demorou a condenar o sucedido e ordenou, inclusive, uma investigação urgente, foi o vencedor das eleições e agora Presidente do Zimbabué, Emmerson Mnangagwa. O líder do ZANU-PF disse que ações como esta não podem "ter lugar” na sociedade do seu país e que a "liberdade de expressão é indispensável e faz parte do novo Zimbabué". "Não é negociável e não irá mudar", afirmou.
A polícia acabou depois por permitir a realização do evento, no qual Chamisa decretou "um dia de luto pela democracia". "Queremos pedir desculpas em nome do povo do Zimbábue, em particular aos jornalistas internacionais. Foi inaceitável e desnecessário [o comportamento da polícia]. Isto não pode ser um comportamento de pessoas que ganharam, mas sim das que perderam".
Chamisa disse ainda que esta foi uma eleição "fraudulenta, ilegal e ilegítima" com "sérias falhas na credibilidade". "[A violência da polícia] indica claramente que os nossos colegas do ZANU-PF entraram em pânico, porque foram derrotados nesta eleição. Não estão confiantes no resultado".
Mnangagwa "venceu à força”
Nas ruas, as opiniões divergem quanto ao resultado do ato elitoral. Os apoiantes da oposição entendem que ainda não será desta que o Zimbabué irá mudar. "Não estamos felizes com estas eleições, mas o que podemos fazer?”, questiona Patience Sithole, uma empregada de limpeza.
O vendedor Roy Mukwena diz que o "Presidente Mnangagwa não é desejado”. "Ele venceu à força. Não estou feliz porque as eleições não foram livres e justas. O povo quer que Nelson Chamisa governe o Zimbabué”, assevera. Uma opinião também partilhada por um outro cidadão que afirma que o "Zimbabué não vai a lugar algum com o presidente Emmerson Mnangagwa. Estamos cansados do Zanu PF. Para ser sincero, estamos fartos e cansados".
Eddy vive também na capital, Harare, mas, na sua opinião, Mnangagwa é "o homem certo" para liderar o país. "Ele está lá [no governo] há algum tempo e sabe onde estão as fraquezas [do país]. Tem a experiência do governo anterior. Por isso, ele sabe como manobrar os problemas que temos. Espero que o faça bem", explica.
Quem também já reagiu à vitória do ZANU-PF foi Cyril Ramaphosa, Presidente da África do Sul. O também presidente da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral apelou os zimbabuanos que aceitem os resultados anunciados. No Twitter escreveu: "Instamos aos zimbabuanos que aceitem os resultados anunciados ou que sigam o caminho legal, caso desejem contestá-los".
Troca de acusações
Entretanto, os dois partidos mais votados, ZANU-PF e MDC, continuam a trocar acusações sobre os protestos violentos que, na última quarta-feira (01.08), provocaram seis mortos nas ruas da capital. Em entrevista à DW África, Nick Mangwana, do ZANU-PF, rejeita responsabilidades do partido que representa no sucedido e afirma que estes manifestantes "não foram para as ruas para protestar", mas sim para "vandalizar propriedades".
Já Jameson Timba, do MDC, afirma que o "que aconteceu há dois dias atrás foi uma reação espontânea de pessoas comuns que têm vindo a sofrer com o ZANU-PF". Este apoiante do partido de Nelson Chamisa lembra que as pessoas estão descontentes e que "90% [dos cidadãos] estão hoje desempregados [no Zimbabué]". Para Jameson Timba, "não há justificação, em circunstância alguma, para o exército abrir fogo sobre os a população indefesa".
Na passada quarta-feira (01.08), e depois das forças militares terem declarado "tolerância zero" aos protestos na capital Harare, seis apoiantes da oposição perderam a vida. O Exército foi chamado a intervir e usou gás lacrimogéneo, jatos de água e disparos com balas reais para reprimir os manifestantes. Na altura, o agora Presidente do país, Emmerson Mnangagwa, responsabilizou o MDC pela desordem e por "por todas as mortes, ferimentos e destruição de propriedade durante esses atos de violência política".
A União Europeia, os Estados Unidos, a Commonwealth, a União Africana e outras missões de observadores denunciaram o "uso excessivo da força" para acalmar os protestos em Harare, e pediram "contenção" ao Exército e à polícia do Zimbabué.
As eleições desta segunda-feira (03.08), no Zimbabué, foram as primeiras após a saída de Robert Mugabe, que foi forçado pelos militares a renunciar ao cargo em novembro do ano passado. No seio da população, havia a esperança que a votação abriria portas a uma nova era no país, depois de quase 40 anos de repressão sob o comando de Mugabe, que governou o país de 1980 a 2017.